Brasil
12/08/2006

História - 2003 - Luiz Inácio Lula da Silva

da Folha Online

Nome: Luiz Inácio Lula da Silva
Natural de: Pernambuco
Gestão: 1º.jan.2003 a 1º.jan.2007
Perfil: Lula começou sua trajetória como líder sindical em 1972, quando foi eleito primeiro secretário do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema. Apenas três anos depois de tornou presidente da entidade e ganhou projeção nacional ao comandar gigantescas greves e ser preso. Participou da fundação da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e do PT (partido dos Trabalhadores). Antes de vencer as eleições presidenciais de 2002, foi derrotado em três ocasiões: em 1989 perdeu para Fernando Collor de Mello e, em 1994 e 1998, para FHC.
Adriano Machado-13.nov.2005/Folha Imagem
Roberto Jefferson (PTB-RJ) deflagrou a crise no governo Lula ao denunciar o mensalão
Após 22 anos de existência do PT, três derrotas e oito anos de oposição quase sistemática a Fernando Henrique Cardoso, o ex-torneiro mecânico Luiz Inácio Lula da Silva chegou à Presidência da República, levando pela primeira vez a esquerda ao poder no Brasil.

Candidato natural e favorito desde o início da corrida eleitoral, Lula não teve dificuldades para bater o candidato tucano José Serra, que em sua campanha usou como principal plataforma o trabalho desenvolvido no Ministério da Saúde de FHC, principalmente o programa de controle e medicamentos contra a Aids.

Sem outros adversários fortes --no primeiro turno enfrentou Ciro Gomes (PPS), Garotinho (PSB), Zé Maria (PSTU) e Rui Costa (PCO)--, Lula e o PT montaram uma base forte de aliados, com apoios que antes estavam distantes e eram até mesmo contrários ao partido. No discurso feito após vencer o pleito, aliás, o petista ressaltou a importância das alianças feitas durante a campanha, destacando que foram "fundamentais" para o êxito obtido, e prometeu implantar um "Pacto Nacional pelo Brasil", escolhendo diferentes quadros para fazer parte de um governo amplo.

Naquela ocasião, Lula agradeceu pessoalmente o apoio dos ex-presidentes José Sarney e Itamar Franco, além dos candidatos derrotados à Presidência Ciro Gomes (PPS) e Anthony Garotinho (PSB). Também formaram a base de alianças de Lula Miguel Arraes, à época presidente nacional do PSB, Leonel Brizola e seu partido, o PDT, e Antonio Carlos Magalhães --este último declarou voto no petista no segundo turno, mas disse que seria oposição a um eventual governo do PT.

O principal apoio a Lula, porém, veio do empresariado. Além das inúmeras reuniões e demonstrações de que havia mudado (e não mais quebraria acordos com o FMI ou decretaria a moratória da dívida externa, como achavam no passado), ajudou na obtenção da confiança a escolha do candidato a vice-presidente na chapa: o empresário José Alencar (PL).

Assim, virou passado mais que enterrado a história ocorrida em 1989 --um dos fatores determinantes na derrota para Fernando Collor. No segundo turno, o então presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Mário Amato, afirmou que se Lula vencesse 100 mil empresários deixariam o país. Acabou falando mais alto o antigo temor do radicalismo da esquerda brasileira.

As principais promessas de Lula durante a campanha, como esperado, se concentraram em questões sociais, entre elas gerar dez milhões de empregos, implementar o Programa Fome Zero, o Bolsa-Família e o Primeiro Emprego. Se foram o principal alvo de promessas, também foram o principal alvo de críticas durante o mandato. A campanha foi centrada ainda nas prometidas reformas adiadas há anos, como a da previdência e a tributária.

Mas quem votou em Lula insatisfeito com a política neoliberal do PSDB, que governara o país por oito anos, ou esperava uma guinada na condução da política econômica, se frustrou. A manutenção da política de juros altos, um aperto maior ainda para manter o superávit primário e a continuidade de acordos com o FMI (Fundo Monetário Internacional) permaneceram. O resultado foi o controle da inflação, a estabilidade do câmbio e o aumento das exportações, mas com pequeno crescimento econômico. Elogiada ao redor do mundo, a economia se transformou em uma das vitrines do governo petista.

