São Paulo, segunda, 25 de janeiro de 1999

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SÃO PAULO, 445
Ruas do centro eram o charme da capital no início do século, quando as damas soltavam a voz sem pudor
Rostos faceiros ferviam vida provinciana

da Reportagem Local

A bela dama passeia faceira pelas garbosas vias do centro, admirando artigos de toucador e outros mais. Ao seu lado, o mancebo vergando terno de fino corte carrega um cravo na lapela e apóia-se, todo "blasé", em uma bengala francesa.
Cena de cinema, propaganda antiga? Não, é a São Paulo do início do século, quando as finas senhoras tomavam chá nos charmosos cafés do centro, jamais tratavam com intimidade estranhos e usavam pó-de-arroz.
Os jardins, como o da Luz e Aclimação, eram pontos de encontro nos finais de semana. Mas era na rua Direita, no largo do Arouche e na rua do Carmo, entre outras, que desfilava a fina flor da elite paulistana. A área central da cidade concentrava o lazer, as compras e o comércio -ou seja, tudo.
As "senhoras", que se casavam antes dos 20 anos, geralmente, dedicavam-se à casa e às artes do lar: bordado, pintura, música e canto. O ouvido vinha sendo treinado há gerações.
"Canto e música são talentos comuns que elas revelam com graça e facilidade", já notava o médico sueco Gustavo Beyer (1775-1852) em 1813, durante uma visita a São Paulo. Os traços físicos das paulistanas também falaram alto ao viajante: "As mulheres em geral são bonitas e extremamente encantadoras no seu modo de ser".
No início do século, tal beleza não se traduzia na moda. Os vestidos eram simples, e as jóias, usadas com parcimônia. No cabelo, sempre longo, pentes eram o máximo do toque de vaidade que as moças paulistanas se permitiam.
Mas, às vésperas do novo milênio, tudo mudou. A França ditava modos e gostos. Roupas eram feitas com costureiras, não mais em casa, seguindo moldes franceses. Era a "belle époque".
Nos anos 20, o charleston tomava conta dos salões de baile enquanto a cidade ia sendo "modernizada". Os descendentes de cafeicultores iam mais a Paris do que à Consolação.
Assim foi até pouco depois da Segunda Guerra Mundial, quando as praças e ruas do centro ainda eram sinônimo de lazer e luxo.
Nos anos 50 e 60, as zonas centrais foram se degradando, com o fim do comércio e a mudança de cinemas, bares e restaurantes para os bairros, e o vaivém de pedestres na rua Augusta passou a competir com o ruído das lambretas. O resto é história. (CARLA ARANHA)



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