Eleição presidencial põe em jogo rumo de 'milagre mexicano' na economia

López Obrador defende presença maior do Estado na economia, que não decolou com reformas atuais

Carros recém-fabricados são colocados em um pátio da fábrica da Toyota em Tijuana, cidade mexicana na fronteira com os EUA; país se tornou quarto maior exportador mundial - Jorge Duenes - 30.abr.17/Reuters

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Sylvia Colombo
Cidade do México

Os mexicanos vão às urnas no domingo (1º) não só para escolher o novo presidente, mas para apostar num modelo econômico diferente ou insistir no já iniciado pelo atual mandatário, Enrique Peña Nieto (PRI).

Tanto o segundo colocado nas pesquisas, o candidato da coalizão de centro Mexico Al Frente, Ricardo Anaya (27%), como o terceiro, o governista José Antonio Meade (20,4%), são defensores do livre mercado e, em diferentes medidas, apoiam as reformas iniciadas por Peña Nieto em 2012.

Já o favorito ao pleito, Andrés Manuel López Obrador (49,6%), propõe uma mudança radical, que vem entusiasmando eleitores no sul empobrecido e as classes médias urbanas.

Porém, vem assustando o empresariado, que tem tentado, em vão, organizar reuniões com AMLO (como é chamado), por considerar suas posições muito radicais.

López Obrador defende uma maior presença do Estado, estatizar o que foi privatizado e aumentar o gasto social com subsídios e programas de assistência —financiando tudo isso com o corte de benefícios a ex-presidentes e o aumento dos impostos dos mais ricos.

Em vez de renegociar o Nafta (acordo de livre-comércio com Canadá e EUA), como está fazendo Peña Nieto, AMLO propõe sair do acordo e produzir bens de consumo "por mexicanos para mexicanos".

"Em muitos aspectos, AMLO e Donald Trump parecem ser dois lados da mesma moeda", diz à Folha o analista Javier Corrales, do Amherst College.

AMLO crê também que é possível diminuir as diferenças entre o norte mais rico e o sul mais pobre propondo subsídios estatais à produção agrícola e cobrando impostos mais altos à comida industrializada vendida a preços muito reduzidos por empresas dos EUA no sul do México.

Também diz que vai incentivar o uso de instrumentos manuais em troca da importação de máquinas para a indústria. Com isso, teria mais recursos para financiar o aumento de pensões e aposentadorias, além de baratear os custos de transporte, eletricidade e outros serviços.

São propostas que convencem as camadas mais pobres e também levaram ao apoio de vários sindicatos, como os de metalúrgicos, trabalhadores agrários e professores.

A decepção com o governo de Peña Nieto, com 21% de aprovação, tem facilitado a penetração da mensagem de AMLO. Este cenário, porém, era difícil de imaginar há seis anos, quando Peña Nieto era, interna e externamente, a imagem do líder que modernizaria o México.

Quando iniciou seu governo, o país parecia entrar numa nova fase de modernização, após aprovar 11 reformas, entre elas a tributária, a trabalhista e a privatização de parte da Pemex (a Petrobras local).

Peña Nieto chegou ao poder em um momento em que a economia mexicana vinha perdendo força por causa da baixa do preço do petróleo e do aumento da violência.

Aos poucos, suas reformas começaram a melhorar o desempenho da economia, que cresceu em média 2,4% anuais. 

Houve investimento em oleodutos, estradas e a criação de um polo industrial no centro do país que trouxe diversas empresas estrangeiras e transformou o país no quarto maior exportador mundial de veículos.

"As regiões do norte do México e do sul dos EUA conheceram um desenvolvimento sem igual nos últimos tempos", diz Corrales.

Havia a promessa de que o crescimento chegaria a 4%, no que já se propagandeava como "milagre mexicano".

Porém, da metade de seu mandato em diante, a aliança parlamentar que permitia que as reformas fossem adiante começou a ruir.

Os números da violência aumentaram, a ponto de 2017 ter sido o recordista em homicídios da história recente: 20,5 homicídios por 100 mil habitantes, ante 30,3 no Brasil. 

O fato de a pobreza praticamente não ter baixado (43,6% do país estava nessa faixa) nem o trabalho informal (27% trabalham sem carteira) gerou muita insatisfação.

A isso, acrescente-se o caso dos estudantes desaparecidos de Ayotzinapa, em 2014, os escândalos de corrupção de membros da alta cúpula e os terremotos de 2017, que desaceleraram a economia por alguns meses.

A chegada de Trump ao poder, por ora, não causou grandes alterações na macroeconomia, principalmente porque o risco de perder o Nafta foi driblado, e os três países (México, Canadá e EUA) devem apresentar em breve uma nova versão do tratado. Ainda assim, o clima de incertezas quanto ao que resultará da negociação ainda existe.

Ainda que o risco de Trump rasgar o Nafta pareça ter sido tirado de cena, agora surge a possibilidade de AMLO fazer o mesmo, gerando grande incerteza nos mercados nacional e internacional.

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do informado anteriormente, a taxa de homicídios no México em 2017 foi de 20,5 a cada 100 mil habitantes, não 25,3/100 mil.

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