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Agência antidoping do Brasil contratou funcionários de modo irregular

A ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem) atrasou em nove meses o pagamento a oficiais de coleta de amostras de sangue e urina de atletas do país, como a Folha revelou em maio, porque fazia com eles somente contratos ditos "de boca", sem comprovação legal.

Agora, para restituí-los, recorreu ao socorro de uma confederação e a uma licitação em caráter de urgência.

A situação acontece a menos de 40 dias para o início dos Jogos Olímpicos do Rio, em um momento em que o antidoping é tido como um tema prioritário e delicado.

Na sexta (24), o LBCD (Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem), onde seriam feitos os testes da Olimpíada, foi descredenciado pela Agência Mundial Antidoping por erros da equipe –ele pode reaver a certificação.

Agentes consultados pela Folha confirmaram que não havia vínculo firmado entre eles e a ABCD. Havia apenas controle interno das missões designadas, segundo o qual sabiam os valores a receber.

A inexistência da documentação impedia a liberação de dinheiro aos profissionais, que ficaram de setembro de 2015 a maio sem receber diárias, cujos valores variavam entre R$ 100 e R$ 500.

Como a ABCD é uma secretaria no Ministério do Esporte, ela não pode efetuar pagamentos diretamente. Cabe à pasta repassar legalmente recursos e fazer contratações.

Ou seja, para receberem, os oficiais deveriam ser contratados por licitação ou concurso, o que não aconteceu.

Como não havia dispositivo legal para compensá-los, a autoridade contraiu a dívida que chegou a R$ 400 mil e atingiu 70 profissionais.

Na época, o então secretário para a ABCD, Marco Aurelio Klein, disse que o atraso se devia a "problemas burocráticos" e o relacionou à troca de ministros (entre março e maio, George Hilton, Ricardo Leyser e Leonardo Picciani passaram pelo cargo).

Klein foi exonerado do cargo nesta sexta-feira (1º). Seu substituto, já nomeado, é o ex-judoca Rogério Sampaio, ouro nos Jogos de Barcelona.

Eduardo Knapp/Folhapress
O ex-secretário nacional da ABCD, Marco Aurelio Klein
O ex-secretário nacional da ABCD, Marco Aurelio Klein

SOCORRO

Após a revolta dos oficiais em maio, a ABCD, pressionada, se propôs a pagá-los, mas seguia sem meio para fazê-lo.

A agência pediu à Unesco, com quem tem parceria, abrir no final de março licitação para contratar empresa que, entre outros serviços, remunerasse os agentes.

No texto da concorrência, visto pela reportagem, não fica evidente que a contratação é para pagar os agentes.

Ainda assim, o diretor de operações da ABCD, Ronaldo Dias, disse que o vencedor do edital (Instituto de Pesquisa em Saúde Aluisio Calil Mathias, de São Paulo) pagou a oficiais outros cerca de R$ 150 mil, por meio de cheque.

A entidade também pediu socorro à CBAt (Confederação Brasileira de Atletismo).

Segundo Dias, a confederação pagou R$ 150 mil a oficiais antidoping que tinha valores a receber da ABCD.

"Ela nos salvou", disse, sem especificar por qual instrumento foi feito o repasse. Ele afirmou que a CBAt havia recebido dinheiro para fazer exames antidoping em 2015.

OUTRO LADO

O diretor de operações da ABCD, Ronaldo Dias, reconheceu que os contratos foram feitos "de boca" com oficiais de controle antidoping.

"Logo que começamos a fazer testes depois da reabertura do LBCD [no primeiro semestre de 2015], pedimos ao jurídico para contratá-los, mas a lei brasileira impede".

Ele argumentou que a agência nacional "quis começar a fazer os trabalhos", ou seja, realizar os exames antidoping, porque corria risco de ser descredenciada pela Wada (Agência Mundial Antidoping).

"Estávamos obrigados a fazer porque, caso contrário, ficaríamos em inconformidade [com as normas da Wada]", afirmou.

Segundo Dias, esperar definir um modo legal de contratar os oficiais, o que seria o correto segundo regimento da administração pública, não era possível.

"Não fazer [os testes] não era uma opção. Perderíamos nossa certificação desse jeito", comentou.

Segundo Dias, o apoio em dinheiro advindo da CBAt e o pagamento via Instituto de Pesquisa em Saúde Aluisio Calil Mathias foram as "salvações" para a ABCD.

A agência nacional tentou aprovar uma lei para viabilizar um meio de pagar os agentes, mas encontrou resistência jurídica. A entidade promete tentar passá-la.

O presidente da CBAt, José Antonio Martins Fernandes, confirmou à reportagem que socorreu a ABCD.

Antes da criação da autoridade, a confederação tinha uma agência antidoping própria, chamada Conad, para a qual trabalhavam diversos oficiais antidoping.

ABCD EM NÚMEROS
Confira algumas curiosidades sobre o órgão

2011
Foi o ano em que a ABCD foi criada

R$ 188 milhões
Foi o valor pago pelo governo federal para a construção do laboratório antidoping brasileiro

5.500
É o número de exames que devem ser feitos na Rio-2016

3.700
Kits antidopagem foram adquiridos pela ABCD para os eventos-testes dos Jogos Olímpicos

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