A gestão de Lula, porém, não trouxe apenas boas notícias na área econômica. Foi marcada também por polêmicas e escândalos. O primeiro imbróglio ocorreu logo no primeiro ano de governo, e seu nome é reforma da previdência.

A principal crítica foi a pressa para se votar e aprovar a reforma pela via de uma emenda constitucional. A oposição dizia que o processo não era compatível com um governo de um partido de larga tradição democrática e propensão ao debate. Tanto que integrantes do próprio PT, contrários ao conteúdo da emenda, não votaram seguindo a recomendação do partido e acabaram expulsos da legenda. Entre eles estava a senadora alagoana Heloísa Helena, que ajudou a fundar em 2004 o Psol (Partido do Socialismo e da Liberdade).

Na opinião dela e de outros parlamentares, a emenda devia ser revista porque degradava a aposentadoria dos funcionários públicos pela imposição de uma contribuição sobre os rendimentos de aposentados do setor público e errava ao prever a privatização da previdência dos futuros aposentados pela via dos fundos de pensão fechados.

Outro ponto delicado que também disse respeito às reformas foi a ausência da reforma agrária. As críticas sobre a falta de projetos para a divisão de terra no país se acentuaram porque o tema sempre foi abordado pelo PT, partido historicamente apoiado e apoiador do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Ainda na questão rural, marcou o governo Lula o assassinato da missionária Dorothy Stang por latifundiários e a aprovação, dentro da Lei de Biossegurança, do cultivo de sementes transgênicas.

Antes de enfrentar sua maior crise, Lula e seus ministros tiveram que dar explicações e receber ataques por conta de dois projetos: o Conselho Federal de Jornalismo e a Ancinav. O primeiro, enviado pelo Planalto ao Congresso, visava "orientar, disciplinar e fiscalizar" o exercício da profissão e das atividades de jornalismo. Classificado como mordaça da imprensa, acabou em nada.

O segundo, a Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual), que substituiria a Ancine (Agência Nacional de Cinema) e que regularia, fomentaria e fiscalizaria o setor audiovisual, teve o mesmo fim. Proposto pelo Ministério da Cultura, o anteprojeto foi criticado por seu suposto dirigismo cultural, pela possibilidade de limitação da liberdade e interferência no direito à informação.

Crise

A maior crise enfrentada por Lula e seus aliados, porém, começou em junho de 2005. Vieram em seqüência, às vezes acumulando-se, a eleição de Severino Cavalcanti (PP) para a presidência da Casa, em fevereiro, a desintegração da base aliada em março, a (fracassada) operação abafa da CPI dos Correios em maio, o escândalo do "mensalão" em junho, a queda de Severino em setembro e os processos de cassação a partir de outubro.

Tudo começou com a entrevista à Folha pelo então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), afirmando que deputados do PP e do PL recebiam do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, um "mensalão" de R$ 30 mil. Em troca, os parlamentares votavam projetos de interesse do Executivo.

Jefferson resolveu "contar o que sabia", como explicou, depois de ser apontado como um "avalista" de um esquema de corrupção nos Correios --uma gravação de um funcionário da entidade negociando propina e que citava Jefferson já havia desencadeado a CPI dos Correios, que investigaria as denúncias de corrupção nas estatais. No entanto, nas semanas seguintes da denúncia Folha, outros testemunhos começaram a trazer à tona elementos que sustentaram em parte o depoimento do deputado.

Os integrantes da CPI dos Correios tentaram mudar o foco da investigação para o mensalão, mas acabou-se por criar outra CPI. Apesar disso, os possíveis fornecedores do pagamento mensal a parlamentares da base aliada pelo governo se tornou o foco dos trabalhos do primeiro grupo, o que chegou até a ocasionar depoimentos duplicados nas comissões.

