Folha Online Ilustrada  
Crítica
06/09/2002 - 03h27

"Uma Onda no Ar", de Helvécio Ratton, amplifica voz da favela

JOSÉ GERALDO COUTO
Colunista da Folha de S.Paulo

Para o bem e para o mal, "Uma Onda no Ar", de Helvécio Ratton, é o contraponto perfeito e inevitável de "Cidade de Deus". Os dois filmes contam histórias contemporâneas ambientadas na favela. À parte essa semelhança, são opostos em tudo.

Para começar, as favelas em questão são bem diferentes. Em vez do inferno do crime em que se transformou a Cidade de Deus, a favela de Belo Horizonte retratada em "Uma Onda" guarda resquícios de vila semi-rural, onde até os bandidos dizem "sim senhor" e "dá licença".

Outra diferença radical é de enfoque. Enquanto o filme de Fernando Meirelles encena o domínio onipresente da violência, Ratton aponta sua câmera para uma experiência vitoriosa de alternativa à barbárie: a Rádio Favela de Belo Horizonte.

A emissora comunitária surgiu no início dos anos 80 no aglomerado da Serra, conjunto de favelas com 80 mil habitantes. Inúmeras vezes a polícia fechou a rádio e prendeu seus líderes. Mas a emissora vingou, conquistou o apoio do morro e a simpatia "do asfalto". Foi premiada pela ONU e reconhecida como rádio educativa.

No filme, essa bela história é sintetizada na trajetória de Jorge (Alexandre Moreno, melhor ator no Festival de Gramado), personagem livremente inspirado em Misael Avelino dos Santos, criador e líder da Rádio Favela.

Ratton diz que viu a história como uma espécie de fábula. Isso explica a inserção, em "Uma Onda", de sequências de filme musical, em que os atores desatam a cantar no meio da rua.

Por outro lado, o diretor resolveu adotar uma "estética documental" para narrar essa fábula. Optou por fazer um filme sem firulas e sem tecnologia digital. Filmou na própria favela, em super-16mm, aproximando-se, nesse aspecto, de uma certa tradição oriunda do cinema novo.

Outra herança cinemanovista, o desejo de intervenção política, está presente desde a escolha do tema. Ao falar da Rádio Favela, Ratton toma partido automaticamente dos que querem mudar a sociedade a partir de baixo. Se há maniqueísmo, é entre opressores e oprimidos, não entre bandidos bons e bandidos maus, como em "Cidade de Deus".

Ocorre aqui uma operação interessante: se o discurso político é o que torna pesados tantos filmes brasileiros, "Uma Onda" escapa disso ao deixar a própria Rádio Favela falar. De certo modo, não é o filme que dá voz ao morro, é o morro que dá voz ao filme. O que este tem de mais vivo são a música, o humor irreverente e a veemência crítica da própria rádio.

Mas, à luz da esmagadora competência cinematográfica de "Cidade de Deus", ficam mais evidentes algumas fraquezas de "Uma Onda no Ar", também elas herdeiras de uma longa tradição de autocomplacência do cinema brasileiro: certa artificialidade dos diálogos, atuações canhestras de alguns coadjuvantes, dificuldade na encenação de sequências com muitos personagens.

Sempre haverá quem considere esses defeitos sinal de "frescor" ou "vitalidade" e torça o nariz para os triunfos técnicos e de linguagem de "Cidade de Deus", considerando-os mero verniz para esconder seu vazio moral.

Mas será que o compromisso ético-político não pode conviver com um maior empenho narrativo e formal? Não seria mais produtivo reconhecer e fecundar as conquistas dessas duas vertentes?

Uma Onda no Ar
Produção: Brasil, 2002
Direção: Helvécio Ratton
Com: Alexandre Moreno, Babu Santana, Adolfo Moura
Onde: em cartaz no Espaço Unibanco 2, Sala UOL de Cinema e circuito

   
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