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15/06/2004
Baixa escolaridade reduz cura de câncer

 

A baixa escolaridade atrasa o diagnóstico do câncer e reduz as chances de cura. É o que demonstra um estudo do Hospital do Câncer de São Paulo, que analisou a taxa de sobrevida de 2.741 pacientes adultos nos últimos três anos. Essa taxa indica a probabilidade de estar vivo no período de realização da pesquisa.

O estudo, inédito no país, mostra que, entre os que descobriram a doença em fase mais avançada (estágios 3 e 4), 61% estudaram até a 8ª série do ensino fundamental. O restante, 39%, tinha concluído o ensino médio ou o superior.

A escolaridade costuma ser o indicador de nível socioeconômico mais usado para adultos porque, em geral, não se altera. Outros indicadores são renda e ocupação, que não foram avaliados na pesquisa.

O peso da escolaridade no diagnóstico precoce fica bem claro no câncer da mama, o que mais mata as brasileiras: 73,3% das mulheres que detectaram o tumor em estágio inicial tinham o ensino médio ou o superior completo. Mesmo com tumores descobertos em estágios mais avançados, a taxa de sobrevida é maior entre os que estudaram mais: 90% contra 54%.

No caso do câncer da boca e orofaringe (uma das divisões da faringe), a situação se repete: os pacientes com menos anos de estudo tiveram índices de sobrevida de 44% --nos estágios iniciais--, enquanto entre os doentes que estudaram mais as taxas foram de 100%.

Segundo a epidemiologista Karina Ribeiro, que coordenou a pesquisa, a baixa escolaridade pode estar relacionada à dificuldade de acesso aos serviços de saúde, à falta de informação sobre os fatores de risco e os métodos de prevenção dos diversos tipos de tumores e até à negação da possibilidade de ter câncer.

Na sua avaliação, se forem identificados os fatores socioeconômicos que podem influenciar no desenvolvimento da doença e no seu diagnóstico, será possível planejar intervenções para reduzir essas disparidades e obter melhores taxas de sobrevida.

Para o médico Humberto Torloni, diretor do centro de pesquisas do Hospital do Câncer, a baixa escolaridade está associada à pobreza, que, por sua vez, está diretamente relacionada a uma maior incidência de alguns tipos de câncer. Tumor peniano e do colo do útero, por exemplo, são muito mais freqüentes no Norte e Nordeste do que no Sul e Sudeste.

Na esteira da baixa escolaridade e da pobreza está a falta de acesso aos serviços de saúde, que, na avaliação do mastologista e cirurgião oncológico José Luiz Bevilacqua, do Hospital Sírio Libanês e do IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer), é a principal causa do diagnóstico tardio do câncer no país. Hoje, 60% dos tumores são diagnosticados em estágios avançados no Brasil.

Para ele, a melhoria do acesso das pessoas de baixa renda aos serviços públicos de saúde facilita o diagnóstico precoce de alguns tipos de câncer, como o da mama (por meio da mamografia) e o do colo uterino (por meio do exame de papanicolaou).

"Tivemos uma redução do câncer uterino apenas com o acesso ao papanicolaou. Não dá para ficar esperando a população melhorar o nível de escolaridade ou a renda para reverter a incidência do câncer", diz o médico.

O oncologista Ricardo Marques, do comitê de ética da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, concorda: "Fica difícil atribuir à baixa escolaridade o atraso no diagnóstico do tumor em uma pessoa que demorou de quatro a cinco meses para conseguir atendimento em um serviço especializado de câncer".

Para o professor titular de oncologia da Faculdade de Medicina da USP, Ricardo Brentani, também presidente do Hospital do Câncer, a informação é uma das principais armas na prevenção do câncer. "Sabemos que 35% dos casos estão relacionados ao cigarro, 15% ao álcool e 10% aos vírus sexualmente transmissíveis."

Mas não são apenas os pacientes que precisam de mais informações. De acordo com Torloni, é comum os doentes passarem por vários especialistas até terem o câncer diagnosticado e iniciarem o tratamento.

Ele cita o exemplo do sarcoma, um tipo de tumor que pode ocorrer em osso, músculo, cartilagem etc., e que, na maioria dos casos, é diagnosticado tardiamente porque, no estágio inicial, não é avaliado corretamente por médicos não-especializados.

O dentista Marcos dos Santos Oliveira, 29, carrega até hoje as seqüelas desse problema. Há dez anos, ele foi vítima de um câncer no joelho e teve de amputar a perna direita.

Porém, antes de ter a doença diagnosticada, passou por pelo menos 12 médicos que lhe prescreveram inúmeros analgésicos e antiinflamatórios, além de inúteis radiografias. "Teve um que disse que eu tinha doença venérea."

Na opinião de Brentani, é fundamental que as faculdades de medicina tenham na grade curricular a disciplina de oncologia para que os médicos saibam reconhecer precocemente o câncer.

Para Ricardo Marques, o preconceito na área médica em relação ao câncer é tão grande que muitos especialistas evitam até falar o nome da doença. "Eles dizem "aquela doença"."

 

CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo

   

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