Família Roesler amplia seus domínios com galerias no Rio e em Nova York

Certa vez, Jack Welch visitou a Galeria Nara Roesler buscando obras para sua coleção de artistas brasileiros. O executivo norte-americano, ex-presidente da General Electric, deu um olhada no vaivém de funcionários e disse: "Esse negócio não pode dar certo, 'too much people' [há pessoas demais]". Bem, parece que Welch se enganou.

A galeria, que nasceu em Recife, mas funciona há cerca de 30 anos na avenida Europa, na zona oeste, vive um momento próspero. Em fevereiro deste ano, com a inauguração de uma unidade em Nova York, tornou-se a primeira galeria brasileira a ter uma filial fora do país —a empreitada é a segunda da marca, que em 2014 abriu um espaço em Ipanema, zona sul do Rio.

"Lá em Recife, um jornalista local tem o seguinte bordão: 'Rádio Jornal do Commercio, de Pernambuco para o mundo'. Eu brinco que é 'Galeria Nara Roesler, de Pernambuco para o mundo'", diz a própria, que, ao lado dos filhos mais velhos, Alexandre e Daniel Roesler, comanda o negócio que leva seu nome.

O início desta expansão começou com a chegada de Daniel à galeria, há 13 anos, quando deixou de lado a carreira de engenheiro, e, anos depois, de Alexandre, que há sete parou de se dedicar a outros negócios.

"O Daniel quis proporcionar mais autonomia para os setores da galeria, de forma que ela não dependesse exclusivamente da figura de nossa mãe", diz Alexandre. "Acho que se fizermos nosso dever de casa certinho em Nova York —afinal, o mercado americano é o maior do mundo—, temos chances de, daqui a alguns anos, termos uma operação americana maior do que a brasileira."

No ano passado, enquanto algumas galerias tiveram queda de 50% nas vendas nacionais, a Nara Roesler cresceu 10%. Para este ano, ainda não há previsão. "Janeiro e fevereiro foram meses mortos. Mas a SP-Arte será um bom termômetro. Geralmente, o período da feira é o melhor mês do mercado interno para as galerias", afirma Nara.

Neste domingo (10), a Feira Internacional de Arte de São Paulo, a maior da América Latina, encerra sua 12ª edição no Pavilhão da Bienal, no parque Ibirapuera. Além da SP-Arte, a galeria costuma participar de oito feiras ao ano, entre nacionais e internacionais. A venda nesses eventos representa quase 50% do faturamento dos negócios.

CONEXÃO RECIFE-SÃO PAULO
Além de contar com o clã Roesler, a galeria de São Paulo tem equipe de 20 pessoas que cuida, entre outras funções, do apoio aos artistas, da produção das exposições e do relacionamento com os clientes. O time carioca é menor, com quatro funcionários, e o de Nova York tem, por enquanto, apenas Alex Garcia, que dirige o espaço em terras estrangeiras.

"Até hoje, tenho que me segurar para não me meter em tudo", conta Nara. "Estou me educando", diz, rindo. Quando começou a ser galerista em Pernambuco, aos 23 anos, era ela a responsável por todo o trabalho —de organizar as mostras a abrir caixotes e fazer entregas. "Colocava a obra em cima da capota da minha caminhonete, segurava com uma mão e dirigia com a outra."

Idealizada dentro de sua casa, a galeria representava um só artista, o também pernambucano José Cláudio. "Foi um sucesso tão grande que resolvi abrir um espaço dedicado a isso. Eu era recém-casada [com o ex-marido, o arquiteto Alexandre Castro e Silva] e tinha o Daniel e o Alexandre ainda pequenos. A sala ficava cheia de brinquedos e eu tinha que guardá-los para receber as pessoas", diz Nara, que na época também tocava uma loja de design, onde chegou a expor obras dos irmãos Campana, ainda pouco conhecidos.

Mesmo depois de conquistar novos artistas, ela continuava concentrada em seus conterrâneos pernambucanos, representando nomes como Francisco Brennand e Gilvan Samico. Só depois, com uma ideia de "unir os Brasis", é que passou a trabalhar com artistas de outras regiões —como a nipo-paulistana Tomie Ohtake, o gaúcho Iberê Camargo e o goiano Siron Franco. Hoje, a galeria tem cerca de 2.000 obras em seu acervo (que custam entre R$ 1 mil e R$ 1 milhão) e reúne cerca de 40 artistas, entre nacionais, como Vik Muniz e Antonio Dias, e estrangeiros, caso do cubano René Francisco e do uruguaio Marco Maggi.

Se antes a escolha dos artistas dependia unicamente da intuição de Nara, hoje ela e os filhos formam um conselho curatorial que decide se um novo nome entra ou não. "Não nos consideramos uma galeria que aposta na descoberta do trabalho de um jovem artista. Há exceções, mas queremos ajudar quem já tem carreira mais estabelecida", diz Daniel.

Para ele, a Nara Roesler está entrando em uma nova fase. "Durante um bom tempo, nosso foco foi ajudar o artista a evoluir dentro de sua carreira. Claro que não vamos parar, mas como sentimos que esta parte está mais organizada, estamos começando a voltar o foco para os nossos clientes", diz.

"Lá na galeria, o pessoal do atendimento tem um briefing: quando chegar qualquer pessoa, tem que se levantar e falar um pouquinho sobre o que ela está vendo. Ninguém tem obrigação de saber de nada", explica Nara, que já chegou a convidar para entrar gente que estava espiando a galeria pela calçada. "Muitos ficavam agradecidos. Até hoje as pessoas não sabem como se comportar numa galeria de arte. Tem essa ideia de ser um tipo de templo, mas temos que desmistificar isso."

Hoje, ela diz que mais da metade dos clientes são pessoas que não conhecia. "É um prazer, porque eles vêm atrás do artista que represento ou da reputação da empresa que construí." No início do trabalho em Recife, não eram assim: a galeria recebia os amigos da família para ver "o que aquela menina estava fazendo". Seu avô foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco e seus pais eram colecionadores. "Eles tinham um open house de sexta a domingo que era frequentado por intelectuais, poetas e políticos", diz.

Apesar de gostar de receber convidados, a vida em sua casa é menos agitada. A exceção é quando está com os netos —são dez, oito meninos e duas meninas— ou quando o som de suas papagaias invade a casa. "Estava acostumada a morar com cinco filhos, né? Hoje, me sinto um pouco solitária, então as papagaias alegram. Quando boto o pé em casa elas já começam 'oi, oi.'"

A casa em que vive é um projeto do arquiteto Ruy Ohtake. Espalhadas pelo espaço há, entre outras, obras de Abraham Palatnik e Julio le Parc —arte óptica e cinética são suas preferidas. "Também moro dentro de arte. Antes eu vivia no Morumbi e tinha que atravessar a ponte para chegar ao trabalho. O Ruy dizia que precisava de passaporte para chegar até minha casa. Mudei-me para ficar mais próxima da galeria, que é minha vida", afirma Nara.

Quando não está imersa nos negócios, gosta de viajar para lugares exóticos e pouco povoados, onde não é necessário "performar". "Na minha profissão, a gente tem que passar o dia todo muito voltado para fora. Preciso restabelecer o contato comigo", conta. "Já fiz mais de 600 exposições na vida e vou lhe dizer uma coisa: cada uma é como se fosse a primeira. Fico numa ansiedade que não é normal."

Por ora, ao menos a ansiedade por novos passos está controlada —não há grandes mudanças em vista. "Até pensamos em ir para uma cidade na Europa, Londres, possivelmente, mas agora não. Temos que consolidar esse passo. Não fomos para Nova York para causar", diz.

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