Dia dos Namorados: veja seleção de bares e restaurantes paulistanos para comemorar a data juntinho

Recebi da revista sãopaulo o pedido de fazer um roteiro de restaurantes para o Dia dos Namorados. Senti-me tentada a propor, porém, que fiquem em casa, cozinhem juntos, brindem, ouçam música, dancem e o diabo. Sentem-se à mesa, compartilhem os pratos, celebrem os encontros.

E então me vêm à lembrança as crônicas afrodisíacas de Isabel Allende, a autora chilena que sonhava em mergulhar numa piscina de arroz doce -e o creme delicioso a acariciar sua pele, escorregar entre suas dobras e encher sua boca, em suas palavras.

Depois de anos a sofrer pela morte da filha, ela se envolve em "Afrodite - Contos, Receitas e Outros Afrodisíacos". No livro, esgotado, relata a história de um encontro às cegas, em que uma amiga recebe um pretendente desconhecido, pinçado de um classificado de jornal, em sua casa, para lhe oferecer o jantar -antes de vê-lo.

"Ela esperava uma versão madura de Che Guevara, mas chegou uma réplica de Vincent van Gogh." Para não provocar "iniciativas indesejáveis em seu hóspede", recolheu as taças de vinho e "outras cortesias de praxe", evitou os sambas lentos e a luz de velas e o conduziu para a cozinha, para "preparar uma macarronada de última hora".

Ele, "cabelo cor de cenoura", "olhinhos de lebre", respirou, observou e se apropriou do espaço. Com elegância e firmeza, "retirou suavemente o avental de suas mãos, amarrou-o na própria cintura e instalou-a em uma cadeira". Apanhou alguns ingredientes da geladeira e "com graça e destreza inesperadas fez as facas dançarem partindo verduras e mariscos para dourá-los com mão leve em azeite de oliva".

O aroma que surgia da frigideira produziu nela "uma crescente excitação, sentiu que gotas de suor deslizavam pelas suas costas, que suas coxas umedeciam-se e ficava com água na boca".

Eis que, quando a travessa fumegante foi posta à mesa, ela "suspirou vencida". Resgatou o "vinho francês, apagou a luz, acendeu as velas e colocou o samba lento brasileiro no toca-discos". Ela estava, a essa altura, diante de um homem viril, de costas largas e serena concentração.

PARA JANTAR FORA

Bem, ainda que cozinhar no aconchego do lar seja a minha recomendação de pessoa física, como pessoa jurídica me ocorre uma seleção de bons balcões pela cidade -não particularmente românticos, mas capazes de aproximar.

Às vezes a privacidade pode ser ferida, mas compensa o sabor de abocanhar receitas lado a lado. Pode-se falar ao ouvido ou silenciar e observar o trabalho dos cozinheiros, quiçá também inspirador.

No Mica, uma portinha nos arredores do largo da Batata, o espaço é ocupado por um balcão estreito, do qual se podem pedir ardentes receitas tailandesas, cervejas orientais e drinques com elementos como wasabi.

Há mais conforto nas poltronas da Casa do Porco, a rodear o bar, e lá pode-se pedir um menu "de tudo um porco". Chega aos bocados, em bom ritmo, e também instiga ▸
a imaginação -a começar pelo clássico da casa, um torresmo de pancetta, com naco suculento de carne e superfície crocante, coberto com goiabada cremosa, a combinar agridoce, picância e acidez.

Do balcão do Ema, em charmoso ambiente à meia-luz e música alta, espia-se de perto o movimento sincronizado da cozinha. E de lá saem preparos fumegantes como a costela assada por oito horas, que desmancha ao toque do garfo, e o fideuá de frutos do mar, aquela massa curta e fininha embalada em molho cremoso e intenso.

Antecedem, pois, sobremesas sensuais como o bolo quente e mole de doce de leite, que escorre ao ser tocado.

Não diria que há romantismo no balcão do novo Barú Marisquería, numa vila na rua Augusta. Mas se quiser comer bons peixes e frutos do mar em porções a serem compartilhadas e pagar preços contidos por elas, os feitos do chef Dagoberto Torres são intensos e fogem do senso comum, uma experiência.

Para um drinque, na companhia dos pratos substanciosos de Henrique Fogaça, o balcão do Jamile, que circunda a cozinha em um salão moderno e contrasta com a antiga vizinhança do Bexiga, é uma boa ideia.

Não falham os bons e (nem sempre) velhos balcões japas. São diferentes entre si -e todos valem a pena. No Jun Sakamoto, luz branda, jazz e aquela alegria de sentir grão a grão do arroz do sushi. Na Liberdade, pode-se ver o balé que os flocos de peixe seco fazem sobre o takoyaki (bolinho de polvo) do pequeno balcão do Izakaya Issa. Ficam em movimento, como se estivessem vivos.

Para os lados do Paraíso, senta-se ao balcão do Yorimichi para comer os caprichados preparos do craque Ken Mizumoto na brasa de carvão -mas não só. Boa amostra de bebidas japonesas pode estimular. Que o estômago e o amor sigam, pois, a governar o mundo, como dizia o poeta alemão Friedrich Schiller lá no século 18.

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PARA CELEBRAR

Barú Marisquería
R. Augusta, 2.542, lj. 5, Cerqueira César, região oeste, tel. 3062-0898

A Casa do Porco Bar
R. Araújo, 124, República, região central, tel. 3258-2578

Ema
R. Bela Cintra, 1.551, 2º andar, Consolação, região oeste, tel. 98232-7677

Jamile Restaurante
R. 13 de Maio, 647, Bela Vista, região central, tel. 2985-3005

Jun Sakamoto
R. Lisboa, 55, Cerqueira César, região oeste, tel. 3088-6019

Izakaya Issa
R. Br. de Iguape, 89, Liberdade, região central, tel. 3208-8819

Mica
R. Guaicuí, 33, Pinheiros, região oeste, tel. 3360-2608

Yorimichi
R. Otávio Nébias, 203, Paraíso, região sul, tel. 3052-0029

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