São Paulo, domingo, 12 de maio de 2002

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O DIA SEGUINTE

Participantes amargam a ressaca do "Hipertensão"


Dores na cabeça, ameaça de cirurgia, tratamento médico e gozações na rua estão no cotidiano do time dos arrependidos


FERNANDA DANNEMANN
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"VOCÊ quer falar do gosto bom da barata ou do mau gosto do programa?", pergunta Fábio Nascimento, no início da entrevista. Primeiro vencedor da gincana televisiva "Hipertensão", cujo último programa a TV Globo leva ao ar hoje à noite, com convidados famosos, ele ganhou mais do que o prêmio de R$ 50 mil: caiu nas graças de Antônio Carvalho, diretor de Recursos Artísticos da emissora, e ingressou na Oficina de Atores da Globo. "Ele me achou carismático e disse que a casa tem carência de atores negros", afirma, prestes a comprar uma caminhonete com parte do prêmio, que, aliás, achou baixo.
"R$ 100 mil seria mais justo. E R$ 1 mil é mesmo pouco para quem comeu baratas ou ficou deitado numa cova com 300 ratos, mas não venceu", diz ele, referindo-se à gratificação de participação oferecida pela emissora aos derrotados. Foi o caso da modelo Cristiane Oliveira, 23, que não esconde seu arrependimento. Ela se machucou na prova em que, de cima de um jet-ski a 60 km/h, tinha que saltar para um helicóptero em movimento. "Vi estrelas debaixo d'água, rodei, só lembro da pancada e da dor. Eles me resgataram rápido e pediram que eu não mexesse as pernas. Ainda sinto dores no pescoço e na cabeça", disse ela ao TV Folha, cerca de um mês após a gravação do programa, exibido em 14 de abril. Preocupada, a Globo está pagando todos os seus exames médicos, inclusive o eletroencefalograma a que terá que se submeter. O professor Otaviano Heleni, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), explica que, naquelas condições, a água não teria o mesmo efeito do cimento, ao contrário do que afirmou o apresentador Zeca Camargo aos participantes antes de começar a prova. "A água sempre vai impor uma força de resistência ao movimento do corpo que cai", diz Heleni. "A pessoa se machuca ou não dependendo da queda. Se a área do corpo que tocar a água for grande, essa força de resistência também será grande, e ela certamente se machucará", diz. Cristiane diz que não repetiria a experiência. "Não tinha me dado conta de que poderia ter morrido ou quebrado a espinha. Mas é que R$ 50 mil para mim não são pouco. Eles ainda foram bonzinhos e deram R$ 1 mil. Poderiam não ter dado nada. Não seria pior?" Outra que se machucou foi a modelo Fabyola Fraçois, 30 anos, que ficou com um "buraco no dedo", como diz, ao ser arrastada por dois cavalos num caminho coberto de lama. "O barro tinha umas pedrinhas minúsculas que comeram a carne e fizeram um buraco na junta. O médico disse que, se o tendão inflamar, vou ter que operar." Para ela, no entanto, o pior foi encarar um aquário contendo 25 cobras, no qual tinha que "pescar" ameixas com a boca, e onde machucou os joelhos no vidro. "Fiquei com hematomas, batia a cabeça, os ombros, as pernas e os braços. Fiquei toda roxa. Meus joelhos estão ralados e não dá para me abaixar." Mesmo assim ela diz que valeu a pena. "Queria ficar exposta e receber convites. Funcionou, já fui convidada para posar para duas revistas e para participar de um outro "reality show'", afirma ela. Outro arrependido é o publicitário Sérgio Araújo, 24. "Jamais pensei que fosse comer barata. As pessoas perguntam pra minha namorada como é que ela beija um cara que comeu minhoca. Só valeu para quem ganhou. Também acho injusto que os participantes que saíram na primeira prova tenham ganho o mesmo cachê dos que comeram barata e foram eliminados depois", diz. O ator Créo Kellab, 29, diz que não repetiria a experiência. "É complicado falar o que acho do programa. O que eu queria falar, não posso", esquiva-se ele, que está tentando entrar numa das novelas da emissora.

"Felizes" A maioria dos competidores, entretanto, acha que a repercussão vale o sacrifício. O bicampeão mundial de jiu-jitsu conhecido como Malibu, 44, exulta: "Tô até rouco de tanto falar com as pessoas na rua". Andréa Carregal, 32, inspetora da Polícia Civil, se considera uma vencedora. "Meu chefe avisou que, se eu não me saísse bem, poderia até ser transferida. Mas, depois, disse que não teria feito o que fiz."
Marcia Cruz, 26, produtora de eventos, é outra que só queira cumprir as provas. Campeã, foi uma das que se deitaram numa cova com 300 ratos. Apesar do estresse, afirma que foi paga para se divertir. "Fui lá só para participar, não pela fama ou pelo dinheiro. Os outros diziam que só aparecer no programa já valia a pena. Mas como é que você vai se sujeitar a coisas que não gosta só para aparecer?"


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