REFLEXÃO


Envie seu comentário

 
 

urbanidade
22/08/2007

Mestre adolescente

Greicy Karla de Faria aprendeu a dar vida a uma escola, misturando os currículos com os saberes locais


A adolescente Greicy Karla de Faria já sabe o que fazer da sua vida profissional: ser professora. Antes de entrar na faculdade, ela entrou involuntariamente em um curso prático sobre como salvar uma escola em estado terminal -e dessa lição sai como uma professora precoce.

Ameaçada de fechamento, a escola pública em que ela estuda arrastava-se numa crise, visível por todos os cantos: alunos em debandada, paredes sujas, desânimo dos professores. Salas de aula vinham sendo entulhadas com material de arquivo. "Eu já estava procurando outro lugar para estudar", conta Greicy. No começo deste ano, integrou um grupo de alunos, ex-alunos, pais e professores dispostos a fazer uma última tentativa para evitar o fechamento da escola estadual Carlos Maximiliano (mais conhecida como Max), em Pinheiros (zona oeste de São Paulo). "Parecia uma causa perdida. A cada dia, mais espaço era tomado para servir de depósito."

Saíram batendo de porta em porta à procura de ajuda por todos os lados -assim, quem sabe, conteriam a debandada dos alunos. Um dos primeiros gestos foi, em mutirão, pintar os muros com cores fortes e alegres. Professores se dispuseram a criar um plantão de dúvidas para recuperar os alunos em português e matemática. Jovens aceitaram ler textos clássicos adaptados ao cotidiano. Especialistas em comunicação montaram programas para o laboratório de informática. Nas salas vazias, ocorrerão agora oficinas de cinema, de dança e de "customização" de roupas. Com doações, um galpão usado como depósito está sendo reformado e se transformará em um teatro também aberto à comunidade. Atores poderão usá-lo desde que façam do palco uma extensão da sala de aula e ajudem a enriquecer o currículo tradicional. Uma orquestra jovem de música erudita já avisou que fará, naquele teatro, concertos abertos para estimular a descoberta de talentos.

Ainda não se sabe se todo esse esforço vai surtir efeito, se os alunos voltarão e, mesmo que voltem, se haverá melhoria de desempenho. Mas, diante de todo esse esforço, a secretária estadual da Educação mandou avisar, no mês passado, que não há intenção de fechar o Max. "Mudou nosso ânimo." Além do ânimo, melhorou a perspectiva de Greicy. Ela foi seduzida pela idéia de ser professora quando, nas férias, deu oficinas de arte a alunos de escolas públicas e, depois, foi monitora em um programa de circo. Com o Max, aprendeu a dar vida a uma escola, misturando os currículos com os saberes locais -é algo que muita gente com pós-graduação só conhece pelos livros.

O melhor estímulo, porém, foi bem mais concreto. Um empresário soube do envolvimento de Greicy no grupo que salvava a escola e ofereceu-lhe uma bolsa para estudar pedagogia.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
 
 
 

COLUNAS ANTERIORES:
21/08/2007
Escola de medíocres
20/08/2007
A revolta dos medíocres
15/08/2007
Love story
14/08/2007
Alckmin, Marta e o trampolim
13/08/2007
Por que nos sentimos órfãos
08/08/2007
A escola da solidão
07/08/2007
Você não cansou?
06/08/2007
A celebridade das três mortes anônimas
01/08/2007
"Muro das Memórias"
31/07/2007
Serra terá coragem?
Mais colunas