Ex-aluno
do curso de artes cênicas da Universidade Federal de
Santa Maria, os seis amigos vieram tentar a sorte na vida
teatral de São Paulo, com o grupo Santa Víscera.
Mas, no começo, a plateia eram os fregueses dos restaurantes
em que faziam bico de garçom e garçonete. O
roteiro se limitava aos cardápios. Decidiram, porém,
viver só de teatro, mesmo que o palco fosse a rua.
Mas, em suas exibições, mantiveram o hábito
de mostrar o cardápio para que o espectador fizesse
suas escolhas. Nessa experiência, batizada de "Vendem-se
cenas", são listadas cenas de diferentes peças
famosas (Navalha na Carne, Macabéa, Os Saltimbancos,
por exemplo).
A peça é explicada no cardápio; a cena,
escolhida ao gosto do freguês. "Queríamos
levar o teatro a quem nunca foi ao teatro", conta Lara
de Bittencourt, uma das atrizes.
Seus palcos são montados em diferentes pontos da avenida
Paulista, especialmente em frente ao Masp e ao parque Trianon,
rumando para a praça da República e o bairro
da Liberdade.
No final de cada encenação, eles passam um
questionário e, assim, descobriram que 36% da plateia
nunca tinha visto, até então, uma peça.
"O que queríamos era mostrar nosso trabalho em
lugares inusitados", diz Marco Antonio Barreto, também
ator do Santa Víscera.
"Santa" é uma homenagem a Santa Maria -de
onde vieram-, mas também é devoção;
"Víscera", explicam os atores, significa
a entrega total.
Cada cena custa, como esclarece o cardápio, a partir
de R$ 4. "Muitos gostam e deixam mais dinheiro",
conta Marco Antonio. E quem não pode pagar assiste
de graça.
O modelo, até agora, está funcionando: os seis
amigos e atores vêm conseguindo bancar as despesas do
apartamento que dividem em São Paulo. A sala é
reservada para os ensaios do grupo.
Houve um dia em que eles ficaram encenando, sem parar, das
18h às 22h, para uma plateia ambulante -alguns, sem
nada o que fazer, ficaram até o final do espetáculo.
Uma das melhores cenas que o grupo viu não estava em
suas peças, mas na plateia. Um engraxate, no parque
Trianon, ficou alucinado com a possibilidade de dar ordens
aos atores e comprou seis cenas seguidas.
Acabou o dinheiro e aí ele só ficou assistindo,
sentado em sua caixa de madeira -nesse caso, como bom freguês,
teve direito a um desconto especial.
O projeto do Santa Víscera é não cobrar
de ninguém -o que os coloca na fila dos que sonham
com algum patrocínio.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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