CINEMA

A Culpa É do Fidel!

Política se submete à perspectiva infantil

Sérgio Rizzo

As conexões entre a política do planeta e seus reflexos no cotidiano da família embaralham a percepção de Anna (Nina Kervel-Bey) e de seu irmão caçula (Benjamin Feuillet) em "A Culpa É do Fidel!", espirituosa estréia na ficção da documentarista Julie Gavras, filha do diretor Costa-Gavras (de quem foi assistente em "Amém").

França, início dos anos 70. Para Anna, 9, barbudos são "comunistas que querem a guerra nuclear". Os pais, militantes de esquerda, a apelidam de "pequena múmia", em referência aos adversários de Salvador Allende, então presidente do Chile, cujas reformas o casal apóia.

Um dos principais nomes do cinema político contemporâ neo, Costa-Gavras explorou o golpe militar que derrubou Allende em "Desaparecido" (82). O tom adotado por Julie a aproxima mais, no entanto, de outra representação do mesmo período, o chileno "Machuca" (04), de Andrés Wood, em que o conturbado cenário político também se submete à perspectiva infantil.

Aqui, pai (Stefano Accorsi) e mãe (Julie Depardieu, filha de Gérard) vivem diante dos filhos os dilemas de quem se preocupava, naquele momento, em intervir de alguma forma na sociedade. "A Culpa É do Fidel!" sugere que essa talvez seja a maior herança que se possa deixar.