Jogadores de League of Legends vivem e treinam em casas de São Paulo

Nada indicava que naquele prédio no Brás vivia uma das equipes que em poucos dias disputaria a final da segunda etapa do Campeonato Brasileiro de League of Legends, realizada no estádio Allianz Parque no sábado (8).

Mas, sim, ali funciona uma "gaming house", como são chamados os espaços –cada vez mais comuns– em que competidores profissionais de jogos eletrônicos são pagos para morar, comer e conviver em função das sessões diárias de treinamento para campeonatos. Quase como as concentrações adotadas por clubes de futebol antes de partidas importantes.

No caso, o time se chama iNTZ (da palavra "intrepidez"), e os Ronaldos, Romários e Rivaldos são mais conhecidos por suas alcunhas virtuais.

"Alocs" é Leonardo Belo, 25, de Recife. "Jockster" foi batizado Luan Cardoso quando nasceu em Curitiba, há 19 anos. "micaO" –assim, com a primeira minúscula e a última maiúscula– veio de Vila Velha (ES) assinando como Micael Rodrigues, 18. Gabriel Claumann, 18, o "tockers", é gaúcho. E Felipe "yang" Zhao, 19, de São José dos Campos, completa o quinteto.

Fenômeno mundial com cerca de 67 milhões de jogadores ativos, segundo Roberto Iervolino, 45, gerente do braço brasileiro da Riot (empresa americana criadora do jogo gratuito), League of Legends é um dos games mais acompanhados por jovens de diferentes estratos sociais via transmissões ao vivo (e replays) na internet.

As partidas, disputadas on-line e podendo durar mais de 40 minutos, opõem duas equipes de cinco jogadores.

Cada um exerce uma função básica distinta na estratégia para socar dragões, derrubar obstáculos e matar inimigos até o time estar fortalecido o suficiente para levar a cabo o objetivo final: destruir a "Nexus" (espécie de fonte de poder) do oponente.

Os papéis assumidos por cada membro da equipe, definidos por nomes como "jungler", "support" e "carrier", exigem diferentes interações (atacar, coletar, proteger, ajudar ou desbravar, por exemplo) e levam em conta o personagem escolhido no menu inicial do game, chamado "campeão" —ao todo, são 126 deles.

"Basicamente, é um caça-bandeira eletrônico. Mas há muitas escolhas a fazer: o campeão, itens, rotas...", explica Iervolino, que estima em seis meses o tempo para um novato dedicado se tornar um jogador razoável de LoL (sigla do nome do game).

O próprio CBLoL, como é chamado o torneio brasileiro, teve os embates da fase de grupos veiculados em tempo real a partir de um estúdio montado pela Riot na capital paulista –onde os duelos foram disputados presencialmente, aos sábados e domingos, por um total de oito equipes.

Essa é a razão de parte desses "gamers" profissionais se mudar para São Paulo, explica Rogério de Almeida, 41, sócio-diretor da iNTZ, fundada em junho de 2014.

Peu Robles/Folhapress
A partir da esq. Abaxial, yang, micaO, Jockster, Alocs, tockers e Shakarez
Equipe iNTZ; a partir da esq. Abaxial, yang, micaO, Jockster, Alocs, tockers e Shakarez

"É bom eles morarem juntos para vivenciarem o jogo mais intensamente", dizia o empresário enquanto digitava uma senha no dispositivo preso à maçaneta da porta de entrada de um dos apartamentos que formam a base do grupo, que também abriga outra equipe da "família", a iNTZ Red.

Instalados nos dois últimos andares, os imóveis guardam uma sala com sofá e televisão gigante, dormitórios munidos de beliches e sala de treino (vigiados por câmera de segurança interna) para os jogadores, o treinador americano (que não fala português) Alex "Abaxial" Habel, 25, e o lusitano Renato "Shakarez" Perdigão, 21, auxiliar técnico. Subindo uma escada em espiral, uma grande varanda na cobertura, onde fica a cozinha coletiva.

Sobre a rotina, a manhã costuma ser livre até a hora do almoço. Às 14h, eles se preparam para a primeira bateria de treino, que segue até as 18h. Pausa. Retomam das 19h às 22h. "Nossa diversão é trabalho", afirma micaO.

Naquela quarta (5), a tarde dos rapazes tinha como objetivo o prestígio de R$ 60 mil que seria pago ao vencedor da batalha no Allianz Parque.

Algumas vezes por semana, dizem, vão à academia praticar exercícios. Do time, apenas Alocs é formado em faculdade -os outros dizem ter planos para isso. Namorar, só "micaO" o faz atualmente, há três meses.

"É difícil a pessoa entender que não é a prioridade naquele momento", conta o "atleta" de "eSport" (nome dado ao mercado competitivo de games, ou "esportes eletrônicos").

A equipe tinha acabado de voltar de um treinamento nos EUA a convite de um de seus três patrocinadores.

Falar o quanto ganham é algo que eles não fazem além de dizer se tratar de "uma grana boa".

Alguns chegam a ser bastante assediados, como Gabriel "Revolta" Henud -que ajudou a iNTZ a conquistar o título da primeira etapa do CBLoL, em Florianópolis, mas foi levado para a Keyd Stars.

"Trinta segundos para surgir o próximo dragão!", bradou um dos narradores, levando as 12 mil pessoas presentes no estádio à euforia. Com preto e vermelho em rostos e roupas, a maioria gritava: "Pain, pain, pain!".

Não deu outra. Após uma segunda partida equilibrada e emocionante, o time iNTZ vacilou. Sem resistência, Matheus Baronti "Mylon" Borges, 18, pôs abaixo a Nexus dos intrépidos.

Em melhor de cinco, a terceira vitória garantiu o título para a paiN (campeã em 2013) e o direito de disputar, em setembro, vaga no mundial.

Consagrados, os cinco campeões ("brTT", "Dioud", "Kami", "sirT" e "Mylon") teriam a semana de folga antes de voltar à "gaming house" da equipe, no Jardim Europa, rumo à etapa global.

Divulgação
Publicidade
Publicidade