Argentino vende o carro para criar grafite ao lado do Minhocão, em SP

O elevado Costa e Silva, no centro paulistano, ganhará até o próximo dia 25 um vizinho —que, aliás, é a cara dele. "É uma pessoa feita de minhocões, meio urbanizada", descreve o grafiteiro Tec, autor da imagem de 64 metros de altura e 25 de largura pintada na lateral esquerda do Edifício Mercúrio, na rua Amaral Gurgel.

A figura é um projeto antigo. Teve início em 2012, quando Tec saiu de Buenos Aires, onde se dividia entre o grafite e as atividades em agências de publicidade e produtoras de filmes. Mudou-se para São Paulo para viver com uma paulistana que ele conhecera meses antes.

Ao passar a morar na capital paulista, ele notou o branco que a Lei Cidade Limpa deixara na lateral de edifícios —antes, anúncios preenchiam os espaços. E queria ocupá-las.

O grafiteiro saiu à procura de patrocínio, mas não houve acordo entre ele e as empresas. "Se era um laboratório, por exemplo, tinha de ser algo relacionado à medicina. Não poderia ser uma lagartixa."

"Pensei: 'Farei o maior desenho da minha vida na capital latino-americana do grafite e não será algo de que realmente gosto?'", recorda o grafiteiro, que prefere manter em segredo o nome e o sobrenome. "Falei: 'Não'. Aí comecei a pintar na rua, no asfalto."

Na capital argentina, ele desenhava peixes, em referência aos alagamentos. Em São Paulo, optou por iniciar com a figura de um rato e depois com o de uma lagartixa, ambas feitas na zona oeste. "Escolhi coisas que via, só que num tamanho gigante."

Espalhou pelo menos uma dúzia de figuras, entre bichos, pipas e pessoas no asfalto da capital e da Grande São Paulo —todas em ladeiras.

Em meio aos trabalhos, pediu orçamentos e procurou locais que o autorizassem a criar o mural. Neste ano, os moradores do Mercúrio toparam, a prefeitura concordou e Tec vendeu o seu Renault Megane 2007 para pagar a conta. Ele não revela o valor.

"Não duvidei um minuto. Pintar algo assim é o sonho da minha vida", diz Tec, que aos 15 anos pegou uma lata de tinta preta para divulgar sua banda, Ocote, em muros do bairro onde vivia, em Córdoba, e, desde então, não parou de desenhar.

No primeiro dia deste mês, aos 40 anos, ele iniciou o mural no prédio vizinho ao Minhocão, com a ajuda de um assistente. Seu propósito é ir além das imagens pintadas no chão e mostrar "a questão da cidade feita para carros".

Tudo com uma dose de crítica. "Já sou local e posso falar mais. Sou paulistano, entendeu? Antes era gringo, mas agora tenho minha família aqui, moro aqui e vou morar aqui. Então, me permito falar."

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