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Bruno Carazza

O sistema não funciona

Fundo eleitoral, poder dos cargos e novas mídias definiram campanha no 1º turno

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As eleições de 2018 apresentam características muito particulares que exigirão um mergulho profundo nos dados ao longo das próximas semanas para extrairmos conclusões mais sólidas sobre o que realmente aconteceu. Escrevendo ao calor dos resultados, arrisco algumas considerações a partir dos dados disponíveis.

Certamente a grande mudança estrutural nesta campanha foi a proibição das doações de empresas, que afetou o caixa dos partidos e candidatos e, obviamente, a dinâmica de gastos eleitorais. Embora os números ainda sejam preliminares, a campanha atual movimentou a metade do dinheiro do pleito de 2014. 

Somados aos R$ 2,5 bilhões dos fundos eleitoral e partidário, candidatos e partidos também conseguiram mobilizar quase 600 milhões vindos de pessoas físicas. Desses, praticamente a metade (R$ 290 milhões) veio do bolso dos próprios candidatos.

Além da menor disponibilidade de recursos dos candidatos, o pleito atual também foi marcado por uma campanha mais curta e, é claro, houve a proeminência das redes sociais.

Para verificar como esses elementos influenciaram o resultado das urnas, é necessário diferenciar entre as campanhas majoritárias (presidente, governadores e senadores) daquelas proporcionais (deputados estaduais e federais).

Muito já se falou e muito ainda vai se falar do fenômeno Bolsonaro, que conseguiu uma votação expressiva com pouquíssimo dinheiro, vindo de partido pequeno e explorando as redes sociais. Não se trata de fenômeno isolado, como é o caso dos surpreendentes desempenhos de Romeu Zema (Novo) e de Wilson Witzel (PSC) na disputa para os governos estaduais de Minas Gerais e Rio de Janeiro.

No entanto, diante de um quadro em que se reduziu a duração da campanha e o dinheiro dos fundos eleitoral e partidário foi desigualmente distribuído, a força do cargo ou do sobrenome continuaram determinantes.

Isso fica bastante visível no fato de que nove governadores --além de políticos tradicionais como Renato Casagrande (ES), Ronaldo Caiado (GO), Helder Barbalho (PA) e Fátima Bezerra (RN) -- lideraram o primeiro turno, embalados pela máquina pública, pelo dinheiro recebido dos partidos e pelo peso político regional.

No âmbito das eleições proporcionais, os partidos em geral destinaram a maior parte dos recursos para tentar formar grandes bancadas na Câmara dos Deputados. Afinal de contas, a partir do total de votos recebidos por seus candidatos a deputado federal é que serão calculadas as fatias do bolo dos fundos partidário e de campanhas, além do horário eleitoral gratuito nos próximos anos. Isso, sem falar na cláusula de desempenho que ameaça os partidos menores a ficarem fora da distribuição dessas benesses.

Analisando a repartição dos recursos entre os candidatos, é nítida a preferência que foi dada aos deputados que buscavam a reeleição. Essa opção reflete a lógica eleitoral -- candidatos incumbentes tendem a ter maior recall perante o eleitorado. Mas é claro que houve também uma estratégia de sobrevivência de muitos desses parlamentares que estavam envolvidos nas investigações da Lava Jato.

Outra tendência relevante foi a tática de vários partidos de contemplar com generosidade herdeiros de políticos tradicionais, principalmente suas mulheres e filhas, que se aproveitaram da determinação legal de se destinar pelo menos 30% dos recursos para o gênero feminino.

Num sistema em que as eleições acontecem em territórios muito grandes e partidos pouco ideológicos levam as disputas para o campo personalista, é de se esperar que aqueles que têm acesso a mais recursos levem vantagem. Isso, porém, não é necessariamente uma regra incontornável.

Embora os resultados parciais indiquem que o dinheiro continuou determinante para parte expressiva dos eleitos, o fracasso de alguns candidatos que receberam muito investimento de seus partidos (como os herdeiros de Cunha, Garotinho e Cabral no RJ, por exemplo) indicam que existem outras dinâmicas em curso. Além da força das redes sociais, é preciso verificar o desempenho de candidatos com audiências cativas -- como é caso de líderes religiosos, radialistas e apresentadores de TV e celebridades em geral --, além da onda de direita que parece estar varrendo o país.

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