Jogo do 'nós contra eles' não pode ofuscar debate sobre grandes problemas nacionais

Pouco se discute a premência de reformar o Estado e alinhá-lo aos anseios da sociedade

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Como se não lhe dissessem respeito a confusão na política e os choques entre os poderes, a população assiste perplexa, a seis meses das eleições, a uma instabilidade que só tem acrescentado incertezas à recuperação ainda frágil da economia e do emprego, além de tumultuar a discussão em alto nível dos muitos e graves problemas a espera de solução.

A barafunda que caracteriza a atual conjuntura gera um sentimento de frustração, reforçado pela percepção de que a Lava Jato se encontra sob recorrentes ataques, o que coloca um imenso ponto de interrogação diante das tentativas de esvaziamento do combate à corrupção.

Esse estado de coisas tem sérias consequências. De um lado acentua o desinteresse da maior parte da sociedade pela discussão dos problemas do país. 

Por outro lado, estimula uma parcela menos numerosa (porém mais ativa) a seguir no rumo da radicalização e da polarização que se estabeleceu no ambiente político e nas relações sociais de 2014 para cá.

Tal cenário elevará a temperatura da campanha eleitoral e é provável que se apodere do espaço que deveria ser ocupado pelos debates sobre grandes problemas nacionais.

Pouco se discute com a profundidade necessária a premência de reformar o Estado e alinhá-lo aos anseios da sociedade, abrindo caminho para equacionar outras de nossas mazelas, como o desarranjo das contas públicas, o descontrole nos gastos da Previdência e o nó górdio em que se transformou o sistema tributário.

O embate eleitoral deveria evoluir em torno de propostas para encaminhar tais matérias e não se perder no jogo “nós contra eles”. Com preocupação, observamos que a qualidade do debate não vem respeitando as necessidades de informação dos eleitores. Eis aí um bom caldo de cultura para a proliferação do oportunismo radical de todos os espectros.

Isso acentua a instabilidade do quadro político —e a economia não ficará incólume, com riscos de embaçar o relativo otimismo que se formou nos últimos tempos. A inflação cedeu, permitindo que os juros básicos ingressassem num patamar inédito. Setores como indústria, varejo e, num ritmo mais contido, os serviços passaram a registrar taxas positivas de expansão até então restritas ao agronegócio. Não por acaso o consumo e o investimento recuperaram parte do vigor que exibiam antes da crise.

Trata-se de uma retomada ainda em fase de construção e, por isso, pode sofrer abalos caso persista a falta de confiança no encaminhamento de pontos estratégicos para o futuro do país. Mais: a perspectiva de crescimento econômico fica prejudicada, já que dois de seus alicerces, o investimento das empresas e o consumo das famílias, dependem em larga escala da previsibilidade e da estabilidade a médio e longo prazos.

Vamos chegar a 2019 sem o necessário esclarecimento da população a respeito de matérias fundamentais que é preciso enfrentar. Infelizmente, parece continuar em cartaz o mesmo filme assistido em 2014, com discursos acalorados, falsas promessas e truques de marketing vazios. O roteiro é nosso velho conhecido com mais uma desagradável surpresa no final.
 

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