Segundo Jefferson, o dinheiro do "mensalão" vinha de estatais e empresas privadas e chegava a Brasília "em malas" para ser distribuído em ação comandada pelo tesoureiro do PT, com a ajuda de "operadores" como o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza e o líder do PP na Câmara, José Janene (PR). Para apurar as denúncias, os parlamentares criaram a CPI do Mensalão.

Uma das peças-chave das denúncias foi Fernanda Karina Somaggio, ex-secretária do publicitário, que confirmou em entrevista à revista "IstoÉ Dinheiro" o envolvimento do ex-chefe no suposto esquema de mesada.

Marcos Valério Fernandes de Souza era sócio das agências SMPB e DNA. Seu patrimônio cresceu 76% no primeiro ano do governo Lula, sendo que o governo federal era um de seus maiores clientes. Ao todo, os contratos que suas agências fizeram no governo Lula chegam a R$ 507,7 milhões. Além de ser pivô do esquema que depois ficou conhecido como "valerioduto", Marcos Valério era investigado pela polícia de Minas Gerais por comprar notas frias, trocadas justamente entre a SMPB e a DNA.

O principal "interlocutor" de Marcos Valério no esquema das mesadas, segundo apurou a CPI e apontou Karina Somaggio, era Delúbio Soares, então tesoureiro do PT. Ele negou as acusações, mas saiu da cena política e se afastou da cúpula do PT depois que surgiram provas de que uma agência do Banco Rural de Belo Horizonte, que tem relações com Marcos Valério, havia e emprestado ao PT, em 2003, cerca de R$ 3,6 milhões --isso mesmo o partido tendo patrimônio líquido negativo de R$ 4,1 milhões. Os documentos do empréstimo eram assinados por Delúbio.

Assim, aos poucos, dezenas de pessoas foram convocadas para depor, entre elas o deputado João Paulo Cunha (PT), a deputada licenciada Raquel Teixeira (PSDB-GO), o deputado Miro Teixeira (PT-RJ), o publicitário Duda Mendonça, o então ministro José Dirceu e o presidente do PT na época, José Genoino. Acusado por Jefferson de ser o "mentor" do mensalão, Dirceu, mesmo negando as acusações, renunciou ao cargo de Ministro da Casa Civil no dia 16 de junho.

No final das investigações, o relatório da CPI dos Correios, aprovado pelos parlamentares mas condenado por alguns dos 40 denunciados, contestou a versão dos petistas e seus aliados: de que a distribuição de recursos a parlamentares seria um "caixa dois" para bancar despesas de campanhas eleitorais.

Durante todo o processo, trabalhou paralelamente às CPIs o Conselho de Ética, que analisou se parlamentares envolvidos no caso do mensalão teriam quebrado o decoro parlamentar. Poucos foram cassados e a maioria foi absolvida, sendo que alguns renunciaram. Entre os que perderam o mandato está, além de Roberto Jefferson, o deputado José Dirceu.

Após a crise do mensalão, se instalou no governo a polêmica acerca da quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa --a conta estava na Caixa Econômica Federal. A quebra ocorreu depois que Francenildo acusou o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci de freqüentar uma casa em Brasília usada para encontro de lobistas e festas com garotas de programa. Palocci negou ter estado na casa para fins ilegais, mas acabou renunciando ao cargo após ser acusado de ordenar a quebra do sigilo. Também caiu o então presidente da Caixa, Jorge Mattoso.

No decorrer das CPIs, denúncias contra ministros e integrantes do PT, o presidente Lula foi poupado. Em sua defesa, declarou que se sentia "traído por práticas inaceitáveis" e que nunca teve conhecimento das mesmas. Apesar disso, Lula chegou a ser citado várias vezes. Foram apontadas como ilícitas as ligações entre Lula e o presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, por exemplo --ele teria pago contas de Lula e de sua família--, além das relações da Telemar com Fábio Luiz Lula da Silva, o Lulinha, filho do presidente.

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