De natureza soberana, Torres del Paine, no Chile, é um convite para se conectar aos extremos

Parecia que o mundo ia desabar. Em meio a nuvens carregadas, o Sol, de repente, deu as caras de forma impetuosa. O vento corria forte de um jeito que arrepiava. Recém-chegado à Patagônia, o coração pulsava dividido entre o mergulho relaxante numa piscina aquecida, com vista para a cadeia de montanhas, e uma caminhada à beira de uma lagoa de águas azuis no Parque Nacional Torres del Paine, no sul do Chile.

Chegar até lá é cansativo: são dois voos seguidos, São Paulo-Santiago, Santiago-Punta Arenas, mais um transfer em van de quase quatro horas de rodagem em meio à imensidão de pradarias que parecem não ter fim. O motorista, com ares de cicerone, foi logo avisando: "Em Torres del Paine, você tem as vistas mais espetaculares que a imaginação humana poderia conceber". Difícil, ao término da viagem, será contestá-lo.

Ao pisar no hotel, o Tierra Patagônia, o calor das boas-vindas contrastava com o gelo da paisagem. As vidraças quase de chão a teto no hall principal, de pé-direito altíssimo, deixam ver o lago Sarmiento, emoldurado pelas montanhas escarpadas da cordilheira Torres del Paine. Nesse cenário, um bate-papo descontraído com a equipe e logo se chega a uma programação de passeios, organizada de modo a aclimatar o visitante às intempéries do ambiente. O que não falta são meios de tirar proveito dessa paisagem acidentada: caminhar, pedalar, montar a cavalo, navegar e, é claro, relaxar.

Há os que se entregam às longas trilhas que atravessam o parque. Esses podem escolher uma das excursões de trekking, divididas em três níveis (fácil, médio e intenso), que atendem a diversas habilidades.

O passeio de "batismo" na Patagônia deixa qualquer um revigorado. De outubro a abril, a temperatura sobe no Parque Nacional Torres del Paine. É raro, contudo, superar os 20°C. Além disso, devido às súbitas alterações climáticas e às constantes rajadas de vento, a sensação térmica é de frio.

Era começo de outono. Aquele fim de tarde nos brindou com um pôr do sol multicor refletindo numa lagoa azulada e fazendo brilhar as imponentes Torres. Uma família de guanacos pastava em meio à tranquilidade. Embora sejam os maiores mamíferos terrestres do parque, não falta o que lhes roube o sossego: seu predador, o puma, pode aparecer, coisa que, ao menos nos instantes do crepúsculo, não aconteceu.

A imagem que se via refletida na água era de brandura: os guanacos, que são, digamos, primos das lhamas peruanas, pastavam à espera do anoitecer. Enquanto isso, no céu, condores pairavam acima dos picos.

De volta ao hotel, a empolgação era tamanha que o relax na piscina foi substituído por uma conversa pautada por gente da Europa, dos Estados Unidos, da Ásia. Numa espécie de celebração no balcão do bar, taça de carménère na mão, cada um compartilhava uma foto ou um momento especial da experiência que é desbravar a Patagônia.

Existem diferentes tipos de hospedagem: desde luxuosas pousadas na vanguarda do design até simples acampamentos. Os amantes da natureza e do conforto tendem a se inclinar em direção à primeira categoria. Para eles, o Tierra Patagônia é uma das melhores opções. All-inclusive, a diária inclui não só a hospedagem mas também as refeições, traslados, passeios e guias experimentados com a fauna, a flora e a geologia locais.

Do restaurante, é possível alcançar o Sarmiento num passeio contemplativo de 15 minutos de pernada. Tempo suficiente para apreciar tanto o isolamento quanto a grandiosidade das formações ao redor.

Na manhã seguinte, embarcamos em uma jornada, diga-se, mais suave. Fomos a fazendas de criação de ovelhas que abrem as porteiras para o visitante assistir à tosquia e ainda acompanhar o trabalho dos baqueanos, como são chamados os caubóis da Patagônia. Ao lado de seus inseparáveis cavalos, esses gaúchos, quando estão trabalhando nas planícies, evocam a memória de um mundo em via de desaparecer –tudo ali era pasto antes da construção da reserva.

A façanha dos chilenos de transformar o Torres del Paine em um modelo de parque seduz visitantes do mundo inteiro à procura de uma combinação de natureza selvagem e cenários inóspitos com infraestrutura.

A cordilheira foi formada ao longo das últimas eras glaciais, esculpindo uma cadeia de picos independente dos Andes. Em seu entorno encontram-se geleiras. A Grey é uma delas, à qual se chega de barco em um dos passeios organizados pelo Tierra. Tingido de tom marinho, o glaciar derrete atualmente ao dobro da velocidade de uma década atrás. Há ainda lagos de degelo com águas em matizes de verde, azul, cobalto e cinza.

Seu aspecto leitoso vem da volumosa carga de minerais, arrancados das encostas pelas línguas de gelo há dezenas de milhares de anos. Prevalece ali, no extremo sul chileno, a força bruta dos vendavais.

Numa manhã carregada, ao tentar sair da embarcação no Grey, a velocidade do vento beirava os 100 km/h. Naquele instante, ameaçava nos lançar à água. Em alguns pontos, o sol brilhava. Noutros, a chuva chicoteava –tudo em um único par de horas. De fato, a Patagônia consagra-se como território de condições imprevisíveis.

Para quem tem uma piscina quentinha, com vista para as Torres para relaxar no fim do dia, tudo parece confortavelmente desafiador. Nem precisa entrar nela. Basta lembrar que ela existe. Quem sabe numa próxima viagem sobre um tempinho para dar aquele tão sonhado tibum!

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QUEM LEVA

Tierra Patagonia
A partir de US$ 4.200 (4 noites em apto. duplo, all-inclusive e excursões).

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Auroraeco
A partir de US$ 4.750. São 3 noites em apto. duplo no Tierra, all-inclusive, aéreos e traslados.
Tel. 3086-1731

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Interpoint
A partir de US$ 5.170. Quatro noites em apto. duplo no Tierra e 2 noites em Santiago, aéreos, traslados e excursões.
Tel. 3087-9400

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