Totens da Paulista são o que sobrou de projeto criado há 40 anos

Com alguma dificuldade, os totens pretos da Paulista seguem cumprindo as funções para as quais foram instalados há 40 anos: servir como símbolos da avenida, orientar as pessoas que circulam pela via e reduzir a poluição visual ao juntar várias placas em um único lugar e mantê-las de forma organizada.

Porém, esses postes faziam parte de um projeto mais abrangente, que incluía totens azuis (pontos de ônibus) e verdes (para informar como chegar a outros bairros), e foi abandonado ao longo dos anos.

Tudo começou no início da década de 1970. A avenida Paulista, então com 80 anos, passava por uma grande reforma para ter seu leito ampliado e receber pistas expressas subterrâneas para carros. O primeiro trecho a ser entregue, e que ainda existe, fica entre as ruas da Consolação e Haddock Lobo.

Quando o então prefeito Miguel Colasuonno assumiu o cargo, em 1973, reviu as contas e percebeu que a prefeitura não teria dinheiro para acabar o trabalho. A saída foi terminar apenas o alargamento da Paulista e cancelar a pista subterrânea.

No entanto, após anos de obras, a prefeitura queria entregar algo a mais para compensar o cancelamento dos túneis. Surgiu então a ideia de investir em um projeto de paisagismo para a avenida, capaz de dar um visual moderno e, ao mesmo tempo, facilitar o seu uso.

A encomenda foi feita ao escritório dos arquitetos João Carlos Cauduro e Ludovico Martino. Alguns anos antes, eles haviam projetado as placas e a linguagem visual do metrô, incluindo o símbolo com as setas que apontam para cima e para baixo.

Os mastros foram pensados como uma forma de condensar em um só lugar todas as informações que pedestres e motoristas precisam saber ao circular pela avenida.

Na Paulista, havia esquinas nas quais até dez placas diferentes disputavam a atenção dos passantes com cores e tamanhos diferentes, gerando uma confusão desnecessária.

"Projetamos estruturas retas porque sua forma não atrapalha a visão panorâmica da avenida, como acontece com os postes encurvados. A Paulista é marcada por edifícios e os mastros seguem essa forma", explica Cauduro.

Os postes de 7,25 metros se dividem em partes: embaixo, ficavam informações para os pedestres (hoje fora de uso). No meio, as placas de trânsito, como "Proibido estacionar". Acima, o nome de cada rua transversal, escrito na vertical e em tamanho que pode ser lido a até cem metros de distância.

"Na época, cada manual falava uma coisa sobre padronizar placas. Fizemos nossos próprios testes até chegar ao que funcionou melhor", explica o arquiteto.

A fonte escolhida foi a Univers, fácil de ler e de ser aplicada. Nos anos 1970, o processo de montagem das placas era manual, feito letra a letra.

Uma das inovações foi informar o nome da próxima travessa, no totem do canteiro central, enquanto o da direita informa a rua atual, o que ainda gera alguma confusão entre os passantes.

Outra vantagem da estrutura é que ela pode receber mais ou menos placas de acordo com a necessidade, sem que seja preciso fincar postes novos.

MOBILIÁRIO

Além dos mastros, foram instalados bancos, pontos de ônibus e bancas de jornal, que eram modulados: onde fosse preciso colocar mais de um, era possível juntá-los de várias formas, como se fossem um tipo de Lego.

Nos anos seguintes, essa estrutura foi sendo trocada aos poucos, até ser quase totalmente removida no começo da década de 1990, na gestão de Luiza Erundina.

"Até então, havia uma equipe só para cuidar da avenida. Quando a tarefa foi repartida entre três regionais [depois transformadas em subprefeituras], perdeu-se a unidade, pois cada um cuidava de um jeito", comenta Cauduro.

Naquela época, a Paulista recebia as obras da linha 2-verde, que era prevista desde os anos 1970: a ideia era que os túneis passassem abaixo da via expressa.

Contrariando o projeto de paisagismo, as calçadas ganharam postes para placas diversas, como velocidade, o que confronta a ideia original.

Recentemente, os mastros pretos também foram usados para prender faixas e exibir caricaturas de Paulo Caruso, parte da mostra "Paulistanos Ilustrados".

Para Celso Longo, mestre em arquitetura e urbanismo pela USP, os totens são hoje um patrimônio abandonado. "O projeto subsiste sucateado pela falta de manutenção e de interesse pelas sucessivas administrações públicas", analisa em seu livro "Cauduro Martino - Design Total" (Cosac Naify, 164 págs.).

Depois da Paulista, Cauduro projetou outros sistemas de orientação urbana para cidades como Salvador, participou da elaboração da identidade visual do metrô de Buenos Aires e atuou na criação de marcas para mais de cem empresas, como Banco do Brasil e Riachuelo.

Na década passada, seu escritório fez um projeto para a avenida Pacaembu e outro que atualizava o projeto da Paulista, a pedido da então prefeita Marta Suplicy (PT). Os dois não foram implantados.

No ano passado, a prefeitura divulgou que, em conjunto com a obra da ciclovia, seria feita uma reforma na avenida Bernardino de Campos, que liga a Paulista ao Paraíso, para enterrar a fiação e instalar os mastros pretos também nessa via.

Agora, de acordo com a SPTrans, o projeto final não inclui a instalação de novos mastros, mas apenas o remanejamento daqueles que precisem ser retirados do caminho da ciclovia. A reforma da Bernardino de Campos está orçada em R$ 12 milhões.

Enquanto isso, Cauduro, que já soma mais de 50 anos de carreira, pensa em seguir longe de projetos para o setor público. "Agora só quero pintar e tocar piano."

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