São Paulo, domingo, 8 de fevereiro de 1998

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A outra face da TV

Atrações eventuais de programas de auditório, tipos bizarros também têm espaço fixo na televisão, como o pioneiro Russo, recentemente homenageado pelo apresentador Fausto Silva em seu programa, e o novato Claudio Chirinhan, o "ET do Ratinho", que é vesgo, mede apenas 1,40 m, e aparece fantasiado de presidiário, miss ou cangaceira

Divulgação
Claudio Chirinhan fantasiado de Miss São Paulo no programa do Ratinho


DANIEL CASTRO
da Reportagem Local

Ele é vesgo, pesa 38 quilos, mede apenas 1,40 m de altura e sua voz parece a de uma gravação em rotação acelerada. Claudio Chirinhan, 34, o "ET do Ratinho", não é um anão, mas está longe da estatura normal. Não bastasse, a produção do programa ainda o veste com "fantasias" femininas -já se apresentou de Xuxa com o pé engessado, de Pedrita, de Maria Bonita e até de Miss São Paulo.
Mas, quando ele entra no palco, o auditório fica em êxtase. Aplaude e, em coro, grita sem parar seu apelido: "ET, ET, ET, ET, ET...". O ibope também corresponde. Basta ET aparecer alguns minutos fantasiado de mulher, para a audiência subir até quatro pontos, o equivalente a 320 mil novos telespectadores só na Grande São Paulo.
Chirinhan não se importa em ser usado pela TV como um ser bizarro, na guerra pela audiência.
"Essas críticas não me incomodam. Depois que entrei no programa do Ratinho, fiquei bem conhecido. Muitas pessoas gostam de mim, não me tratam como um coitado. Dou autógrafos, tiro fotos, mas não gosto quando me chamam de "gracinha'", diz.
A TV aparentemente está fazendo bem para ET. "Ele ficou mais motivado. Antes, ficava pelos cantos, deprimido. Agora ele está mais alegre, bebe e fuma menos", diz sua mãe, a dona-de-casa Terezinha Chirinhan, 59, 1,56 m.
Até 20 de outubro passado, Claudio Chirinhan era apenas o "Sabiá", como ainda é conhecido na região central de Osasco, onde nasceu e mora até hoje. Trabalhava como entregador de avisos de impostos na Secretaria Municipal da Fazenda de Osasco e ganhava "uma mixaria", R$ 243 mensais.
O repórter do "Ratinho Livre" Rodolfo Carlos, 27, 1,85 m, conta como criou o personagem ET:
"Saí para gravar três matérias e nenhuma deu certo. Pensei no Claudio, que conhecia de vista, mas tinha medo de abordá-lo. Criei coragem e falei assim: Eu sou feio, magrelo e desengonçado, mas trabalho na TV e ganho muito bem. Você é feio, baixinho, não fica com mulher alguma e é tratado com indiferença. Vou fazer de você uma outra pessoa. Na TV, você vira artista."
Convencido, Chirinhan aceitou a proposta de Carlos. "No caminho, passei em um depósito e emprestei uma caixa de madeira. Fui até o diretor do programa (na época, o jornalista Odilon Coutinho) e, fazendo suspense, disse que tinha encontrado um bichinho muito estranho. Abri a caixa e o Claudio apareceu. O diretor mandou-me fazer igualzinho no programa e dizer que tinha achado um ET", lembra Carlos.
No meio do programa, o repórter recebeu uma ligação de um dos três irmãos de Chirinhan. "Ele me disse que, se colocasse o Claudio no ar, eu seria processado. Avisei o Ratinho e ele não abriu a caixa. Após o programa me reuni com a família do Claudio e, depois de muita lábia, eles ficaram convencidos de que ir para a TV seria bom", conta Carlos.
No dia seguinte, mesmo com autorização da família, Ratinho e a direção da Record hesitaram em apresentar Chirinhan, temendo que ele tivesse alguma doença mental. Mas o diretor Odilon Coutinho insistiu e a atração foi ao ar. A caixa, no entanto, só foi aberta três dias depois.
Desde então, Chirinhan não saiu mais dos programas de Ratinho. Gosta tanto da TV que, embora só entre no ar às 20h30, costuma chegar à Record por volta das 14h.
Ele funciona como assistente de palco -aparece sempre vestido como garçom, servindo água para o apresentador. No início, ganhava R$ 500 por mês, mais um cachê de R$ 200 cada vez que aparecia fantasiado no "Ratinho Show", a versão dominical do "Ratinho Livre". Em janeiro, Chirinhan foi contratado como ator, e seu salário subiu para pouco mais de R$ 2.000 mensais.

