Na Faria Lima, rádio-peão discute prisão do dono do BTG André Esteves

Ilustração Rodrigo Visca

Como todos os dias, rodinhas de executivos povoavam a avenida Faria Lima na hora do almoço. Só que, na quarta (25), as conversas aconteciam a meia voz e eram acompanhadas de um olhar vigilante sobre o entorno.

Apesar do zelo, frases como "Será que é corrupto mesmo?" deixavam transparecer o tema dos debates: a prisão, no âmbito da Lava Jato, do banqueiro André Esteves, dono do BTG Pactual, um dos maiores bancos de negócios do país. Ele é acusado de tentar obstruir as investigações.

"Se disserem que falei alguma coisa, eu nego. Temos que ficar neutros. E se o cara foi injustiçado?", conversavam dois colegas no ponto de ônibus em frente ao prédio 3.477, que abriga a sede do banco, na zona oeste.

Funcionários do BTG especulavam sobre a possibilidade de cortes após a repercussão das notícias. Ao meio-dia, um estagiário da empresa contava a um amigo que viu a Polícia Federal no escritório, onde o clima era tenso. A resposta do outro foi imediata: "Você sabe que o estagiário é sempre o primeiro a ir embora, né?". A frase foi seguida por um tapinha nas costas.

Em um restaurante próximo, um investidor mostrava-se preocupado. Ele mal tocava na sobremesa enquanto dizia para um colega estrangeiro que queria tirar dinheiro do BTG Pactual. "Ai meu Deus, ai meu Deus, vou transferir para qualquer outro lugar."

Em inglês, ele explicava que, dois anos atrás, Esteves era "the man, um modelo" no mercado financeiro. "Ele era de classe média, from Tijuca, formado em escola pública, not FGV."

O receio dos impactos sobre as aplicações virou a piada da quarta-feira na Faria Lima: quem ganhasse na Mega-Sena, cujo sorteio aconteceria naquele dia, já sabia o que não fazer: investir com André Esteves. "Ouviram essa? É ótima!", riam três homens de terno e gravata que fumavam na saída do trabalho.

No ponto de ônibus, um empregado do concorrente Credit Suisse falava que a fuga de investidores é esperada. "Você deixaria seu dinheiro num lugar que tem o CEO e dono preso? Eu não."

No mesmo ponto, um jovem com a mochila da instituição narrava pelo telefone o dia trágico. "O prejuízo foi de bilhões, o trimestre pode ter ido pro saco", repetia, quando embarcou rumo a Lapa.

A prisão já afetou os números da empresa, cujas ações chegaram a cair 38,9%. Na quarta, o presidente interino do BTG, Pérsio Arida, tentou tranquilizar os clientes e afirmou que o banco não é feito só de uma pessoa.

LÁ DENTRO

Ao deixar a avenida, centro financeiro da capital, a impressão era que se falava mais da prisão fora do banco do que dentro dele. Um analista de investimentos que não quis se identificar disse que o baixo escalão não tinha mais informações sobre a situação do BTG e que nenhum comunicado formal havia sido emitido.

"Sabemos só o que está na mídia. É até ruim para trabalhar, porque a gente fica no escuro. Pode ser que não dê em nada, porque é prisão temporária."

Segundo ele, a empresa funcionou normalmente, com exceção de movimentações da alta cúpula. Caso a crise se agrave, diz, pode haver uma reunião geral nos próximos dias. "Acho que é fogo de palha. Hoje foi ruim, mas tudo depende do que vai acontecer."

À tarde, engravatados com pastas do BTG circulavam no térreo do prédio. Um deles, com a camisa dobrada até os cotovelos, ficou 30 minutos ao telefone, gesticulando sem parar. Quando alguém se aproximava, abaixava a voz.

Para o analista que concordou em dar entrevista, a prisão de Esteves não foi uma grande surpresa. "A gente lia sobre as suspeitas desde janeiro."

O concorrente, do Credit Suisse, rebateu:"É muito estranho. Se esperasse que o chefe fosse ser preso, já teria saído". Ele deu de ombros e se despediu. Outro emendou a conversa: "Está esperando os figurões? Vai ficar a noite toda, ali vai até tarde". O relógio dava 20h30 e o ponto de ônibus estava quase vazio. Era o fim da quarta-feira, pelo menos do lado de fora do 3.477.

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