Uma porta de garagem separa a Maria Farinha Cozinha da rua, nas proximidades do largo da Batata. Algumas mesas dispostas em espaço simples e informal são adornadas por delicados vasos de flores frescas. Um móvel robusto de madeira acolhe livros essenciais da cozinha brasileira, como o principal título de Câmara Cascudo. Um painel colorido, no qual se observa taioba, serralha, café coado, tem como elemento central e mais simbólico duas mulheres a mexer uma gamela de milho, prestes a virar farinha.
São detalhes, mas dão pistas do que se faz ali para comer: uma cozinha de veio caipira, feita com simplicidade e esmero, que tira do escanteio ingredientes comezinhos —e às vezes rejeitados, o jiló (cortado fininho, empanado e frito), o chuchu (que, marinado, enriquece uma salada), o quiabo (que, refogado, faz companhia ao arroz de costelinha).
Lisandra Amaral, 32, é uma cozinheira estudiosa. Vê encanto na pesquisa das tradições do Vale do Paraíba, que outrora encheu a mesa tão celebrada por Monteiro Lobato. Neta de um tropeiro e de uma quilombola, ela transporta um pouco do conhecimento que acumulou nas cidades interioranas nas quais morou para sua cozinha.
Ali surgem pratos que variam dia a dia (a R$ 29, com salada), eis um cardápio em constante mudança, que ainda não tomou forma —quiçá seja essa sua essência. Pode haver um ou dois a cada almoço, que se estende até o final da tarde, uma beleza, e vem na companhia de uma saladinha básica, mas caprichada. Um exemplo é a de folhas com feijão-andu firme, milho e vinagrete e um tempero agradavelmente ácido, recorrente em todas as saladas da casa, aliás.
Alberto Rocha/Folhapress | ||
Ambiente do Maria Farinha Cozinha, em Pinheiros |
Dos pratos, pode haver um baião de dois úmido, que mistura arroz (cozido na mesma água na qual cozinhou a carne-seca), feijão-fradinho, a própria carne-seca, que ganha graça e gosto com cebola e manteiga de garrafa, queijo coalho e coentro —ame ou odeie.
Há outras variações em cima do arroz, como o de pernil, desfiado e suculento, ou o de abóbora, que não emociona mas tem lá sua cremosidade e leva amendoim, que dialoga com a terra e dá crocância.
Imperdíveis são os bolinhos caipiras, disponíveis também à noite, quando há outras poucas opções de petiscos, como a moela refogada na cachaça servida com pão. Mentaliza: farinha de milho de sabor bem marcante, recheada com carne moída molhadinha e bem temperada, fritura sequinha, ao morder faz croc (R$ 23, a porção).
Das doçuras-não-tão-doces, sorvete de milho (ideia boa, mas foi servido cristalizado, R$ 10) e pudim bem delicado, só de leite, ovos, açúcar e uma calda também leve e rala (R$ 10). Um final feliz: café coado do Wolff (R$ 5,50) com um agrado, doce de leite puxa-puxa, aberto no tabuleiro para ser cortado.
O Maria Farinha é, pois, uma cozinha, simplíssima e sem formalidades, de uma só mulher —ela vai às compras, cozinha, atende, compartilha e alegra.
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Maria Farinha Cozinha
Onde: r. Padre Carvalho, 771, Pinheiros; tel. 3031-5496
Quando: de ter. a qui., das 12h às 18h; sex. e sáb., das 12h às 22h
Avaliação: bom