São Paulo, sexta-feira, 30 de abril de 2010

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Olho no lance

Site do Palmeiras publica fotos aproximadas de torcedores em jogos no Parque Antarctica e levanta debate sobre privacidade

VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Alô, você, palmeirense de camisa 9 da última fila da geral no jogo contra o Atlético-PR, no dia 15: todo mundo ficou sabendo do xixi que você fez lá no fundão, na arquibancada.
Há dez jogos, todos os setores do Parque Antarctica -inclusive os da torcida adversária- são fotografados em primeiro plano. E as imagens vão parar no site oficial do time para todo mundo ver.
A megafoto, inédita em São Paulo, causou surpresa aos torcedores e levanta uma discussão sobre a privacidade em espaços públicos e a confidencialidade do direito de imagem.
Em dois tempos, a ferramenta foi apelidada de "Big Brother Palmeiras" e de "Palmeiras Street View", em referência ao serviço do Google que mostra as ruas -e quem passa nelas- de diversas cidades.
Entre flagras de torcedores com a barriga saliente de fora e o dedo no nariz, já há relatos de confusões. A publicitária Ana Raddi diz ter descoberto a traição do namorado, que, segundo ela, havia mentido ao dizer que sairia para tomar cerveja com amigos e foi visto ao lado de outra mulher em campo.
"Não sabia dessa câmera e uma amiga me mostrou as fotos. Entrei em paranoia e fiquei imaginando se eles tinham alguma coisa. Fiquei com uma pulga atrás da orelha", diz.
O analista de informática Carlos Eduardo França diz que não sabia ter sido fotografado no jogo e que foi avisado por um amigo de que aparecia na foto em plano americano, aquele que enquadra o personagem dos joelhos para cima.
"Acho que o Palmeiras deveria informar aos torcedores. Sempre assisto aos jogos no mesmo lugar há mais de 20 anos, agora vai ser fácil me investigar", afirma França.
Diretor de marketing do Palmeiras, Rogerio Dezembro diz não ter recebido nenhuma reclamação até agora.
"Achamos a ideia muito bacana e a repercussão tem sido muito legal. Temos recebido reações de torcedores de outros times, virou uma coisa democrática envolvendo até os rivais. Futebol é isso, brincadeira, entretenimento, essa coisa lúdica", afirma Dezembro.
Para a diretora do Centro de Investigação em Mídias Digitais da PUC, Lucia Santaella, a privacidade acabou.
"A privacidade é uma ideia do século 19 que vem sendo cada vez mais limada. Para a juventude, a privacidade não é mais um valor. Esse exemplo [do Palmeiras] é o limite. A vigilância hoje é onipresente, não há como escapar dela. Somos desmascarados o tempo inteiro."
Presidente da Comissão de Sociedade Digital da OAB e doutor pela USP, Augusto Marcacini diz que "é difícil saber até onde há violação da imagem ou não". "Há uma proteção legal à imagem e à honra, mas não existe uma lei específica. O problema é o limite."
A agência Fotoarena, que produz o material para o Palmeiras sob encomenda do patrocinador Samsung, explica como é feita a montagem: "A foto é a junção de [entre 150 e 500] outras. Fazemos num ângulo específico e depois, pelo computador, juntamos tudo", diz o diretor André Chaco.
A montagem chega a ter 2.5 gigapixels, resolução 250 vezes maior que a de uma câmera digital de 10 megapixels, comum no mercado.

FOLHA ONLINE
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www.folha.com.br/1011913



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