Folha Online Ilustrada  
Crítica
30/08/2002 - 06h18

"Cidade de Deus" chega hoje às telas com investimento recuperado

MARIO SERGIO CONTI
da Folha de S.Paulo, no Rio

"Cidade de Deus", o filme de Fernando Meirelles, está à altura do romance homônimo de Paulo Lins que lhe deu origem. Publicado em 1997, a ficção de Lins foi a mais ambiciosa e bem lograda da literatura brasileira nos anos 90.

O autor, recorde-se, nasceu e viveu na Cidade de Deus, uma das mais violentas favelas do Rio, hoje com 120 mil moradores. Contratado como entrevistador para um estudo sobre a criminalidade ali, Lins recolheu dezenas de histórias, que retrabalhou em ficção.

O resultado é um romance que traça um panorama da implantação e disseminação do tráfico de drogas na Cidade de Deus a partir dos anos 60. São mais de 200 personagens que se movem velozmente numa trama repleta de enfrentamentos e assassinatos.

O ponto de vista de alguém de dentro da favela, aliado a uma prosa de ritmo alucinante, revelou um mundo novo: a sociedade guerreira, de luta de todos contra todos, que está sendo construída numa metrópole brasileira.

O filme de Meirelles consegue resultado semelhante ao do romance. Pela primeira vez, traficantes que só aparecem nas páginas policiais mortos, ou presos, adquirem consistência, tornam-se gente. A força dessa revelação tem caráter explosivo. Como todo grande filme, "Cidade de Deus" altera a história do cinema. Filmes passados em favelas, tidos como fortes, agora parecem ingênuos.

Dois procedimentos do diretor Meirelles explicam a dimensão fundadora, inédita, do seu filme. O primeiro é a escolha do elenco que, com exceção de Matheus Nachtergaele, é integrado por atores amadores, que moram em favelas cariocas. São rostos desconhecidos, e tão fortes, e tão naturais, que propiciam pequeno milagre: parece que se está vendo a realidade bruta, pessoas verdadeiras, e não personagens.

Os jovens atores, muitos deles crianças, abalam a crença do espectador na arte da interpretação. Para que servem atores tarimbados se os rapazes de "Cidade de Deus" conseguem transmitir uma verdade que está além da arte? A presença sempre ameaçadora de Leandro Firmino da Hora, que faz Zé Pequeno, não cabe em nenhuma escola de interpretação.

O segundo procedimento está na forma narrativa, que combina elementos da propaganda e de videoclipe. Aplicada a um universo humano, a linguagem da circulação de mercadorias tem uma força dramática insuspeitada: os homens são coisas, e, portanto, dispensáveis numa sociedade na qual a alienação é a viga mestra.

Como não poderia deixar de ser, o filme está aquém do romance. A miríade de subtramas foi reduzida, em favor de se contar a história de poucos personagens.

O humor, que existe no livro, foi exagerado no filme, e a poesia da linguagem sumiu. Mas o que não funciona é o elemento extrafavela.

Quando a ação passa para o universo da classe média, "Cidade de Deus" cai na inverosimilhança.

São reparos marginais, pois "Cidade de Deus" é uma obra-prima. Ele enfrenta um problema agudo da sociedade e não oferece consolação ou saídas. A frase de um de seus personagens, um menino, serve de emblema: eu já roubei, já assaltei, já cheirei e matei, sou um homem.

Cidade de Deus
Produção: Brasil, 2002
Direção: Fernando Meirelles
Com: Matheus Nachtergaele, Seu Jorge e grupo Nós do Cinema
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes, Center Norte, Eldorado e circuito

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