Entrar em um banheiro e notar que é preciso usar um cesto de lixo nunca foi problema para quem vive em São Paulo -ou em qualquer outro canto do país. Mas, para quem passou a vida toda evitando essa fadiga, lidar com o cesto é um choque.
"Isso é muito desconcertante e difícil para muitos estrangeiros. É quase tão impactante quanto ir para a Índia e não ter papel higiênico", diz o economista irlandês Kieran Gartlan, 46, que vive no Brasil desde 1994.
Ele é o criador do site Gringoes, uma comunidade virtual em que pessoas de todo o mundo tiram dúvidas e trocam experiências sobre a vida por aqui.
Embalada pelas listas de estrangeiros que circulam na internet, a sãopaulo convidou nove pessoas de várias nacionalidades que moram em São Paulo -e um paulistano que vive há sete anos em Portugal- para contarem o que há de estranho ou peculiar na cidade e nos costumes brasileiros.
Só no ano passado, até setembro, o Ministério do Trabalho concedeu 22.021 autorizações para que estrangeiros trabalhassem no Estado de São Paulo. "Só que os brasileiros não sabem que aqui é uma terra de oportunidades", diz a libanesa Aliah Khreiis, 37, sócia de um restaurante na região central.
Embora sejam bem recebidos, os que vêm tentar a vida por aqui sofrem com o barulho, com a burocracia e com os preços altos. "Obra e trânsito formam o casal mais paulistano de todos", brinca o modelo francês Baptiste Demay, 26. "Por outro lado, São Paulo é onde mais sinto boas vibrações e troca de energia entre o morador e a cidade."
Veja abaixo o que os estrangeiros dizem sobre a cidade:
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Vitor M/Projetor/Folhapress |
Sasha Yaklovena, 25, russa, jornalista
- Em São Paulo, no verão, poucas pessoas usam roupa curta e aberta. Em Moscou, homens e mulheres andam quase pelados!
- Na Rússia anoitece por volta das 22h30. No Brasil, às 20h já está escuro.
- Você tem que estar muito arrumado para entrar na balada em Moscou, senão pode ser barrado. Em São Paulo, mesmo nas baladas mais chiques, tem gente de jeans, tênis e camiseta
- Aqui as pessoas se ajudam. Dão informações na rua ou no metrô, seguram sua bolsa no vagão e ajudam a carregar a mala.
- A capital paulista tem ruas muito íngremes e cheias de buracos. Vejo mulheres de São Paulo usando salto só nos escritórios.
- O serviço nos restaurantes de São Paulo é excelente. Nunca vi tantos garçons gentis e sorridentes.
- Parques em São Paulo são feitos só para praticar esportes.
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Vitor M/Projetor/Folhapress |
Kieran Gartlan, 46, irlandês, economista
- Os brasileiros adoram tomar banho.
- As pessoas falam muito alto, ouvem música alta e buzinam em túneis.
- As crianças fazem o que querem aqui. Parece que os pais brasileiros têm problema em dizer "não" aos seus filhos.
- Os brasileiros escovam os dentes a cada refeição. A higiene dental não é tão importante na Irlanda.
- Aqui as pessoas não respeitam fila. É normal ver alguém passando na frente e ninguém falar nada.
- Em São Paulo, você pode sair à noite qualquer dia da semana e achar o que fazer.
- No Brasil existe o sistema de comandas nos bares. Na Irlanda, sai muito mais caro, as pessoas pagam rodadas para todos os amigos.
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Michelle Warmbier, 25, alemã, terapeuta de dança
- Tem muita gente com olhos da cor verde ou mel e com a pele meio escura. É uma combinação bonita que você não vê muito na Alemanha.
- As mulheres prendem o cabelo com o próprio cabelo fazendo um nó.
- Na Alemanha, jogamos o papel higiênico no vaso, não no lixo.
- Em São Paulo, você dá um beijo na pessoa quando a encontra.
- Sempre tem suco de laranja natural nos restaurantes e nas lanchonetes. É a melhor bebida do mundo!
- Aqui é muito comum que os filhos morem na casa dos pais até casar.
- Aqui a família tem prioridade muito alta. Lá, nem sempre.
- Os biquínis são muito pequenos. Particularmente a parte de baixo.
- Grafite aqui é arte e não só vandalismo. Que bom!
- Qualquer lugar no Brasil tem uma fila preferencial. As pessoas são muito atentas e educadas, sempre deixando passar na frente ou oferecendo um assento no metrô para quem está com um bebê no colo.
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Marina Pipatpan, 54, tailandesa, empresária
- Em São Paulo, sorriem pouco na comparação com a Tailândia, que é conhecida como "a terra dos sorrisos".
- Na Tailândia, cumprimentamos o outro colocando as mãos juntas em forma da flor de Lótus. Nada de beijinhos.
- Em São Paulo tem poucas frutas e comida sendo vendidas na rua.
- Aqui nem sempre se tira sapato quando se entra na casa de alguém. Na Tailândia, chegamos ao ponto de funcionários usarem chinelos fofinhos no local de trabalho.
- Os paulistanos falam muito alto. Os tailandeses, que sussurram delicadamente, não entendem por que tudo mundo berra.
