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'A torcida organizada é o motor do jogo', diz gestor da Arena Corinthians

Gestor da arena Corinthians, Lúcio Blanco, 47, fala à sãopaulo sobre o estádio, a carreira e o futuro do clube e do campo em Itaquera. A arena foi a mais citada pelos entrevistados na pesquisa Datafolha.

sãopaulo - Quando e como começa sua história no Corinthians?
Faz 15 que eu cheguei no time. Na época, estava sendo iniciado um trabalho de olhar e tratar o torcedor como um cliente –era uma visão bem norte-americana. Entrei nessa área nova, voltada para o processo de venda de ingresso, de operação do evento como um todo, treinamento de equipe, segurança. Antes, o departamento financeiro tocava a venda de ingressos, o de segurança cuidava de segurança, e assim por diante, tudo dividido. E de lá para cá essas questões viraram peças-chave para o mercado do futebol.

E como tudo foi evoluindo mais ao encontro do que é hoje?
Foi um processo de mudança de cultura, educativo. O estatuto do torcedor entrou em vigor em 2003, mas o Corinthians iniciou um processo de venda de ingresso de forma antecipada em 2001. Ilustra bem como tudo era diferente. Foi num Campeonato Paulista, eram três dias de ingresso e dois pontos de venda (Parque São Jorge e Pacaembu), o resto era como Deus quisesse. Isso era uma coisa nova no Brasil. Para se ter uma ideia, a gente vendia cem ingressos nesses três dias. Aí, faltando uma hora para o jogo, vendiam 35 mil ingressos. Esse era o cenário. Também passou a haver orientação de torcida, porque a recomendação era de que o clube deveria fazer essa aproximação, esse contato, e não a Polícia Militar, que sempre acabou cumprindo papeis de interlocução com o torcedor que, na prática, não cabia a ela. Essa é uma responsabilidade de cada arena.

E o momento determinante para essa mudança cultural?
A partir de 2007, quando começamos a implantar a metodologia do Fiel Torcedor. Via de regra, contratava-se uma empresa terceirizada que cuidava de todo o processo da venda de ingressos. Então, percebemos que o Corinthians é que deveria executar todo esse processo. Hoje, a gestão é toda nossa, tanto a do Fiel Torcedor quanto a do torcedor comum. Posso dizer que chegamos a um modelo de sucesso, não exatamente porque sabíamos o caminho, mas por que fizemos ele a partir das muitas reclamações que recebemos. O projeto Fiel surgiu por necessidade de atender o torcedor de maneira mais digna, mais justa. Como deixar que aquele cara que acompanhou o time a temporada toda fique de fora de um jogo de maior apelo só porque ele não pode estar na bilheteria para comprar o ingresso? Eu sempre tive a felicidade, e é claro que não ignoro o ônus que isso às vezes me traz, de ter um contato com o torcedor corintiano. Então, pude melhorar processos identificando os erros de perto.

E que tal a conquista de território?
É extremamente gratificante. Ter sido o representante do time, da arena na Copa do Mundo, ter participado de um projeto dessa grandeza... Não tem como expressar com palavras. Mas, sinceramente, estou pensando mesmo é no muito que temos que aprender ainda. Depois de 30 jogos, precisa evoluir muita coisa, mas eu não tenho dúvida de que nós estamos no caminho certo.

Sobre arena, quando terminam as obras?
É um projeto muito detalhista, com a preocupação de se ter um complexo que se transforme, em dias em que não houver jogo, em centro de convenções, para receber feiras, seminários, festas de aniversário. E temos expectativa, trabalhando em conjunto com a construtora, de que em junho as obras estejam finalizadas, mas eu não sei precisar de 100%. A expectativa principal é não ter mais o cenário de obra na arena, com guindastes, coisas grandes. Depois disso, só acabamentos, com mais tempo e tranquilidade.

E o que falta na prática para ficar 100% pronta?
O foco principal é o prédio oeste, de 11 andares, que foi criado para receber eventos. São áreas de camarotes, centro de convenções. O oitavo andar, por exemplo, vai ser um camarote para 600 pessoas. No décimo, estão projetado dois restaurantes panorâmicos. São espaços assim que restam, e depois só vai faltar o acabamento.

E como isso vem impactando a operação em dia de jogo?
O atendimento que estamos fazendo hoje é semelhante ao que fizemos na Copa. Estamos isolando áreas não definitivas, que daqui até o final do ano devem ser finalizadas.

Então a arena ainda não foi ocupada para outros eventos?
Já, mas foi tudo bem pontual. Sediamos a final da Danone Nations Cup [em novembro de 2014], alugamos o nosso auditório para 300 pessoas. Mas ainda não geramos receitas consideráveis com esse tipo de evento.

