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Para
Bird, protecionismo dos ricos limita o avanço dos países emergentes
As inovações
tecnológicas e a liberalização do comércio
mundial impulsionaram a economia dos países em desenvolvimento,
mas o resultado poderia ser melhor se os países ricos derrubassem
suas barreiras protecionistas, concluiu o relatório do Banco
Mundial (Bird) sobre a economia global e os países em desenvolvimento.
Para o Bird,
as regras laborais, ambientais e de padronização de
produtos impostas pelos países ricos são barreiras
comerciais disfarçadas. Ao restringir o acesso dos emergentes
ao comércio mundial, tais regras freiam o avanço econômico
dos países e a melhoria das condições de trabalho.
"A comunidade
internacional tem meios mais eficazes do que sanções
comerciais para incentivar a melhoria de padrões laborais
e ambientais nos países em desenvolvimento", afirma
o relatório, propondo que os países ricos estimulem
a abertura ao comércio exterior e evitem o protecionismo.
(Gazeta
Mercantil)
Protecionismo
de ricos limita desenvolvimento
As inovações tecnológicas e a liberalização
do comércio internacional que marcaram a década de
90 deram um forte impulso às exportações e
ao próprio crescimento dos países em desenvolvimento.
Mas o desempenho
poderia ter sido maior, adverte o Banco Mundial (Bird), se os países
industrializados tivessem avançado na liberalização
de seus próprios mercados, desmontando barreiras comerciais
e tarifárias, às vezes disfarçadas em normas
de padronização de produtos, regras laborais ou ambientais,
que dificultam e até inviabilizam o acesso dos países
em desenvolvimento.
O relatório
do Banco Mundial Perspectivas Econômicas Globais e os Países
em Desenvolvimento - 2001 comemora a estimativa de um crescimento
inédito de 12,5% no volume do comércio mundial este
ano - a mais alta taxa de crescimento desde antes do primeiro choque
do petróleo na década de 1970. Também comemora
que, apesar da crise financeira do final da década, as exportações
dos países em desenvolvimento se expandiram à taxa
de 10% ao ano durante os anos 90, o triplo do observado na década
de 80, enquanto que o comércio mundial cresceu 6% ao ano.
Puxado pelo comércio exterior, o Bird estima que o crescimento
econômico desses países deverá registrar taxas
de 5,3% este ano e 5% no próximo ano, diminuindo para 4,8%
em 2002.
O relatório
adverte para as incertezas e vulnerabilidades que podem encerrar
o ciclo excepcional de crescimento econômico, que sustentou
e impulsionou o comércio mundial, notadamente as dúvidas
quanto à durabilidade da expansão sem inflação
dos Estados Unidos e continuação da alta dos preços
do petróleo.
O Banco Mundial
entende que, nos próximos dois anos, o ritmo de crescimento
diminuirá, ante o pico de 3,7% estimados para 2000 para os
países industrializados. Para 2001, espera 2,9%. Já
o crescimento a curto prazo na renda per capita dos países
em desenvolvimento tenderá a variar de quase 6% no Leste
Asiático, até cerca de 1,5% no Oriente Médio
no Norte da África e na África subsaariana.
Na América
Latina, embora a recuperação tenha mostrado um vigor
impressionante, sobretudo no Brasil, o ímpeto parece ter
diminuído um pouco no segundo semestre. Ainda assim, o Produto
Interno Bruto (PIB) da região deverá crescer 4% em
2000, com as taxas de crescimento variando consideravelmente em
diferentes partes da região. Para o Bird, a América
Latina está a ponto de iniciar uma fase de crescimento moderado
e constante para a próxima década, fruto das reformas
favoráveis ao mercado nos países maiores, o fortalecimento
dos sistemas bancários e financeiros relativamente fortes,
possíveis efeitos secundários do que ocorre nos EUA
e ao maior incremento do investimento estrangeiro direto entre as
regiões em desenvolvimento.
No Leste Asiático,
os cinco países mais duramente atingidos pela crise financeira
(Coréia, Filipinas, Indonésia, Malásia e Tailândia)
acusaram acentuada recuperação após a recessão
de 1997-98. Em média, os cinco países acusaram expressiva
recuperação em 1999, com uma taxa de 6,7% - em contraste
com o declínio de 8,2% que sofreram na crise de 1998 -, consolidada
ainda por quase 7% de crescimento em 2000. Na China, o crescimento
durante o período após a crise variou de 7% a 8%.
