REFLEXÃO


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urbanidade
09/07/2008

Caçadores de orquídeas perdidas

Quando a cidade souber desse projeto, muitos paulistanos irão sair caçando as orquídeas desperdiçadas


A Argentina Adriana Irigoyen está fazendo surgir um hobby ecológico na cidade de São Paulo: o de "reciclador de orquídeas". O resultado dessa mania só será visto, porém, no próximo ano no canteiro da avenida 9 de Julho -e isso não é nenhuma espécie de tributo poético à Revolução de 1932, comemorada hoje. "Vamos fazer daquela avenida a rota das orquídeas."

A história dessa tribo paulistana começa com a admiração de Adriana pela arquitetura moderna, tema de seu mestrado na USP. Para seu supremo prazer, ela foi morar num prédio da avenida 9 de Julho projetado por Rino Levi, o expoente da moderna arquitetura brasileira. Para sua tristeza, contudo, o prédio estava repleto de problemas de conservação. "Essa combinação de prazer com aborrecimento me levou a aceitar o cargo de síndica."

Como tem apreço pelas causas ecológicas -para evitar a poluição, costuma andar a pé-, Adriana criou, no prédio, a coleta seletiva de lixo.

Ela notou que, depois das festas, as orquídeas eram jogadas fora, quando poderiam ser reutilizadas desde que replantadas. "As pessoas têm preguiça de replantar a orquídea ou não sabem fazê-lo, afinal isso exige certa técnica."

Naquela mesma época, ela tinha se envolvido no plantio de árvores no canteiro da
avenida 9 de Julho, quando conheceu o advogado Paulo Visani Rossi, seu vizinho. "Fiquei entusiasmado com essa idéia de salvar as orquídeas", conta Paulo, que fez contato com uma empresa de festas que costumava descartar aquelas flores -desde o começo do ano, o condomínio recebeu por mês 60 mudas só dessa empresa.
Foi um contato estratégico para o projeto. Paulo já vinha desenvolvendo para empresas projetos de melhoria de espaços públicos, especialmente de jardins públicos. Sabia que, se houvesse doações, o gasto seria baixo. "Seria apenas o custo do jardineiro."

Rapidamente, outros vizinhos começaram a fazer a coleta de orquídeas para replantá-las. Os vizinhos passaram a envolver os síndicos, que, por sua vez, contataram os jardineiros de seus prédios. Mais gente se dispôs a plantar as mudas. Adriana aposta que, quando a cidade souber desse projeto, muitos paulistanos irão sair caçando as orquídeas perdidas, desperdiçadas nas centenas de festas.

Sua satisfação íntima, a ser desfrutada apenas no próximo ano, é a vista mais bela de seu apartamento -é como se ela própria interferisse na paisagem composta por Rino Levi, num tributo à arquitetura moderna.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
   
 
 

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