E qual é o plano?
Hoje, existe uma área voltada somente para este segmento na arena. Temos duas pessoas experientes na equipe. Estamos finalizando o material de divulgação dos nossos espaços, uma tabela de valores, a variação do preço conforme a época do ano, mas ainda não dá para falar muito mais sobre. No dia de 16 de abril, o Corinthians apresentou ao mercado os seus camarotes e outros espaços que interessam principalmente ao empresariado, estamos em negociação com vários clientes, sondagens, orçamanetos, visitas agendadas, projetos de festas de quinze anos para 2016, mas nada fechado, por enquanto.

E sobre preços?
A negociação é sempre muito individualizada, mas falando por temporada, os espaços custarão de R$ 370 mil a R$ 900 mil.

E a utilização do campo?
O campo? O campo não, em hipótese alguma. O show... Pode ser, mas existe uma linha de pensamento, do Andrés Sanchez, do presidente Roberto de Andrade e da diretoria como um todo, a qual eu compartilho, que defende que a gente não pode montar uma estrutura de show dentro do campo. Esse campo tem uma grama de inverno, e embaixo dela existe uma tecnologia de refrigeração, drenagem a vácuo. Agora, ela reage bem porque o clima está mais frio, mas no verão, essa tecnologia não pode estar comprometida. Não compensa o risco de fazer um show, podendo danificar essa estrutura. Para shows, temos áreas de estacionamentos, que podem reunir 30 mil pessoas. Ou seja, podemos fazer show, mas não no campo de jogo. Isso não vai acontecer aqui.

Recentemente, o presidente disse que a ordem no Corinthians era economizar. A ordem também vale para a Arena?
Claro, por isso só montamos esse departamento de eventos em abril. Não fazia sentido abrir antes de a arena ter condições mínimas para um planejamento do tipo. Existe o cuidado de conter os gastos, sim, mas, tem outro foco: a receita da arena esta ficando num "colchão" para que a partir de julho a gente comece a pagar nossos compromissos. Só de manutenção, a arena custa R$ 2,5 milhões por mês.

Neste primeiro ano de arena, o que destacar?
O bom, que não é surpresa, é que mais uma vez vimos a força da torcida do Corinthians, com todas as dificuldades, tendo que se adaptar ao temporário dentro de sua arena, mantendo média de público de 31 mil pessoas, e taxa de ocupação acima 70%. Lembrando que, em grande parte desse período, a capacidade de público com que trabalhamos foi de 40 mil. O torcedor está orgulhoso da nossa casa nova, e está cuidando dela de maneira muito positiva. Começou a se adaptar, quebrou a barreira de que é longe. Hoje, já tem torcedor que no fim de semana prefere o metro ou o trem do que o próprio carro para vir aqui. Nesse sentido, é uma mudança cultural positiva. Ainda é preciso muito treinamento para a equipe, pois estamos falando de mais de mil pessoas trabalhando com o torcedor em dia de jogo: operações, alimentação, limpeza, segurança, administração predial. A cada dia, todos pegam mais confiança.

E os problemas, quais foram detectados e o que está sendo trabalhado?
Algumas coisas estão demorando mais do que a gente gostaria. Um foco específico está na melhora do atendimento na parte alimentação. Algo maior, é implantar no torcedor a cultura de chegar mais cedo ao estádio, mas reconhecemos que precisamos investir em outros atrativos, que não só o jogo. Por exemplo, atrações para crianças, que devem chamar algumas mães também. Acredito que o Campeonato Brasileiro vai ser bastante importante para a gente fazer essas experiências, mas não sei quando tudo estará funcionamento a pleno.

Que seria com os 47 mil torcedores?
É, ainda não trabalhamos com a capacidade máxima. E isso vai acarretar uma série de outros desafios. Vamos falar de quase 47 mil, não é preciso. Por exemplo, tem as determinações legais de segurança, que acabam suprimindo alguns lugares. Em contrapartida, tiramos as cadeiras do setor norte, onde fica a torcida organizada, e já apresentamos um estudo que nos permite acrescentar mais pessoas por lá, pois as pessoas assistem ao jogo em pé.

Existe um trabalho da arena junto às torcidas organizadas?
Já existia antes da Copa um consenso de que nós trabalharíamos as organizadas no setor norte da arena. Até porque, ainda que o torcedor não queira, e não por vandalismo, mas por mal uso, ele quebra cadeiras. Às vezes sobem em cima, às vezes batem um bumbo de forma repentina. A organizada é extremamente importante para o evento, é o motor do jogo. Sobre serem relacionadas à violência, o que eu digo é que eu tenho um bom relacionamento com elas. Não são um problema, o país sobretudo tem problemas sociais, isso sim. Dizer que o problema são as torcidas organizadas é muito simplista. Pensar assim não resolve, e ainda penaliza o cara de bem. Dá trabalho, mas não existe maneiras simplistas para problemas dessa natureza.

E o que você diria ao torcedor corintiano que já foi ou pretende ir à arena?
Minha tarefa sempre foi o relacionamento com o torcedor, comum ou organizado, então eu sempre digo que eles têm que se sentir parte do espetáculo. Falo: aproveitem, enquanto todos esperam um ano para fazer um Carnaval, o corintiano pode fazer 35 Carnavais por ano na arena.

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