São Paulo, Domingo, 25 de Abril de 1999
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Reviravoltas de "Suave Veneno" e ritmo mais ágil de "Andando nas Nuvens" são os recursos usados pelos autores da Rede Globo em época de baixa no Ibope
Caindo das nuvens

Divulgação
O casal Débora Bloch e Marcos Palmeira, de "Andando nas Nuvens"


PATRICIA DECIA
da Reportagem Local

A receita da Globo para fazer das novelas sucessos de audiência desandou. Os números do Ibope mostram que muito menos gente assiste às produções de dramaturgia no horário nobre.
As três novelas exibidas atualmente, "Pecado Capital", "Andando nas Nuvens" e "Suave Veneno", não conseguiram alcançar sequer uma vez a meta de audiência média, definida pela emissora e batizada de "trilho" (leia quadro ao lado).
Mas seria injusto dizer que a Globo está engolindo fracassos. É muito mais próximo da realidade considerar que a audiência desceu um (largo) degrau.
Nesse novo cenário, os autores têm de adaptar-se a procurar soluções dentro dos limites do "padrão global" -sem muito espaço para a ousadia.
A trama das sete, escrita por Euclydes Marinho, é um bom exemplo. O próprio autor afirma que escreve "mais uma novela", com os ingredientes necessários para o horário: humor, melodrama e mistério (leia texto abaixo).
Sua contribuição pessoal para temperar a "saladinha" básica passa pelo ritmo. Marinho nunca havia escrito uma novela, mas faz há mais de uma década minisséries e seriados.
"Procuro uma construção mais ágil. Faço cenas curtas e tenho conseguido evitar as cenas de repetição", afirma Marinho.
"Andando nas Nuvens" não decolou -tem atingido média de cerca de 31 pontos, 14 a menos do que o "trilho"-, mas o caminho da "agilidade" não estaria equivocado.
Pelo menos, essa estratégia bate com a opinião de Renata Pallottini, professora, coordenadora do Núcleo de Pesquisa de Telenovelas da ECA/USP e autora de "Dramaturgia de Televisão".
Segundo ela, é preciso encurtar as novelas para, no máximo, 120 capítulos, eliminando a "encheção de linguiça" que afasta o telespectador. "Com 200 capítulos, há uma "barriga" inevitável. Sem ela o andamento das novelas seria mais atrativo, com mais conteúdo", diz.
Mas por que o público está rejeitando a "encheção de linguiça"? A origem de tudo estaria no controle remoto, que aumentou as chances da concorrência.
Aguinaldo Silva, autor de "Suave Veneno", diz que a concorrência mudou o público e que o autor também tem de mudar.
Prejudicado pela data de estréia da novela, no período tradicionalmente fraco de audiência que é o pré-Carnaval, Silva já foi obrigado a promover algumas "viradas", em "Suave Veneno".
Ele nega, porém, que elas tenham sido provocadas pelos baixos índices de audiência. Mesmo sabendo que sua novela registrou o mais baixo ibope, historicamente, do horário das oito: 31 pontos (cada ponto no Ibope equivale a cerca de 80 mil pessoas na Grande SP). "Todas as mudanças já estavam previstas", afirma.
A mais nova reviravolta de Aguinaldo é usar o tradicional recurso do assassinato. A morte da advogada Clarice (Patrícia França) vai transformar os personagens principais, como Waldomiro (José Wilker) e Inês/Lavínia (Glória Pires) em suspeitos.
Outra mudança de rumos deve atingir Eliseu (Rodrigo Santoro), o galã que ainda não emplacou. Mais uma mulher, interpretada pela atriz Mylla Christie, deverá disputar o coração do rapaz.
Para Pallottini, aliás, a ausência de um galã de fato é um dos principais problemas da novela.
"Ele ficou confinado no apartamento dezenas de capítulos. Só beijava a mocinha e pintava", diz.
"Parece que isso agora está sendo sanado. Mesmo assim, falta maturidade e força a Santoro. Ele ainda não é um galã. E, de repente, a gente acaba se enganando com o Nuno Leal Maia", afirmou.
Ainda entre os ajustes, Pallottini nota como Aguinaldo Silva mudou o foco "empresarial e mercantilista" do início da novela. "Esse motivo comercial, a disputa de poder dentro de uma empresa familiar, é estranho, abstrato para o público em geral", afirma.
O resultado é que recursos "clássicos" da dramaturgia televisiva, vingança e assassinato, vêm tentar resgatar a audiência.


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