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ARTIGO
O maior problema de Israel
Crescimento populacional desigual entre árabes e israelenses ameaça poder de dissuasão e põe em xeque política de Washington e Jerusalém para a região
PAUL KENNEDY
Ao resenhar o polêmico novo
livro de John Mearsheimer e
Stephen Walt, "The Israel
Lobby and U.S. Foreign Policy"
(o lobby de Israel e a política
externa americana), no "New
York Times", o comentarista de
relações exteriores Les Gelb
observou que o "relacionamento especial" entre Israel e EUA
provocou desavenças desde o
primeiro momento.
Os americanos sempre tiveram opiniões divididas sobre
até que ponto deveriam se envolver nos problemas do Oriente Médio e apoiar Israel.
Gelb recordou os dois pontos
de vista totalmente opostos
apresentados ao presidente
Harry S. Truman no período
crítico de 1946-1947, quando o
Reino Unido anunciou sua retirada da Palestina e quando árabes e judeus se preparavam para lutar por esse território.
O assessor jurídico do presidente, Clark Gifford, argumentou que os EUA tinham a obrigação moral de apoiar a criação
de um Estado judaico, em vista
do pouco caso demonstrado
pelo mundo em relação ao Holocausto nazista. Já o respeitado secretário de Estado de Truman, George Marshall, achou
que o reconhecimento de Israel
prejudicaria as relações dos
EUA com o mundo árabe de
forma permanente. Truman
rejeitou o conselho de Marshall, com isso possibilitando a
criação do Estado de Israel.
A sinopse traçada por Gelb
dos receios de Marshall me levou a voltar a um artigo que escrevi há cerca de seis anos sobre desequilíbrios demográficos entre judeus e árabes.
Os dados da tabela nesta página são do Banco de Dados Internacionais do Birô do Censo
dos EUA e representam os totais populacionais de Israel e
seus vizinhos em 1973 (ano da
Guerra do Iom Kipur) e de
2006, e os números projetados
dizem respeito a 2050.
A lição é clara: Israel, apesar
de seus próprios altos níveis de
fertilidade, possui peso demográfico cada vez menor para influenciar a paisagem geopolítica do Oriente Médio.
Assim, a perspectiva demográfica global para o Estado de
Israel é extremamente sombria
-como previu Marshall. Ela
também é sombria para os países árabes, como explicarei
abaixo, pelo simples fato de que
uma explosão demográfica como a que sugerem esses números constituiria mau augúrio
para qualquer sociedade.
Portanto, em minha opinião,
as tendências demográficas no
Oriente Médio representam
ameaças muito maiores às
chances de estabilidade e prosperidade da região do que qualquer dos perigos alardeados
por nossa imensa gama de estrategistas militares.
Conseqüências
Aponto algumas poucas dessas conseqüências. As primeiras duas dizem respeito não ao
conflito israelo-palestino, mas
às pressões demográficas e ambientais mais amplas. Se a população total desses Estados
chegar a cerca de 250 milhões
até 2050 ou mesmo antes disso,
o suprimento de água se esgotará e os Estados árabes voltarão ao estado desértico.
Depois, é difícil imaginar como a tessitura social da maioria
desses Estados árabes poderia
se conservar inteira se suas populações dobrarem ou triplicarem. Basta considerar a Síria,
pobre em recursos, passando
de 19 milhões para 34 milhões
de habitantes em 40 anos.
E como será possível evitar
uma explosão social e física
crescente na Cisjordânia e na
faixa de Gaza se chegar um momento em que 9,8 milhões de
palestinos forem contidos por
um Estado composto de meros
6,5 milhões de judeus, mais, digamos, 2 milhões de árabes israelenses relutantes?
É claro que, mesmo quando
houver muito mais palestinos
na Cisjordânia e em Gaza do
que judeus em Israel, estes últimos sempre vão conservar uma
vantagem militar enorme. Mas
quando uma "vantagem" militar perde sua eficácia? Como se
enfrenta uma população irada,
muitas vezes maior que a sua,
que disputa as mesmas terras?
Isso nos conduz a uma questão relacionada e terrível, que é:
quando os totais populacionais
árabes, ou mesmo iraniano, se
tornarão tão grandes que até
mesmo a ameaça de retaliação
nuclear israelense contra
quaisquer das armas de destruição em massa de seus inimigos deixará de ter um poder
de intimidação tão grande?
O presidente Mao costumava
dizer a visitantes estrangeiros
(ou será que era apenas brincadeira?) que não se importava
com as ameaças americanas de
atacar a China com armas nucleares, porque ainda restariam
milhões de chineses vivos. Se
isso soa delirante, acho que
meu argumento não o é: resumindo, que a política retaliatória em estilo "olho por olho" de
sucessivos governos israelenses terá efeito dissuasivo menor quando os números forem
tão desproporcionais.
Várias pessoas nos Estados
vizinhos poderiam morrer para
cada cidadão judeu morto em
conflitos futuros, e o resultado
ainda seria o mesmo: a subjugação do Estado de Israel.
Essas são idéias apavorantes,
mas políticos israelenses cuidadosos, como Shimon Peres,
já têm essa possibilidade, e os
fatores demográficos que a impulsionam, em mente há muito
tempo. Vem daí sua investida
na busca por soluções políticas.
O consenso que se tem no
momento é que faz sentido para Israel proceder num caminho duplo: (a) reagir com força
maciça a todos que atacam, ou
que se acredita que estejam
prestes a atacar; e (b) buscar
uma saída política com os setores palestinos mais moderados,
alcançando a paz em pelo menos uma frente e, com isso, separando os extremistas dos
árabes dispostos a negociar.
Em suma, continuar a fazer o
que o governo Olmert, apoiado
pelos EUA, vem fazendo.
De fato, esse pode ser o único
caminho sensato a seguir no
momento. Se ele vai funcionar
no prazo longo é algo que está
muito menos claro para mim. A
superioridade militar de Israel
pode manter os lobos à distância por um longo tempo ainda.
Mas isso não pode formar uma
resposta completa. Mesmo um
acordo político razoavelmente
bom com governos e movimentos árabes, embora altamente
desejável, pode ser só uma maneira de ganhar tempo.
Esse é o maior problema de
longo prazo de Israel. Entretanto, como avisou George
Marshall, ele pode também se
tornar o problema dos EUA.
Mas será que alguém na Casa
Branca ou no Congresso de hoje se preocupa com isso?
PAUL KENNEDY é professor J. Richardson de
História e diretor de Estudos em Segurança Internacional na Universidade Yale. Seu livro mais
recente é "The Parliament of Man", sobre as Nações Unidas. Este artigo foi distribuído pela Tribune Media Services.
Tradução de CLARA ALLAIN
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