São Paulo, segunda-feira, 22 de julho de 2002

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MENTES DE MINAS

Cidade mantém clima boêmio da época do presidente centenário, cujo aniversário virou data de festa

Diamantina dedica Dia da Seresta a JK

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Não havia noite banhada pela luz do luar em que o presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira não se rendesse à seresta nas ruas íngremes, pequenas e estreitas de sua terra natal, Diamantina, a cerca de 290 km de Belo Horizonte.
Apesar de ter deixado a cidade aos 18 anos, JK visitava frequentemente a região (leia texto abaixo). Um dos lugares preferidos para suas serestas era o beco do Mota, que até hoje reúne vários botecos, nos quais as pessoas ficam horas sentadas tomando cerveja e conversando -algumas ainda investem nas cantorias.
O espírito seresteiro de JK era tão forte que desde a sua morte, num acidente de carro em 1976, o Dia da Seresta ficou imortalizado em Diamantina em 12 de setembro, aniversário do filho ilustre.
"Mesmo quando ele era presidente, em Brasília, sempre havia um seresteiro que o acompanhava", afirma Juscelino Brasiliano Roque, 42, presidente da Associação Comercial e Industrial de Diamantina. Seu avô era amigo íntimo de JK e por isso seu primeiro nome é Juscelino, como muitos em Diamantina, e o seu segundo nome é Brasiliano, em referência a Brasília, porque nasceu no mesmo dia da inauguração da cidade.
Neste ano, JK completaria cem anos, e a cidade prepara uma série de atividades para a data. Uma expedição, batizada de Expedição Brasília Diamantina, com 20 cavaleiros, amigos de JK, sairá de Brasília em 22 de agosto, dia da morte do presidente, rumo a Diamantina, onde deverá chegar em 12 de setembro, para comemorar o centenário.
Se estivesse vivo, JK não hesitaria em celebrar a data com muita festa, garantem os amigos. O que ele não dispensava era uma sesta de "reparo", a qualquer hora que lhe batia o cansaço, só para depois poder continuar a festa.
"Mesmo durante as serestas, Juscelino saía de fininho, dava uma dormidinha de dez minutos e voltava novo", diz o empresário Leandro Costa, 71, que hospedava JK em sua casa quando ele visitava Diamantina. Juscelino tinha seu próprio quarto na casa de Costa. "Ele me dizia que, para acompanhar as serestas, precisava ter muito fôlego", conta.
JK puxou o pai e descrevia sua filiação assim: "Ela [a mãe", a discrição em pessoa, escrava do dever, adversária de festas, frequentava tão-somente a igreja e as casas dos parentes próximos; ele, o mão-aberta, o gênio expansivo, o rei da noite e das serenatas".
A boemia, entretanto, não foi somente privilégio dos contemporâneos de JK. O clima aconchegante -embora com noites que exigem agasalhos mesmo no verão- e romântico de Diamantina proporciona o "carpe diem" ainda nos dias de hoje.
A cidade, que em 1999 conquistou o título de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural da Humanidade pela Unesco, continua tendo as serestas como grandes atrativos. Apesar de não haver tantos grupos espontâneos quanto na época de JK tocando e cantando suas modinhas debaixo das janelas de suas amadas, há serestas programadas pela prefeitura que acontecem quase todas as sextas-feiras à noite.
Desde 1997, uma nova fórmula de apresentação musical ocupa as ruas de Diamantina mensalmente: a vesperata. O espetáculo é inspirado no grupo Anjos da Meia-Noite, que se apresentou na cidade até o início do século passado. Àquela época, a banda era dividida e os instrumentos de sopro ficavam nas sacadas, enquanto os demais permaneciam nas ruas.
A vesperata mantém a tradição e tem a rua da Quitanda, no centro histórico, como palco das apresentações. A Banda de Música do Terceiro Batalhão da Polícia Militar e a Banda Mirim Prefeito Antônio de Carvalho Cruz tocam a partir das sacadas e das janelas dos casarios. Os maestros regem do centro da rua, misturando-se com a platéia.
No centro histórico, as casas em estilo colonial hospedam restaurantes requintados e alguns com comidas simples feitas no fogão à lenha, mas com delicadeza.
Nas noites em que a cidade não recebe eventos, os bares e os restaurantes são fechados antes das 23h. Nos dias de serenata e badalação, durante o festival de inverno (que conta com oficinas, shows e exposições e vai até sábado), no Carnaval e quando há outros eventos, a vida noturna é agitada. (MIRELLA DOMENICH)


Informações sobre eventos - Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, tel. 0/xx/38/3531-1636, ou no site www.diamantinanet.com.br.


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