- Quando recebo tailandeses, aviso que eles têm de tirar suas joias. Eles não entendem como é realmente perigoso.
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Vitor M/Projetor/Folhapress |
Baptiste Demay, 26, francês, modelo
- Aqui você pode ser convidado para ir a casa de alguém que não te conhece e ser bem recebido.
- A proporção de mulheres que entendem de futebol e que torcem com fervor para um time é maior que a proporção de homens do meu país.
- Vestir-se bem não é coisa de macho.
- A burocracia do meu país é bem louca, mas o Brasil fica em primeiro lugar. Tenho a impressão de ser o Asterix realizando um dos seus 12 trabalhos quando tenho que fazer qualquer serviço administrativo.
- Ver as babás (geralmente negras) vestidas de branco é chocante –é algo que remete à escravidão ou, ao menos, a uma regressão social.
- Comer de maneira saudável é coisa de rico aqui.
- As pessoas expressam muito mais os seus sentimentos, deixam saber o que elas sentem de bom sobre a outra pessoa. Às vezes, até demais. Acho legal. Os franceses e os europeus são mais frios e têm bastante a aprender com isso.
- Fazer tatuagem no Brasil é como trocar de cueca.
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Indra Barrios, 49, panamenha, professora
- O fato de as crianças fazerem bagunça me choca. Nos ônibus, é comum ver as mães em pé e as crianças sentadas nos lugares preferenciais.
- Fico abismada quando vejo quantidades monumentais de comida ou de carne nos almoços de domingo. Por que tanta comida? "Não pode nunca faltar. Pode sobrar, mas faltar jamais!"
- Brasileiras têm mania de limpar tudo com água sanitária: calçadas, casas, carros e, desconfio eu, até cachorros!
- "Está servido?" Sempre que alguém come algo, oferece para outra pessoa, mesmo que seja um completo estranho.
- Ainda me surpreende ver homens sem camisa nas ruas. Quando faz calor, os brasileiros não pensam duas vezes e tiram a camisa onde quer que estejam.
- Esse tal de palitinho após as refeições. Fico intrigada cada vez que vejo alguém com uma mão sobre a boca e a outra fazendo alguma coisa com o palitinho nos dentes.
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Zhen Zhang, 27, chinês, gerente de marketing
- No futebol, as pessoas não se importam só com o seu time. Se há um jogo, elas sentam e assistem à partida inteira.
- Não é possível sobreviver no Brasil sem um CPF. Não dá para ter nem um número de celular sem isso.
- Em muitos documentos, não basta a sua assinatura. Você precisa ir ao "cartório" para autenticá-la.
- Muita gente aqui é religiosa e é estranho para eles saberem que tem gente que não tem religião.
- Nunca vi tanta gente se beijando como no carnaval.
- É mais barato viajar aos EUA para comprar um computador do que comprá-lo aqui.
- Dá para pagar com crédito ou débito até em uma ilha.
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Melanito Biyouha, 43, camaronesa, dona de restaurante
- Aqui existem sobremesas. Na África, comemos frutas.
- O modo de cozinhar feijão aqui é diferente. Na África, ele tem muitos temperos, vai tomate e é bem seco.
- O Brasil é mais bonito do que nos documentários, que só mostram a parte ruim do país.
- No Brasil, a mulher participa das decisões da família. Na África, ela tem de ser só bonita e calada.
- Em São Paulo existem muitas invasões de prédios. Nunca tinha visto isso.
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Vitor M/Projetor/Folhapress |
Aliah Khreiis, 37, libanesa, sócia de restaurante
- A educação nas escolas é ruim e os brasileiros não sabem dos direitos que têm.
- A mulher aqui não nasce para ser dona de casa. É a melhor coisa do Brasil.
- Aqui você aprende a respeitar as diferenças.
- Aqui há muitas oportunidades de trabalho e de se crescer na vida.
- No meu país, há uma guerra declarada. Aqui ela parece que acontece escondida (se referindo às pessoas que vivem na cracolândia).
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Vitor M/Projetor/Folhapress |
Eduardo Cavellucci, 31, paulistano que mora em Lisboa, tatuador
- Em Portugal, as pessoas são desconfiadas, não interagem. A gente sempre será estrangeiro.
- Primeira vez em que fui a um banheiro de um bar apertado, escutei do garçom: "Só tomares atenção porque o autoclismo da sanita está avariado, epa!". Entrei no banheiro e procurei algo avariado. Aparentemente, nada quebrado! Puxei a descarga e a água não parava mais de de sair. O atendente do bar não poupou "elogios"!
- Os portugueses se arrumam mais, se vestem melhor.
- Vinte quilômetros km pro português é longe. 100 km é uma viagem.
- O transporte público português cumpre horário.
- Meu breve glossário do português de Portugal:
Autoclismo = descarga
Rotunda = rotatória
Comboio = trem
Nadador salvador = salva-vidas
Comando da TV = controle remoto
Fixe = legal
Faixa de travessia de peões = faixa de pedestre
Palinha = canudinho
Bué da fixe = muito louco
Os putos = as crianças
Casa de banho = banheiro
Bicha = fila
Cu = bunda
Rola = vagina, ha ha ha