Quem transita pelos 2,7 km do Elevado Presidente João Goulart, mais conhecido como Minhocão, já nota uma diferença nas placas de vende-se ou aluga-se: afixadas em janelas, elas já mencionam o Parque Minhocão como chamariz.
O assunto não é novo -a eventual desativação do elevado entrou na pauta do governo municipal em 1976, quando a via, cinco anos após a inauguração, passou a ser interditada à noite.
Agora, porém, saiu da esfera das ideias para a prática. Determinada pelo Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo de 2014, a criação de um parque no Minhocão começa a ganhar cara.
Diversos projetos para a requalificação da via, assim como propostas para resolver questões complicadas, entre elas o impacto no trânsito, estão em consulta pública desde o dia 17 de maio no site participe.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br.
"Sei que minha vida não será fácil nos próximos meses", brinca o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, Fernando Chucre. "É possível que a versão final seja uma colagem de vários projetos", adianta.
Mestre em Arquitetura e Urbanismo e membro da Associação Parque Minhocão, Felipe de Souza Silva Rodrigues diz que os futuros arquitetos poderão oxigenar a discussão com ideias criativas.
"Parece que a gestão municipal conseguiu compreender a complexidade do tema e o enorme potencial de transformação do centro."
O prazo para que governantes, iniciativa privada e população façam a primeira rodada de discussões vai até 14 de junho. Mas, independente do formato final do projeto, o mercado imobiliário já tem uma certeza: o futuro Parque Minhocão já começou a transformar radicalmente todo o entorno. E para melhor.
Há cinco meses, a BKO entregou a torre de estúdios BK30 Largo do Arouche, a 260 metros da via.
Segundo Carlos Gustavo Marucio, diretor de incorporação da BKO, também pesou na decisão da empresa a reforma do Largo do Arouche.
Desenvolvido pelo escritório de arquitetura Triptyque, o projeto será executado com recursos doados pela comunidade francesa no Brasil. A praça ganhará banheiros, bulevar, bebedouros e mais bancos e postes de iluminação.
"A transformação do centro passa por uma série de medidas, porém o Parque Minhocão será o maior marco dessa mudança", afirma Marucio.
Quem também apostou antecipadamente na valorização da região foi a Helbor. A incorporadora entregou no ano passado dois prédios colados ao futuro parque.
Um deles, o Urban Resort, foi erguido na Praça Julio de Mesquita. O outro, batizado de Trend Higienópolis, ocupa um terreno na esquina das ruas Santa Isabel e Amaral Gurgel, a 5 minutos a pé do Largo do Arouche.
Marcelo Bonanata, diretor de vendas da Helbor, conta que a clientela é formada basicamente por jovens e investidores, além de médicos que trabalham na Santa Casa.
O executivo diz que nos quatro anos entre o lançamento e a entrega já houve uma mudança na demanda na região. "Quando lançamos os empreendimentos, fomos conservadores e projetamos garagem para todas as unidades. Hoje, eu repensaria a decisão, pois esse tipo de público já não encara a vaga como fator preponderante", afirma.
Não é só a região ao redor do Minhocão que tem atraído lançamentos. Construído pela Setin Incorporadora diante da Praça da República e entregue em 2018, o Downtown República tem estúdios de 28 metros quadrados e apartamentos de até 71 metros quadrados.
No terreno ao lado, a Setin vai lançar um empreendimento no segundo semestre, ainda sem nome. Estúdios de 16 metros quadrados e unidades de 120 metros quadrados, com três dormitórios, conviverão no mesmo prédio, equipado com espaço de coworking.
O padrão de acabamento terá "nível de Jardim Paulista", nas palavras de Antonio Setin, presidente da incorporadora.
A maior diferença em relação os prédios gêmeos, ele explica, será a garagem, que não faz parte do empreendimento mais recente.
"No Downtown República, as poucas vagas que construímos micaram, praticamente não vemos marcas de pneus. Para o próximo lançamento, previmos espaço para bicicletas compartilhadas e oficina para consertos."
Para Setin, o que falta para o centro de São Paulo deslanchar de vez e recuperar o glamour de outros tempos é uma atuação mais intensa do poder público.
Ele cita entre os problemas da região a cracolândia, a degradação da área sob o Minhocão e as ocupações irregulares, que interferem diretamente na sensação de segurança dos moradores.
"Se essas questões forem resolvidas de fato, podemos esperar uma explosão imobiliária no centro", afirma.