Em 2001-02, é provável que o crescimento na região
da região comece a desacelerar.
O Bird chama
a atenção para dois países mais vulneráveis:
Indonésia e Filipinas. Ambos sofrem também debilidades
políticas, distúrbios civis e (do ponto de vista dos
investidores) uma percepção de que as práticas
de governança corporativa não progrediram substancialmente.
Na Ásia
meridional, o PIB subiu a 5,7% em 1999 e provavelmente chegará
a 6% em 2000, devido a um desempenho da agricultura melhor do que
o esperado na Índia, no Paquistão e em Bangladesh,
bem como a uma aceleração da produção
industrial indiana, que marcou taxas de dois dígitos, e a
vigorosos avanços na produção de serviços.
A taxa média de crescimento da região deverá
reduzir-se para 5,5% em 2001-02. Problemas financeiros provavelmente
virão restringir o crescimento no Paquistão. Além
disso, a região depende muito da importação
de energia e (especialmente quanto aos países menores) da
exportação de produtos agrícolas como algodão,
chá e borracha. A necessidade de se ajustar às perdas
nas relações de troca ocasionadas por recentes flutuações
adversas nos preços dos produtos primários poderá
amortecer o crescimento no futuro próximo.
Na Europa e
na Ásia Central, o crescimento médio do PIB deverá
atingir 5,2% em 2000, ou significativamente mais do que o avanço
de 1% registrado em 1999. Na Rússia, ocorreu uma recuperação
inesperadamente vigorosa, embora dependente em grande parte das
receitas do petróleo e mais frágil do que a do Leste
Asiático. Com a esperada estabilização dos
preços do petróleo no médio prazo, enquanto
vão desaparecendo os efeitos da desvalorização
do rublo de 1998, o ritmo de crescimento do PIB da Rússia,
atualmente de 7,2%, deverá sofrer significativa redução
no médio prazo.
A mais longo
prazo, as perspectivas da região melhoraram consideravelmente
após os problemas ocorridos durante a transição
para economias de mercado nos anos 90. Os países apoiados
pelo processo de integração na UE têm forte
incentivo para pôr em prática as reformas pró-mercado
e estão em condições de acusar um crescimento
maior que o dos outros países da região.
Na África
subsaariana, os efeitos adversos da crise de 1997-99 continuaram
a deprimir a atividade econômica em 2000, face à permanência
dos preços das mercadorias (exceto o petróleo) perto
de níveis ciclicamente baixos. Contudo, o incremento das
receitas do petróleo estimulou o crescimento para os seus
exportadores da região, tendo o produto da África
do Sul acusado um crescimento de 2,2%, depois de muitos anos de
desempenho inexpressivo. Em média, a região passou
por uma aceleração do crescimento, de 2,1% em 1999
para 2,7%, e a renda per capita estabilizou-se após dois
anos de declínio.
Os países
com o chamado marco regulatório mais favorável - por
exemplo, Botswana, Uganda e vários países da zona
de colonização francesa - tenderam a mostrar um desempenho
melhor do que a média, com ganhos do PIB de 4,4%. Os países
onde ocorreram conflitos civis ou graves distúrbios políticos
- por exemplo, Angola, a República Democrática do
Congo, Serra Leoa, Etiópia e Zimbábue - registraram
desempenhos mais fracos, com queda do PIB de 1,5% durante o ano.
Mas apesar das
reformas econômicas priorizando sistemas de mercado e 'um
fenômeno claramente cíclico conjugado a níveis
robustos de atividade mundial' o aumento da renda real média
per capita dos países em desenvolvimento limitou-se a taxas
inferiores a 1% ao ano durante a década de 1990, em comparação
com mais de 2% nos países industrializados. Assim, as regiões
que mais abriram suas economias ao exterior, o Leste Asiático,
a Ásia meridional e a América Latina, registraram
também a maior aceleração das exportações.
