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Depoimento

Repórter faz sua estreia fora do asfalto na pior trilha dos EUA

Por muitos anos eu desconfiei que alguma coisa estava errada ao ler sobreautomobilismo nas páginas do caderno Esporte. Afinal, o cara dá umas pisadas no breque, outras no acelerador e fica girando a direção, que, ainda por cima, é hidráulica ou elétrica.

Qual seria o esporte escondido nisso, se todo o esforço físico parece vir do motor?

Bobagens assim passavam pela minha cabeça quando cheguei à trilha Rubicon, ao lado do Lake Tahoe, norte da Califórnia. Trata-se de uma famosa estradinha de pedras com cerca de 30 quilômetros e nível 10 de dificuldade, o máximo na tabela dos jipeiros.

A fabricante Jeep batizou uma versão do novo Wrangler como Rubicon, e é para o lançamento desse modelo que a Folha foi convidada.

O nível 10 não me assusta. Vamos dirigir por 8 horas até um acampamento, dormir e voltar para mais quatro horas de trilha. Nossa velocidade será a metade da de uma pessoa andando.

Uma série de auxiliares se espalha pelo caminho para nos orientar. São 10h e o calor chega a 30°C. O local é árido. Nosso carro, por sorte, é fechado e tem ar-condicionado.

Só que eu estava bem errado. Na primeira meia hora, avançamos sobre uma estrada em que não havia terra, apenas pedras, todas elas do tamanho de bebês gordos.

O carro sacolejava tanto que meu cérebro era arremessado para todo lado dentro da caixa craniana, como se fosse uma bola de rúgbi.

Minha cabeça começou a doer e meu humor, antes neutro, passou para levemente irritado e logo para a autocomiseração. Onde eu havia me metido?

Os jipeiros são um grupo bem específico de pessoas. Eles se reúnem nos fins de semana para colocar seus carros em trilhas de pedras, lama ou areia e se divertem na mesma proporção dos problemas em que se metem. Sempre vão em grupos porque um ou outro carro vai quebrar e precisar ser rebocado.

Meu parceiro de viagem no Wrangler é um desses há 15 ou 18 anos, ele não sabe bem. Pela experiência, logo percebeu meu desconforto. "Venha dirigir, vai se sentir melhor."

É verdade. Quando a gente está no volante, tem melhor noção de quando e para que lado o carro vai balançar, o que diminui o problema.

Após umas duas horas nas pedras-bebês, chegamos às grandes rochas. Aqui são do tamanho de um sofá, ou seja, algo que ninguém tentaria transpor com um carro. Mas os jipeiros tentam.

Sobe com a roda direita nessa aqui, a roda esquerda fica no ar, vai em frente, crassshhh, nhééééé, o fundo do carro está raspando inteirinho na pedra, agora a roda dianteira esquerda alcançou o chão. O jipe está completamente torto no ar e, upa, cai para a esquerda. O escapamento foi esmagado.

O auxiliar dá um ok: "Perfeito, ótimo trabalho." A gente segue e a fila indiana anda.

É neste momento que percebo o enorme esforço físico que estou fazendo na direção. A tensão é tanta que meus dedos estão suando. Talvez por estar arrebentando um carro de R$ 200 mil nas pedras ou estar com medo de fazer tudo errado e precisar ser rebocado? Que humilhação...

Andamos a 2 ou 3 km/h com todas as rodas ligadas à transmissão, o famoso 4x4, e o tempo todo em marcha reduzida. Isso confere o dobro de força ao carro da Jeep.

O Wrangler tem tecnologias extraterrestres: dá para desligar o diferencial traseiro ou ambos, deixar as rodas não paralelas, checar no painel as inclinações em que o jipe se encontra... E outras mundanas: o sistema que esquenta os bancos e o volante me chamou a atenção.

A certa altura, um curioso cemitério: uma dúzia de entusiastas da Rubicon, com lápides que datam desde 1975, enfeitadas com porcas e parafusos, descansa bem no meio de sua trilha preferida.

Após o cemitério, chegamos à terceira fase mineral, que eu considerava impossível: o Jeep Wrangler vai escalar paredes. Está certo que não é a parede em 90 graus da sua casa, mas a entrada para o platô à nossa frente tem mais de um metro de altura.

Estamos agora diante de formações do tamanho do próprio automóvel. E enfiando uma roda aqui, a outra ali, meio que quase tombando, o carro se eleva. Nem é preciso dizer "não tente fazer isso com seu carro", pois seria despropositado.

A noite no acampamento foi congelante, a 3°C. E a volta foi pior que a vinda: para descer, a força da gravidade está te empurrando junto, achei mais perigoso. Houve quem achou mais fácil. Para ser sincero, foi uma mais difícil que a outra.

O jornalista viajou a convite da Jeep

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