Folha Online Ilustrada  
Crítica
27/05/2002 - 10h05

Mamet reúne lições relevantes em seu "manual" de roteiro

INÁCIO ARAUJOP
crítico da Folha

Gente que escreve livros sobre cinema às vezes parece ter um parafuso solto. O caso mais radical é quase com certeza o de Syd Field, que se apresenta como "screenwriting authority" e toma como lei imutável que os filmes devem ser construídos necessariamente em três atos, com "pontos de virada" em tais e tais momentos.

David Mamet às vezes ameaça fazer coisas parecidas em seu "Sobre Direção de Cinema", que reúne anotações de um curso dado para estudantes universitários e publicado originalmente em 1991. A vantagem é que Mamet, além de dramaturgo e roteirista de nome, era na época um cineasta promissor.

Outra vantagem é que Mamet -bem ao contrário de Field- dá uma banana para a indústria de cinema e diz sem meias-palavras que os executivos de Hollywood não fazem idéia do que seja um roteiro. Seu ponto de vista é o do cinema, não o da indústria.

Uma terceira vantagem: Mamet não separa radicalmente esses dois estágios da criação -o roteiro e a realização. A pergunta-chave que enuncia ("onde colocar a câmera?") encontra sua resposta no texto. E o texto tem por fundamento a idéia de que um filme consiste numa situação dramática desenvolvida a partir de planos cujo significado só se realizam na medida em que se articulam ao plano seguinte.

Ou seja, o autor toma como base o pensamento de Eisenstein, o que ninguém dirá que é um mau ponto de partida, e força seus alunos a trabalhar a construção dramática como se estivessem preparando um filme mudo: os diálogos nunca entram na história para explicar uma situação; a situação deve explicar-se exclusivamente pela imagem.

Como exercício é perfeito, e o ensinamento de Mamet pode ser usado com proveito por qualquer candidato a diretor ou escritor de cinema.
Mas será que as coisas funcionam assim com todos os filmes? Até que ponto o autor não tenta promover a universal um método pessoal? Por que um filme sonoro não poderia valer-se dos diálogos, em dados momentos, para explicar uma situação dificilmente destrinchável em imagens?

Esse tipo de questão convém que os leitores de manuais de cinema façam a si mesmos. Para voltar ao caso Syd Field: não há inconveniente em conhecer seus postulados; o inconveniente consiste em segui-los cegamente.

Da mesma forma, Mamet julga -ainda que para efeitos didáticos- que não tem a menor importância o que se tem a dizer. Só importa como dizer. Daí resulta um ponto fraco do livro: sua longa discussão com os alunos sobre como desenvolver uma situação dramática parte de uma situação dramática qualquer (dessas com muito pouco a dizer) e, em vista disso, ameaça o interesse do que vem depois. No entanto, a fidelidade de Mamet a seu método e a maneira como evita o lugar-comum terminam por resgatar esse diálogo não raro áspero com seus alunos.

Os capítulos seguintes, basicamente expositivos, são mais fortes, na medida em que Mamet expõe seu método de construção de roteiro já associado à mise-en-scène. Talvez fossem ainda mais se a tradução não fosse um tanto precária.

Sempre é possível questionar por que no Brasil se traduz o livro de Mamet, mas não o formidável curso de direção do próprio Eisenstein, que é a base do pensamento de Mamet. Não há resposta: a edição de livros de cinema no país é basicamente errática. Isso não impede que "Sobre a Direção de Cinema", descontados os exageros metodológicos, seja um livro que contém ensinamentos relevantes para aspirantes a realizador ou roteirista de cinema. E não só para eles. Também realizadores e roteiristas experimentados encontrarão em Mamet um interlocutor culto, talentoso, crítico e, não raro, bem-humorado.

 Serviço

Sobre Direção de Cinema
Autor: David Mamet
Editora: Civilização Brasileira
Quanto: R$ 18, em média (138 págs.)


   
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