Já o crescimento das exportações na África
subsaariana limitou-se à média anual de apenas 2%,
devido em parte ao fato de que o comércio internacional dos
produtos por eles exportadores cresceu à metade da taxa de
crescimento do comércio global. Os países da África
subsaariana, do Oriente Médio e do Norte da África
também perderam as respectivas parcelas do mercado das suas
exportações tradicionais. O mesmo acontecendo com
a América Latina em geral, com exceção do México.
Políticas
de comércio exterior fracas, como a ausência de efetivos
programas de isenção de direitos e impostos aduaneiros,
combinada com o uso fiscal de tarifas sobre bens intermediários
e de capital, aumentando os custos dos exportadores, contribuíram
para limitar o crescimento em muitos dos países mais pobres.
Taxas de câmbio reais valorizadas e altamente voláteis,
idem, assinala o relatório.
Mas também
contribuíram as barreiras comerciais nos países industrializados
às importações de produtos agrícolas
e alimentos processados, assim como os subsídios à
agricultura. Tais barreiras prejudicaram especialmente os países
mais pobres, para os quais - devido ao fato de também lutarem
com infra-estruturas fracas no que se refere ao comércio,
como os transportes e comunicações, bem como devido
à falta de mão-de-obra especializada - são
pronunciadamente limitadas as opções para diversificar-se
com outras exportações com maior potencial de crescimento.
O estudo do
Banco Mundial ressalta que, embora as tarifas médias nos
EUA, no Canadá, na União Européia e no Japão
- os chamados Países da Quadrilateral - variem de 4,3% no
Japão a 8,3% no Canadá, suas barreiras comerciais
e tarifárias permanecem muito mais altas para muitos produtos
exportados pelos países em desenvolvimento. Alimentos essenciais,
como carne, açúcar, leite, lacticínios e chocolate,
são sujeitos a tarifas que freqüentemente ultrapassam
100%. Mercados desenvolvidos de frutas e legumes são praticamente
vedados por tarifas de 180% sobre bananas que excedem as quotas
na UE, e 550% e 132% para amendoim descascado no Japão e
nos EUA, respectivamente. Em vários países industrializados,
alimentos processados como sucos de frutas, carne enlatada, pasta
de amendoim e confeitos açucarados defrontam-se com alíquotas
superiores 30%, enquanto têxteis, vestuário e calçados,
sujeitos a tarifas na faixa de 15% a 30% para grande número
de produtos.
E são
todos setores nos quais os países em desenvolvimento têm
a vantagem comparativa, como os vinhos portugueses e panos ingleses
dos tempos de Davi Ricardo.
'Além
disso, às vezes, pressões visando usar sanções
comerciais para apoiar padrões laborais e ambientais - que
podem ser legítimos e desejáveis em si - ameaçam
limitar o desenvolvimento do acesso de países a mercados
internacionais, sem atingir os objetivos propostos', observa o Banco
Mundial, no capítulo dedicado a analisar a utilização
de padronização de produtos e regras laborais e ambientais
como instrumento protecionista.
A UE, exemplifica,
está harmonizando seus padrões para níveis
de aflatoxina, uma substância que pode causar câncer
no fígado. Os novos padrões europeus, mais rigorosos
do que os já internacionalmente aceitos, diminuiriam os riscos
em aproximadamente 1,4 morte por câncer por bilhão
por ano. Esse novo padrão pode, em tese, reduzir substantivamente
as exportações de cereais de países em desenvolvimento
para a UE, já que poucos detêm a tecnologia de avaliar
os perigos da aflatoxina, nem a capacitação em análise
clínica para cumprir a nova regulamentação
dos europeus.
Outro exemplo:
a regulamentação da UE exige que o uso de leite de
vacas confinadas e ordenhadas mecanicamente na produção
de laticínios - uma regra proscreve importação
de muitos países em desenvolvimento, particularmente aquele
com inúmeros pequenos produtores para os quais a mecanização
significa um custo sem benefício.
E a padronização
é cara. A Organização para a Cooperação
e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) calcula que padrões
e normas técnicas diversas, juntamente com os custos de verificação
e certificação, podem representar entre 2% e 10% do
custo total de um produto. E a Comissão Européia calculou
que os custos friccionais médios de padrões diferentes
entre os países da UE antes da iniciativa do mercado único
variava entre 2% e 3% do valor do comércio. O acordo EUA-UE
de reconhecimento mútuo para produtos de telecomunicações
e tecnologia da informação, se implementado à
risca, poderá reduzir custos em 5% do valor dos bens comercializados.
