HOME | NOTÍCIAS  | SÓ SÃO PAULO | COMUNIDADE | CIDADÃO JORNALISTA | QUEM SOMOS


REFLEXÃO


Envie seu comentário

 

urbanidade
19/01/2005
Escola dá vida

Ivete Mitiko tem uma dúvida inusual para quem trabalha há 35 anos em escola pública enfrentando as mais diversas dificuldades: não sabe quando vai se aposentar nem se quer pedir a aposentadoria. "Comecei a pensar que talvez eu sempre vá estar no meio de alunos."

No início da década de 90, ela já tinha desistido e planejava parar de trabalhar. Não suportava mais as carências da educação pública. "Estava cansada, tinha perdido a paciência." Era diretora de uma escola estadual (a Rodrigues Alves) na avenida Paulista, que, além dos problemas do dia-a-dia, estava repleta de vazamentos e pichações; os cupins iam-se apossando do espaço. Mitiko tentava em vão que se fizesse uma reforma no prédio, tombado pelo patrimônio histórico. "Sempre diziam que não havia dinheiro."

Decidiu tentar, pela última vez, realizar a reforma quando sentiu que seus vizinhos, muitos dos quais poderosas empresas, se apiedaram daquele imponente prédio - única escola pública em toda a avenida Paulista - que estava caindo aos pedaços. "Preferi esperar um pouco."

Graças ao apoio de um banco, saiu a reforma da fachada e, neste ano, preparam-se as melhorias internas. Empresas decidiram apoiar melhorias do currículo, capacitar professores e envolver os pais. Institutos culturais da vizinhança ofereceram atividades extraclasse aos alunos. Estudantes da faculdade Casper Líbero dispuseram-se a ajudar a Rodrigues Alves a montar seu próprio jornal.

A escola se tornou uma das referências de integração da comunidade com a educação pública na cidade de São Paulo. "De repente, eu me senti dentro um laboratório." Afinal, a riqueza da avenida Paulista, com seus museus (Masp, por exemplo), teatros, cinemas e centros culturais, passou a ser vista como uma extensão da sala de aula.

Diante dessa mobilização, Mitiko acabou, no ano passado, virando aluna. Começou a fazer um curso de pós-graduação em pedagogia comunitária, estudando experiências realizadas dentro e fora do Brasil por escolas que transformam seu bairro ou sua cidade em espaços de aprendizagem. "Eu me vi aprendendo, ao mesmo tempo, na faculdade e na escola da qual eu sou diretora."

Lição: depois de 35 anos de magistério, ela aprendeu que a melhor forma de gostar de lecionar é sentir-se sempre uma aluna.

Coluna originalmente publicada na Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

COLUNAS ANTERIORES
16/01/2005
Criança não é brincadeira
12/01/2005
Emprego da onda
01/01/2005
É um crime
09/01/2005 Férias inesquecíveis
05/01/2005 Para sempre
02/01/2005
Porque São Paulo merece uma festa
29/12/2004
As aulas práticas de Nathalia
28/12/2004
Lula foi bem, de novo
26/12/2004
A escola que descobriu o espírito de Natal
22/12/2004
Procura-se um mapa