Shinzo
Okuda, que ajudou a recuperar a praça Ramos, faz parte
de uma lista ilustre que homenageará Antônio
Ermírio
Numa lista de banqueiros, industriais, jornalistas, executivos,
intelectuais, políticos (entre os quais Lula, Fernando
Henrique Cardoso, José Serra e Aécio Neves)
e artistas, Shinzo Okuda é o único personagem
invisível. Quando o convidaram a entrar nessa lista,
perguntou-se: "Meu Deus, que fazer?".
Shinzo ficaria no anonimato não fosse ter sido convidado
para integrar o grupo das 80 pessoas que escreveriam textos
para um livro sobre Antônio Ermírio de Moraes,
que completa hoje 80 anos -o livro foi a forma encontrada
pelos amigos de homenagear o empresário.
Nascido no Japão há 64 anos, Shinzo veio para
o Brasil quando tinha 13 anos e teve de se esforçar
para aprender português e freqüentar a escola -ainda
hoje ainda enfrenta certa dificuldade para se expressar.
"Pensei até em pedir a alguém mais letrado
que escrevesse bonito, mas não iam ser as minhas palavras,
os meus sentimentos."
Shinzo foi escolhido porque é jardineiro e ajudou a
recuperar a praça Ramos, abandonada, com seu permanente
cheiro de urina e de fezes. Em frente a essa praça,
casaram-se os pais de Antônio Ermírio -e, exatamente
nesse lugar, o empresário montou um império
industrial e se tornou o homem mais rico do país. Quase
se habituou ao abandono da paisagem, antes tão elegante.
Até que Shinzo chegasse.
O prédio em que se casaram os pais de Antônio
Ermírio passou a abrigar a sede da Votorantin, de onde
se vê a praça Ramos, ao lado do viaduto do Chá.
Até o final da década de 1990, aquele espaço
compunha mais um entre tantos cenários da degradação
da região central. "Vou chamar um japonês
para dar um jeito nisso", comprometeu-se o empresário.
O japonês era Shinzo, que cuidava dos canteiros do Hospital
Beneficência Portuguesa, dirigido por Antônio
Ermírio. "A praça não podia estar
pior", lembra-se Shinzo.
A tarefa parecia infindável. Muitos mendigos e moradores
de rua destruíam o que era plantado.
O empresário não se contentou em ser o zelador
à distância da praça ao longe, protegido
em seu gabinete.
Muitas vezes, sozinho, ia ver de perto o jardim e aborrecia-se
com uma flor amassada ou um canteiro destruído. Não
se imaginava, porém, derrotado -afinal, a derrota seria
lembrada todos os dias em que chegasse ao escritório.
Com a ajuda de Shinzo, ele venceu. O local se transformou,
de novo, num cartão-postal, sugerindo a lembrança
dos tempos do casamento de seus pais. Para completar o cenário,
Antônio Ermírio decidiu fazer uma iluminação
especial da fachada de seu prédio, para compor um jogo
de luzes com a praça.
Por causa dessa pequena vitoriosa batalha urbana, Shinzo
entrou na lista de personalidades do livro -até então,
no seu anonimato, só tinha sido visível publicamente
na forma de folhas e flores.
Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo,
editoria Cotidiano.
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