'O uso da padronização
de produtos para fins protecionistas é uma clara ameaça
a um regime de comércio exterior aberto. Em princípio,
é possível distinguir entre os custos 'normais' do
comércio ... e barreiras destinadas a limitar a concorrência
de importações', sentencia o Banco Mundial.
Na mesma linha
da padronização de produtos corre a imposição
de normas laborais básicas, como o direito de associação
sindical, a abolição do trabalho infantil, a proibição
da escravidão e de trabalhos forçados, assim como
de normas ambientais do tipo limites para a poluição
e o desflorestamento. O Banco Mundial entende que o recurso a sanções
comerciais para impor tais padrões tende a ser contraproducente,
uma vez que as sanções restringiriam o acesso dos
países aos mercados internacionais, pouco fazendo ao mesmo
tempo para melhorar o bem-estar dos trabalhadores e das populações
que pretendem proteger.
Lembra o relatório
que é o desenvolvimento que aprimora as normas laborais e
ambientais. Além disso, baixos padrões laborais e
ambientais geralmente não constituem fonte significativa
de vantagem comparativa. 'Baixos padrões laborais no exerior
não constituem uma ameaça grave às condições
de vida dos trabalhadores de países industrializados; tampouco
há comprovação teórica ou empírica
sugerindo que baixos padrões laborais em geral forneçam
uma vantagem comparativa', observa o Banco Mundial.
Ao contrário,
padrões laborais baixos artificialmente impostos tendem a
reduzir a competitividade da economia que os admite, ao reduzir
os incentivos aos trabalhadores para melhorarem sua capacitação
e sua qualificação. E, da mesma forma, baixos padrões
laborais reduzem os incentivos para as empresas introduzirem tecnologias
poupadoras de mão de obra, já que o custo do trabalho
é menor que o investimento.
Assim, a imposição
de sanções comerciais tende a se subordinar à
manipulação por parte de interesses protecionistas.
Sem falar que, mesmo quando a ameaça de sanções
possa melhorar as condições para certos trabalhadores,
é pouco provável que, na média, as condições
de trabalho na economia ameaçada venham a melhorar.
Como exemplo,
o relatório do Bird menciona as pressões internacionais
para reduzir o uso de trabalho infantil na produção
e exportação de aviamentos em Bangladesh, que resultou
na dispensa das crianças, as quais acabaram recorrendo a
ocupação mais degradantes e prejudiciais, como a prostituição
e o trabalho em pedreiras, ou mesmo em fábricas que não
produziam mercadorias para exportação.
Da mesma forma,
estudos empíricos demostram que a imposição
de sanções comerciais aos exportadores pode causar
consideráveis perdas de produção, pouco fazendo,
ao mesmo tempo, para reduzir a poluição. Em vez de
impor normas ambientais pela via de acordos comerciais, o Banco
Mundial prescreve a liberalização do comércio
e outras reformas econômicas, que contribuam para corrigir
distorções de política econômica que
subsidiem a degradação do meio ambiente. Cita como
exemplo o caso de 12 antigas economias de planejamento centralizado
cujo uso de energia por unidade de produto diminuiu drasticamente
com a adoção do regime de livre mercado, em parte
graças ao aumento dos preços internos do petróleo
e derivados e à composição mais limpa da indústria
de transformação após a liberalização
do comércio exterior e dos preços. A intensidade energética
na China caiu 30% entre 1985 e 1997 quando as reformas pró-mercado
foram introduzidas.
'A comunidade
internacional tem meios mais eficazes do que sanções
comerciais para incentivar a melhoria de padrões laborais
e ambientais nos países em desenvolvimento', assume o relatório.
'Esforços para apoiar o desenvolvimento, como a assistência
cada vez maior a países que seguem políticas adequadas,
elevarão os padrões. Estimular maior abertura ao comércio
exterior e ao investimento estrangeiro direto facilitará
a difusão de tecnologia mais limpa que pode reduzir a degradação
ambiental e melhorar a produtividade do trabalho, promovendo, assim,
melhores padrões laborais', sustenta o Banco Mundial.
(Gazeta
Mercantil)
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