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Cinema
Jabor prepara romance e diz que volta a filmar
Obra completa do cineasta é lançada em DVD; "Tudo Bem" (1978),
e "Eu Sei Que Vou Te Amar" (1986), voltam hoje às salas de cinema
Livro, que tem título provisório em inglês, fala de personagem quixotesco à
procura infrutífera de "uma grandeza qualquer na vida"
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Arnaldo Jabor era colega no
serviço militar obrigatório de
Joffre Rodrigues, filho de Nelson. Foi então, com 18 anos,
que conheceu o dramaturgo,
que se tornaria uma espécie de
pai intelectual e influência decisiva para o futuro diretor de
"Toda Nudez Será Castigada".
"O Nelson Rodrigues ia buscar o filho de carro no Exército,
com motorista, e me dava carona. Lembro da primeira frase
que disse para mim: "O prazer
estético é igual ao orgasmo de
uma cutia no Campo de Santana'", conta Jabor.
Prestes a completar 66, o cineasta ainda não se cansou de
procurar esse prazer. Prepara
um romance -o título provisório, em inglês, é "The Speaker"- e se anuncia disposto a
voltar a filmar.
"Argumento, eu já tenho." A
idéia, diz Jabor, é fazer uma
obra "meio proustiana", "meio
o "Amarcord'", de Fellini. Ou
seja, "lembranças infantis". Fellini é, por sinal, outra referência central na formação de Jabor. Desde a juventude se desentendia com os amigos comunistas. "Como é que você
gosta daquele pequeno burguês?". Algumas dessas lembranças já estão escritas. "É sobre a formação sexual de garotos de 12 anos há 40 anos atrás,
por exemplo. Tem muita coisa
engraçada. O que eu não tenho
mais saco é "princípio, meio e
fim". Eu quero fazer um filme
feito o Fellini fazia."
Jabor diz que já há "gente
querendo produzir", mas por
ora se ocupa exclusivamente do
livro. "É uma espécie de épico
individual. Um narrador que
tenta uma transcendência
qualquer, uma grandeza. Como
um quixote. É um pouco a minha cabeça. Tentando encontrar uma grandeza qualquer na
vida, e sempre rechaçado", diz.
Duas "transcendências" que
o próprio Jabor atingiu durante
sua carreira voltam aos cinemas hoje, em São Paulo, Rio e
Porto Alegre: os filmes "Tudo
Bem", de 1978, que ele qualifica
como sua melhor obra, e "Eu
Sei que Vou Te Amar", de 1986.
Ao mesmo tempo, foi lançada
nesta semana uma caixa de
DVDs com todos os longa-metragens do cineasta, pela distribuidora Versátil. São "oito filmes e meio", diz Jabor, lembrando o número felliniano.
É ao comentar "Tudo Bem",
filme em que operários-biscateiros se instalam num apartamento de classe média decadente do Rio em razão de uma
obra que nunca termina, que
Jabor traça diferenças entre o
cinema e o Brasil das décadas
de 60 e 70 e dos dias atuais.
O que há de ambicioso e alegórico naquele filme -aquele
apartamento, afinal, era o Brasil- e em outras produções da
época, parece em alguns momentos quase incompreensível
nos dias de hoje.
"Passei numa cabine o "Tudo
Bem", e escapou de alguns essa
coisa alegórica. Que o que acontecia ali se referia também a
coisas que estavam fora dali, da
tela. Fora do filme", diz Jabor.
"Isso desapareceu um pouco.
Agora a coisa é a coisa mesmo.
O filme é só o que está no filme.
As relações não têm nenhum
caráter transcendental nem remetem a nada fora."
Também as relações de classe, conflituosas, certamente,
mas com traços então de, digamos, cordialidade, se modificaram. "A visão da miséria nos comovia mais, talvez. A desgraça
está tão geral que a gente perdeu um pouco da compaixão.
No resto, o filme é atual. Todo
esse beco sem saída está lá. Não
há solução para este país. O
Brasil é uma sinuca de bico."
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