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REFLEXÃO


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urbanidade
04/08/2004
Um porão supremo

Um dos palcos mais importantes na vida do pianista e compositor Benjamin Taubkin é o porão de 300 metros quadrados da casa de número 1.000 da rua Oscar Freire. A partir do próximo mês, o espaço passa para a história -não resistiu à supremacia das grifes que imperam nos Jardins. "É uma história que se fecha", diz Benjamin, fundador da Orquestra Popular de Câmara e arranjador da aplaudida trilha do balé "Samwaad - Rua do Encontro", de Ivaldo Bertazzo.

Por achar que os músicos instrumentais brasileiros não tinham uma gravadora disposta a divulgá-los, Benjamin foi um dos criadores, em 1996, do selo Núcleo Contemporâneo -um projeto tão visível comercialmente como o porão da Oscar Freire. O palco improvisado do porão foi para eles uma espécie de misto de vitrine com laboratório de experimentações, que se tornou conhecido por músicos de várias partes do mundo em passagem pela cidade. "Tínhamos à nossa disposição um excepcional piano, o que é raríssimo de encontrar num bar."

O reduto se desfaz agora porque o bar em que era acolhido, o Supremo, não resistiu à especulação imobiliária. A grife espanhola Custo Barcelona adquiriu o imóvel. Entre os clientes da marca estão a atriz Julia Roberts e a ex-modelo Claudia Schiffer. Não é exatamente um batalhão fácil de enfrentar por gente interessada menos nas grifes do que na experimentação musical.

Benjamin conta que, quando começou a tocar, a referência obrigatória dos músicos instrumentistas brasileiros era o jazz. Uma nova geração passou a se inspirar mais nas produções nacionais -e isso se deve, em parte, à troca de conhecimento que ocorria no piso subterrâneo do Supremo. Para ele, está acontecendo o que chama a "lei" de Caetano Veloso sobre a cidade, exposta na letra de "Sampa": a "força da grana que ergue e destrói coisas belas". "É assim mesmo, temos de entender os novos tempos", resigna-se Benjamin.

Não se sabe onde e quando (ou se) o Supremo vai ser reerguido. Mas Benjamin e sua tribo de experimentadores não têm dúvida de que, também segundo a "lei" de Caetano, terão sempre um porão. "Outro lugar vai surgir para abrigar essa inquietude."


Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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