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A
Casa dos Executivos
Responda
rápido: qual a cor dos olhos de sua mulher?
A pergunta
faz parte de um questionário entregue a 50 executivos
para testar o conhecimento sobre detalhes e hábitos
de suas mulheres.
Não
foram poucos os que, além dos olhos, desconheciam também
a cor do cabelo, hobbies, comidas ou músicas preferidas
de suas companheiras.
Consequência
óbvia da indiferença que ataca casais, a ignorância
sobre detalhes tão elementares conta como pessoas tão
próximas tornam-se, paradoxalmente, tão distantes.
Nessa
distância tão próxima são construídos
o inferno familiar, as estatísticas de separação
e a sensação de abandono dos filhos. As distâncias
ficam mais notáveis quando se comparam os questionários
dos executivos com os de seus filhos e mulheres, também
convidados a responder sobre os mesmos tópicos.
O objetivo
desse teste tem pouco a ver com interesse pela vida conjugal,
mas com a performance profissional dos executivos que, se
submetidos a uma carga demasiada de estresse, acabam, mais
cedo ou mais tarde, se tornando improdutivos e ficando doentes.
Cor dos
olhos é só um indício para se tentar
saber sobre a deterioração de um indivíduo;
muitos vivem em lares cheio de conflitos, diferentes dos apresentados
na "Casa dos Artistas", do SBT, apenas pela ausência
de câmeras - e pela falta, no final, de um prêmio
em dinheiro.
Responsável
pela sabatina afetiva, a assistente social Cecília
Shibuya, presidente da Associação Brasileira
de Qualidade de Vida, é chamada rotineiramente por
grandes empresas para medir a saúde mental e física
de executivos e de funcionários; a partir daí,
montam-se programas de prevenção.
Nas pesquisas,
sempre aparece o retrato, especialmente na cúpula da
hierarquia, de seres prensados pelas obrigações,
que fizeram do tempo um inimigo e da vida, uma agenda de compromissos.
Nenhuma
novidade: basta ver a incidência de infartos e derrames
entre pessoas muito agitadas, tensas e ansiosas, que não
se cuidam, não têm tempo para ir ao médico,
descansar ou passear - justamente nesse segmento detecta-se,
com mais facilidade, a chamada "síndrome do lazer",
a incapacidade de relaxar.
Mas, neste ano, Cecília colheu dados que revelam um
monumental agravamento da pressão psicológica
daqueles tidos como exemplo de sucesso profissional. Vida
pessoal tumultuada é somente mais um aspecto desse
massacre.
Neste
semestre, 211 executivos, desobrigados de se identificarem,
responderam a um exame de testes sobre as pressões
que os atingem. "A pressão está piorando.
Piorou especialmente neste ano", suspeita Cecília.
Em um
dos tópicos, eles deveriam relacionar quais os sinais
de estresse que detectam em suas vidas pessoal, profissional
e familiar: 85% reclamaram da sobrecarga de trabalho, da dificuldade
em administrar o tempo e de acompanhar o crescimento dos filhos.
Para 80%, existe insegurança para tomar decisões.
Os efeitos
da insegurança aparecem, dramaticamente, num item:
75% admitiram que excedem no fumo ou na bebida.
Foram,
então, convidados a listar aspectos que precisam ser
melhorados para atingir mais qualidade de vida. Entre outras
respostas, 37% disseram diminuir a bebida; 29% querem ter
o sono mais tranquilo e 27% anseiam um ambiente familiar menos
tenso.
Os detalhes
do massacre surgem com ainda mais transparência quando
os executivos falam sobre os sintomas sentidos ultimamente.
Pela ordem: ansiedade (15%), esquecer coisas corriqueiras
(11%), cansaço ao acordar e distúrbio do sono
(10%), tensão muscular/dor na nuca (9%), depressão
e angústia (8%), problemas estomacais (6%).
Note-se
que esse tipo de pessoa tem, em geral, dificuldade em assumir
fraquezas; sua posição exige firmeza, rapidez,
força. O resultado provavelmente é pior.
Quando
se pede a tecnocratas, de fora ou de dentro de um governo,
que mostrem os sinais das dores e crises de uma nação,
eles falam dos indicadores de crescimento econômico,
da balança comercial, da inflação, e
por aí em diante. Dificilmente conseguem ver os milhões
de dramas humanos. A verdade, porém, é que as
tensões deste ano justificam as indicadas na pesquisa
dos executivos, todos eles, por função, obrigados
mesmo a enfrentar desafios pesados. Mais desafiados ainda
com os apertos da globalização, o aumento da
competição, a aceleração do ritmo
de inovação tecnológica e as fusões
de empresas.
O problema
é que a taxa de incerteza, mesmo para um país
acostumado a tantas incertezas, foi além da conta.
Pela irresponsabilidade pública, viu-se uma nação
se ajoelhar por causa do racionamento de energia; acompanhou-se
a derrocada da Argentina, na convicção de que
iríamos pagar um preço alto, temor visível
nas oscilações do dólar, e, finalmente,
explodiram as torres gêmeas de Nova York.
Nessa
incerteza, muita gente pagou e está pagando com o emprego
- e muita gente, com o coração.
Confira
a íntegra da pesquisa.
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