Na divisa entre o Espírito Santo e a Bahia, Itaúnas tem mais a oferecer que um simples arrasta-pé

O céu é tão estrelado em Itaúnas que aquele bichinho no meio da rua de terra e areia logo é identificado até mesmo por quem congrega miopia e astigmatismo nos dois olhos.

O caramujo de concha colorida e 15 centímetros de comprimento é vigiado de perto por uma coruja-buraqueira. A menos de dez passos da pousada, ouve-se com nitidez o barulho da arrebentação em meio ao crocitar. Dorme-se assim. Desperta-se com a algazarra de um punhado de saguis-de-caras-brancas ao celebrar o amanhecer.

Pacata, a vila de Itaúnas, perto da divisa entre o Espírito Santo e a Bahia, é daqueles lugares onde as pessoas se cumprimentam na rua sem se conhecerem.

Chegar lá não é tarefa tão fácil. Da capital, Vitória, são cerca de 260 km pela BR-101, no sentido norte. Deve-se entrar à direita no trevo de Conceição da Barra e seguir por 14 km de asfalto até o acesso a Itaúnas. Daí para a frente, são 21 km em estrada de chão batido. E dá-lhe poeira.

Logo ao pisar na pracinha central, em cujo centro se ergue a igreja de São Sebastião, percebe-se que o local é uma espécie de refúgio para quem quer se esquivar do barulho e da pressão do asfalto. Território simples e acolhedor, Itaúnas não dispõe de caixas eletrônicos nem de postos de gasolina, portanto, para sacar dinheiro ou abastecer o carro, é preciso fazer uma parada em Conceição da Barra.

Famosa por seu forró, ritmo ditado por sanfonas, zabumbas e triângulos, Itaúnas é especialmente conhecida por suas dunas de areia fina e dourada que alcançam até 30 metros de altura. Atravessá-las é o único jeito de chegar ao mar.

Para protegê-las, foi criado em 1991 o Parque Estadual de Itaúnas. São 3.481 hectares em meio a manguezais, riachos, dunas gigantescas e trechos de mata atlântica divididos em seis trilhas abertas aos visitantes. As mais acessadas, a do Tamandaré e a do Pescador, são relativamente curtas e têm baixo grau de dificuldade. Ambas dão em praias selvagens -o mar agitado não chega a deslumbrar: sua cor passeia entre o verde e o marrom por causa dos rios que desembocam por lá.

Na área de preservação, há registro de 43 espécies de mamíferos, 183 de aves, 32 de répteis, 29 de anfíbios e 101 de peixes. O espaço sob proteção abriga ainda 23 sítios arqueológicos.

O avanço das dunas naquela área capixaba teve início entre as décadas de 1950 e 1970, quando moradores passaram a retirar quase toda a vegetação de restinga para facilitar o acesso ao oceano. Boa parte da madeira extraída era usada como lenha.

Os ventos fortes fizeram com que a areia cobrisse a vila, então instalada na margem esquerda do rio Itaúnas, onde viviam cerca de 700 habitantes, muitos dos quais remanescentes de quilombos, dependentes, sobretudo, da agricultura de subsistência, da produção de farinha de mandioca, da caça e da pesca, segundo conta a historiadora Mariana dos Santos Albuquerque, 29. "A movimentação das dunas fez com que os nativos procurassem refúgio do outro lado da margem do rio, onde hoje existe a vila", diz a moça, nascida e criada ali.

Daquelas antigas moradas, restaram o triste hábito da caça, proibida, mas persistente, algumas benzedeiras, assim como o sincretismo religioso representado principalmente pelo Ticumbi, uma dança dramática de raízes africanas que sobrevive há mais de 200 anos no norte do Espírito Santo. Coisas de Itaúnas, quase só dela!

*

ONDE FICAR

Pousada Casa de Praia
Pacotes de três diárias em suíte casal, com café da manhã e chá da tarde, a partir de R$ 2.500 para o Réveillon.
Tel. (27) 3762-5133

-

Pousada Holú
Quatro diárias a partir de R$ 2.000 para casal em apto. duplo no Réveillon.
Cel. (27) 99732-7559, (27) 98147-6328

-

Pousada dos Corais
Pacote com cinco diárias em apartamento duplo com café da manhã a partir de R$ 1.200, até o dia 18 de dezembro.
Tel. (27) 3762-5200

Publicidade
Publicidade