Novos planos
A participação de Chirinhan, a partir desta semana, deverá ficar restrita ao programa diário. Na semana passada, a Record estava à procura de um profissional só para criar quadros para Chirinhan e o repórter Rodolfo Carlos no "Ratinho Livre".
O corte do programa semanal se deve, em parte, ao comportamento às vezes explosivo de Chirinhan. Ao final do "Ratinho Show" do último domingo, Chirinhan brigou com Atílio Riccó, atual diretor do programa, porque queria receber seu cachê (por ter se fantasiado de Pedrita) no ato. Por pouco, ele não levou uma suspensão.
"As pessoas pensam que ele tem problemas, mas a verdade é que ET é muito esperto e inteligente", atesta Riccó.
Para Carlos Massa, o Ratinho, Chirinhan tem talento para a TV, desde que seja bem orientado. "Ele é um sujeito de tipo físico engraçado. Não o vejo como ator. Ele só faz o que a gente pede."
Após o Carnaval, ET e Rodolfo Carlos devem excursionar pelo Brasil com a "Caravana do Ratinho". "Nosso show vai ser assim: A gente entra, olha para o povo, o povo olha para a gente, fazemos umas graças e acaba", adianta o repórter Carlos.
Nos planos da dupla ainda está o lançamento de brinquedos.
Carlos quer virar quebra-cabeça ("porque sou todo atrapalhado") e Chirinhan, boneco. "Eu ficaria bem de joão-bobo", diz ET, balançando o corpo para a frente e para trás. Chirinhan gostaria, ainda, de apresentar um programa infantil.

Família

A família, que no início se opôs à aparição de Chirinhan na TV, hoje diz estar orgulhosa. "Sempre que podemos, vamos ao programa ver as gravações. Não nos importamos com que ele se vista de mulher. "Os Trapalhões' também faziam isso", afirma a mãe, Terezinha.
Os parentes de Claudio Chirinhan preferem acreditar que ele é desse jeito por problemas genéticos. "As duas avós dele tinham menos de 1,40 m de altura", diz Terezinha, que só levou o filho aos médicos quando ele ainda era bebê.
Claudio nasceu aos nove meses de gestação, com 1,750 kg e 43 cm de altura -pouco abaixo da média nacional, de 45 cm. Segundo sua mãe, seu crânio era muito pequeno e a moleira se fechou muito cedo, aos 4 meses. "Quiseram operá-lo, mas a gente não deixou porque era uma cirurgia de alto risco."
"Ele não tem problemas. É apenas uma pessoa pequena", diz o pai, o transportador escolar Ovanes Chirinhan, 64, 1,68 m, filho de armênios. "Todos os meus filhos são gordos e têm mais de 1,70 m. Só o Claudio saiu baixinho."
Chirinhan estudou somente até a sexta série do primeiro grau. "Não tinha dificuldades de aprender, eu era preguiçoso demais e zombavam muito de mim na escola", afirma ET.
Segundo Terezinha, a TV só não mudou uma coisa na vida de seu filho: ele continua comendo pouco. Todos os dias, almoça apenas um misto-quente ou um bauru.



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