São Paulo, quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

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COMIDA

Gato por lebre?

No período em que as búfalas não dão leite, a produção de derivados cai; na mesma época, algumas empresas acrescentam leite de vaca à mussarela de búfala, sem declarar a mistura no rótulo

LUIZA FECAROTTA
DA REPORTAGEM LOCAL

As búfalas estão descansando. Neste período de entressafra, que vai da desmama dos filhotes até o nascimento da próxima cria -um ciclo que acontece normalmente entre novembro e janeiro-, os animais não produzem leite. E é justamente no verão, época de maior demanda pela mussarela de búfala, um queijo leve e fresco, que a produção escasseia.
Para manter o mercado abastecido, no entanto, alguns produtos são adulterados e fabricados com uma porcentagem de leite de vaca (mais abundante e barato), não indicada no rótulo. Foi por isso que a Associação Brasileira de Criadores de Búfalo lançou, em 2000, o Selo de Pureza 100% Búfalo, na época aprovado pelo Ministério da Agricultura (leia ao lado).
"Quando um laticínio quer participar do selo, ele paga uma taxa e assina um contrato no qual se compromete a trabalhar somente com leite de búfala", diz a coordenadora do selo de pureza, Marcia Cecilia de Almeida Prado. A empresa também tem de passar por uma avaliação técnica, e seus produtos, por análise. Somente depois é concedida a permissão de uso do selo.
Quatro vezes ao ano são recolhidos produtos derivados de leite de búfala no mercado e encaminhados para o Instituto de Biociência da Unesp, em Botucatu (SP). Lá, as amostras passam por um teste de pureza que detecta se há ou não presença de leite de vaca.
"Levamos três anos padronizando a técnica, com base no que é feito na Europa. Hoje, o resultado é próximo a um código de barras, que mostra a mistura exata dos leites das diferentes espécies", diz Paulo Ramos, zootecnólogo responsável pelo procedimento, mestre e doutor em genética. Segundo ele, um trabalho similar feito no laboratório da universidade apontou que, dentre as marcas sem o selo de pureza, 20% apresentavam mistura.
"Na entressafra, a mistura é muito maior", diz a coordenadora do selo. "No começo do ano passado, cerca de 60% dos produtos analisados que não possuíam o selo apresentaram misturas de até 80% de leite de vaca." Ela não revela, porém, quais são as marcas que apresentaram adulteração.

Leite bovino
Com o acréscimo de leite bovino, a mussarela fica menos macia e levemente mais ressecada. "Para o bom conhecedor, a mussarela de búfala tem um aspecto mais fibroso, consequência de cadeias mais longas de proteína. Uma bola se desfaz em camadas, mais ou menos como uma cebola. Quando feita com leite bovino, se esfarela", diz Claudio Varella Bruna, engenheiro agrônomo, sócio e gerente do laticínio La Vera.
O leite de vaca também torna o produto final mais amarelado, mas, segundo os criadores, algumas empresas utilizam substâncias branqueadoras para camuflar a mistura. "São produtos específicos para despigmentar o queijo", diz o agrônomo.
Apesar disso, há aqueles que não se preocupam com a certificação. Gianni Auricchio, proprietário do laticínio La Bufalina, há dez anos no mercado, não tem interesse em adquirir o selo. "Nosso produto é artesanal e controlado. Fazemos purificação do leite a cada mês", diz Auricchio.


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