O debute sempre é doloroso. Primeiro se sofre, depois se aproveita. Foi o que aprendeu a bailarina Mariana Gomes, 27, primeira estrangeira a integrar o corpo de baile do Bolshoi de Moscou. Seu primeiro espetáculo na companhia seria no Kremlin, e tudo ficou complicado.
"Eu não sabia ir, estava nevando e ninguém conversava comigo", conta. "Eu fui o Patinho Feio no Lago dos Cisnes'. O meu figurino caía e era o mais amarelado de todos", relembra a bailarina, que em 2015 se apresenta com o Bolshoi em São Paulo e no Rio de Janeiro –o programa deve incluir "Spartacus", de Aram Khachaturian.
O martírio de início é normal, diz Mariana, há nove anos na companhia. "Sofri mais, afinal eu era uma funcionária pública não russa."
Nascida em Belo Horizonte, mas criada em Salvador, Mariana começou no balé com sete anos. Aos seis, viu o Bolshoi na TV e se encantou. Os pais matricularam a garota em uma escola de balé do bairro e a mãe foi trabalhar ali para conseguir uma bolsa.
Mariana descobriu, com 14 anos, a Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, em Joinville (SC). A instituição havia recebido 1.700 currículos, fez testes com 470 bailarinos e selecionou 13. Destes, apenas quatro passaram da primeira semana de aulas.
"É um regime militar", conta Mariana. "De manhã, você estuda na escola normal e precisa ter as melhores notas –com menos de sete, o aluno é eliminado. Das 13h às 20h, tem aulas de balé."
Aos 18, Mariana foi convidada para um estágio de um ano na capital russa, somente para aulas. "Ninguém entendia o que eu fazia lá."
No fim do estágio, ela foi contratada. Hoje faz parte do corpo de baile e se apresenta em solos: já fez a Colombina de "O Quebra-Nozes", o solo da tabaqueira em "Carmen" e é o primeiro Cisne de "O Lago dos Cisnes". Recebe um salário básico (cerca de R$ 500) mais acréscimos, de acordo com os papéis em que atua.
De lá pra cá, a bailarina se formou em pedagogia em dança clássica pelo Instituto Russo de Teatro. E não é mais a única estrangeira ali. Nos últimos dois anos, o Bolshoi recebeu um norte-americano e dois brasileiros.
A rotina é puxada. Mariana chega ao Bolshoi às 10h para duas horas e meia de alongamento e aula. Ensaia até as 15h e tem tempo livre até as 18h, quando retorna para a sessão ou para outro ensaio, que pode ir até as 23h.
Dores no corpo e lesões (já feriu os dois joelhos e o ombro) são constantes. "Se você chegar em casa sem dor, é porque não se esforçou", diz.
Mas a fatiga compensa. "Conheci o ex-presidente Lula, a presidente Dilma... Já dancei em Londres, Japão Abu Dhabi, Nova York", relata.
RAIO-X
- Idade: 27 anos
- Peso: 49 kg
- Altura: 1,64 m
- Local de nascimento: Belo Horizonte
- Faz balé: desde os 7 anos
- Tempo de Bolshoi: 9 anos
- Função no Bolshoi: integrante do corpo de baile, também faz solos e é o primeiro Cisne
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