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Por "dinheirinho", sem-terra decidem se "aquietar" em PE
Agricultores remanescentes de invasões dizem não ver resultado nas ações de reforma agrária e preferir Bolsa Família a se arriscar
Com dois filhos, Evanilson Pereira, lavrador de 28 anos, reconhece que o auxílio de R$ 36 que recebe é pouco, "mas dá para farinha e leite"
FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CARUARU (PE)
Em mais um dia quente do
verão de 2004, trabalhadores
rurais invadiam o sítio Caldeirão, na zona rural de Caruaru
(136 km de Recife, PE), para pedir reforma agrária. Três anos
se passaram e a desapropriação
não veio. Mas os sem-terra não
pensam mais em tomar a área.
Esperam agora a divisão da terra, conformados com o pagamento regular dos programas
sociais pelo governo federal.
"É um dinheiro pouco, mas
dá para a farinha e o leite", disse
o lavrador Evanilson da Silva
Pereira, 28. Remanescente da
invasão de 2004, ele recebe
R$ 36 do Bolsa Família. Continua sem terra. Vive com a mulher e dois filhos no terreno da
casa da mãe, em Lages, a 25 km
do centro de Caruaru.
"Resolvi me aquietar", afirmou o agricultor, que é ligado à
Fetape (Federação dos Trabalhadores na Agricultura). "Tenho dois filhos pequenos para
criar, e é melhor garantir esse
dinheirinho do que me arriscar", declarou.
Pereira disse que foi convidado a participar de outras invasões, mas recusou. Tornou-se
ao mesmo tempo uma espécie
de "refém" da miséria e dos
programas sociais. "Se não tivesse esses programas do governo, eu já estaria batalhando
terra por aí."
Além do Bolsa Família, Pereira já teve acesso ao Pronaf
(Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Com um empréstimo
de R$ 1.000, comprou em sociedade com um amigo dez cabras e bodes. A criação duplicou em pouco tempo, mas os
bodinhos ainda não atingiram
o porte ideal para a venda.
Enquanto os animais não geram lucros, o lavrador procura
aumentar a renda, fazendo "bicos" em fazendas da região. Nos
períodos de chuva, ele planta
milho e feijão às margens da rodovia BR-104.
Em outubro, auge da seca no
Agreste, Pereira só conseguiu
faturar R$ 80 com o trabalho
extra, valor pouco abaixo do
obtido no mesmo período por
outro sem-terra do vilarejo, Severino Inácio da Silva, 30.
Casado, pai de quatro filhos,
Silva também é remanescente
de uma invasão promovida pela
Fetape em 2002, na região. Assim como Pereira, ele diz que
não viu resultado na ação. Agora, prefere esperar a reforma
agrária em casa, recebendo
R$ 78 do Bolsa Família e cuidando do plantel de um boi e
três vacas, formado por meio de
um empréstimo do Pronaf e pela venda de alguns porcos.
"O dinheiro que é certo em
casa é só o do cartão. Se vier
mais, é de bico", disse Silva, que
mora com a família na casa da
sogra. "Tem mês que o dinheirinho do bico nem pareia [empata] com o do Bolsa Família",
afirmou. Em outubro, os trabalhos extras renderam ao agricultor apenas R$ 120.
Mesmo quem recebe pouco
do governo prefere garantir o
benefício a arriscar ser excluído do programa. O valor varia
de acordo com o perfil de cada
beneficiado.
"É pouco, mas adianta. A
ocupação [invasão] não tem futuro para mim", disse o lavrador Nivaldo Félix da Silva, 50.
Ex-militante do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), o agricultor,
que recebe R$ 15 mensais do
governo, participou de uma invasão em Caruaru há um ano e
três meses, mas abandonou o
acampamento.
Hoje, vive com a mulher e
dois filhos em uma casa de taipa. Para aumentar sua renda,
trabalha ensacando cal, serviço
que lhe rendeu diversas feridas
nas mãos e R$ 120 em outubro.
O sem-terra tem no quintal de
casa uma vaca, comprada com
recursos do Pronaf.
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