"Por
que um camelô não podia vender com cartão
de crédito?" Ali, começava uma nova história
para Tiago
Tiago dos Santos Maciel ainda era criança quando começou
sua carreira de camelô vendendo pão nas ruas
de Jacobina, no interior da Bahia. Na época, já
apostava que seu futuro estava em São Paulo. Acertou:
ele acaba de ajudar a inovar o comércio ambulante paulistano,
ao enveredar pelas novas tecnologias.
Sua ousadia impressionou a ponto de ter sido chamado para
fazer um relato de suas experiências num hotel de luxo
diante de centenas de executivos, a maioria dos quais com
ensino superior e com cursos de especialização
em administração.
"Por que um camelô não podia vender com
cartão de crédito?" Essa foi a pergunta
que Tiago se fez quando viu, no centro de São Paulo,
um cliente pagar a conta de um restaurante diretamente ao
garçom por meio de uma máquina conectada por
satélite à internet.
Naquela pergunta, começava uma nova história
-tanto para Tiago como para os usuários de cartões
de crédito. "Imaginei que, com aquela máquina,
talvez eu pudesse vender mais bijuterias."
Faz cinco anos que Tiago chegou a São Paulo, estimulado
por um parente que elogiou sua habilidade na venda de pão
em Jacobina -quando o pão acabava, ele vendia picolés.
"Foi um tio que me disse que, com meu talento, eu tinha
de conhecer a [rua] 25 de Março."
Seu primeiro emprego, porém, foi o de fiscal de ponto
de táxi em frente ao hospital Sírio-Libanês.
Por sua rapidez, logo chamou a atenção de funcionários
do hospital, que o convidaram para trabalhar como office-boy,
com direito a carteira assinada e a benefícios médicos.
Não deu certo. "Eu não conhecia as ruas."
Talvez não tenha dado certo por outro motivo: seu espírito
empreendedor.
Ao deixar o hospital, levou R$ 250 e foi para a rua 25 de
Março, tão falada em Jacobina. Investiu tudo
em bijuterias. Ao observar, no ano passado, o garçom
com a máquina de cartão de crédito, viu
ali um diferencial de marketing. Para ter direito a usá-la,
entretanto, era necessário legalizar seu negócio
-o que significava não só pagar impostos, mas
comprar com nota fiscal, o que não é exatamente
norma entre camelôs. "Fiz tudo o que me pediram."
Pelos seus cálculos, as vendas cresceram 20%. O caso
chamou a atenção dos administradores de uma
bandeira de cartão de crédito (Visa) -já
se conheciam camelôs que usavam a máquina, mas
todos com ponto fixo e barraca. A diferença é
que Tiago sempre anda pela cidade, carregando a mercadoria.
Pediram a ele que fosse contar sua história -assim,
Tiago, no dia 27 de fevereiro, entrava pela primeira vez num
hotel de cinco estrelas e, ainda por cima, falava para gente
que nem de longe se dignaria em dar ouvidos à exposição
das habilidades de gestão de um camelô.
Isso é apenas o começo. Depois de descobrir
o cartão de crédito, Tiago já se prepara
para vender suas bijuterias pela internet -desta vez, vai
aprender a caminhar pelas redes virtuais.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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