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Ainda membro do COI, Havelange foi o principal cabo eleitoral da Rio-2016

Dois anos antes de renunciar ao posto no COI (Comitê Olímpico Internacional) para evitar expulsão por suspeita de corrupção, o ex-presidente da Fifa João Havelange foi um dos principais cabos eleitorais da candidatura do Rio para sediar a Olimpíada.

Membros do COI se referiram ao brasileiro como "patrón", responsável por abrigar exilado e abrir as portas para a cúpula do comitê.

As referências a Havelange fazem parte dos documentos do Itamaraty obtidos pela Folha sobre a campanha do Rio para ser escolhida, em 2009, sede da Olimpíada deste ano, reveladas no último domingo (31).

A repetição de seu nome provocou entre os diplomatas o alerta já conhecido entre os executivos do comitê de candidatura: Havelange deveria se engajar para o Rio vencer.

Em março de 2009, um representante da embaixada brasileira em Manila (Filipinas) visitou o empresário Francisco Elizalde, membro do COI desde 1985. A conversa demonstrou o peso do apoio de Havelange à candidatura brasileira.

"O representante filipino no COI se declarou amigo de muitos anos dos dois brasileiros membros, João Havelange e Carlos Arthur Nuzman. Sobre o primeiro disse ser seu 'patrón', palavra do filipino emprestada ao espanhol. Afirmou sem meias palavras que foi Havelange quem o fez membro do comitê", relatou o posto em Manila –em alguns casos o documento não tem assinatura.

O ex-presidente da Fifa ganhou poder político no futebol ao ampliar a participação na cúpula do esporte para membros africanos e países latinos sem tradição. Atuou da mesma forma no COI, o que lhe rendeu admiração dos cartolas de países pobres.

"Havelange seria certamente a pessoa ideal para 'garantir' o voto favorável ao Rio do ex-primeiro-ministro tunisiano. [Mouhamed] Mzali confidenciou-me que quando fugiu da Tunísia para exilar-se na Suíça, Havelange foi um dos dois únicos amigos que o acolheram", escreveu a embaixada do Brasil em Túnis, capital da Tunísia.

O cartola brasileiro renunciou ao cargo no COI em 2011, para evitar expulsão em razão de investigação sobre o escândalo de corrupção na Fifa durante sua gestão.

As articulações durante os 48 anos em que esteve no comitê foram fundamentais para garantir sua influência.

O sul-africano Sam Ramsay "lembrou que foi Havelange quem expulsou, em 1976, a África do Sul apartheidista dos Jogos Olímpicos e que, em 1978, logrou aumentar a representação africana do COI de um para cinco delegados". "Realçou que a África jamais esquecerá esses gestos."

O mexicano Mário Vázquez, contudo, alertou que o ex-presidente da Fifa deveria moderar o entusiasmo.

"Ele criticou o que teria sido 'un error fatal' cometido por João Havelange. Segundo Vásquez, Havelange teria enviado cartas em favor da candidatura do Rio a integrantes do COI e, após receber algumas respostas, teria se precipitado e anunciado na imprensa que a candidatura contaria com amplo apoio por parte do COI. Tal atitude teria irritado alguns integrantes do comitê, o que poderia 'custar ao Brasil de 12 a 15 votos'", escreveu o embaixador Sérgio Florêncio.

CAMPANA EM HOTÉIS

Os principais atores da campanha eram os executivos da candidatura do Rio Carlos Arthur Nuzman, Leonardo Gryner, Carlos Roberto Osório, Agberto Guimarães e Mario Cilenti. Não há registro nos papéis do Itamaraty sobre o teor dos diálogos entre eles e os membros do COI.

A campanha para sediar os Jogos foi caracterizada como uma "usina de fofocas", com abordagens, por vezes, "pouco dignas".

"Passar dias e horas ancorados em lobbies de hotéis, de campana, aguardando a entrada ou saída de eleitores só para tentar puxar alguns minutos de conversa ou simplesmente dizer um 'oi' era algo ão só chatíssimo como também, muitas vezes, desumano e pouco digno", escreveu Carlos Roberto Osório, secretário-geral do comitê de candidatura, em livro distribuído a seus colaboradores.

Os executivos mantinham um arquivo comum, atualizado constantemente, que disponibilizava nos BlackBerry a ficha de cada eleitor com as últimas informações coletadas na campanha.

De acordo com integrantes da Rio-16, todas as conversas ocorreram durante eventos esportivos internacionais, respeitando as regras do COI. Mas elas eram "esticadas ao máximo possível", segundo um deles. Até inauguração de sede de federação servia para uma tentativa de angariar votos.

"Campanhas desse tipo são verdadeiras usinas de fofocas, com quinhentas teorias conspiratórias surgindo a cada dia", escreveu Osório, atualmente deputado e candidato à Prefeitura do Rio pelo PSDB.

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