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história de vida
11 /05/2005

Problemática do trabalho infantil é retratado em livro

Os livros infanto-juvenis que lotam as prateleiras das livrarias brasileiras trazem um mundo de sonho e imaginação, repleto de contos de fadas e super-heróis invencíveis. Mas, toda regra tem sua exceção. O escritor Guto Lins vai além e, com poesia, retrata a vida de milhões de crianças que vivem pelas ruas do Brasil e são obrigadas a trabalhar para sobreviver. O livro "Zezé: Trabalho não é Brincadeira!" (Editora Larousse do Brasil) traz, em pequenos poemas, aquela criança que vende bala no semáforo, flor nas portas de bares, de madrugada, e até faz malabarismos para "distrair" os motoristas que aguardam o sinal verde. Tem ainda aqueles Zezés que precisam se sustentar porque foram abandonados pelos pais, fugiram de casa, ou que, com o pouco que recebem, ajudam os pais desempregados.

Logo na dedicatória do livro há uma homenagem a um "Zezé" que Guto Lins conheceu em janeiro nestas "coincidências" da vida, em que todos tropeçam um dia. Num domingo à tarde passeando com a família numa praça do Rio de Janeiro, o autor conheceu o garoto Patrick, com cerca de oito anos, e que dizia viver na favela Vigário Geral. "Já estava escuro e ele não tinha casa para voltar e nem dinheiro do ônibus. Talvez, não tivesse nem pai e mãe. Lá estava um caso clássico de Zezé. Durante meia hora de conversa com ele, coloquei o meu pé no chão", recorda.

E Zezés, é o que não faltam pelo país. De acordo com os Indicadores Sociais divulgados pelo IBGE, em 2003 havia cerca de 5,1 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalhando. Em particular, 1,3 milhão de crianças entre 5 e 13 anos de idade se encontravam ocupadas, um contingente que corresponde, aproximadamente, à população do Estado de Tocantins. Em média, o rendimento das crianças e adolescentes de 10 a 17 anos de idade contribuía com cerca de 17% do rendimento familiar total. Já 38% das crianças e adolescentes ocupados não recebiam remuneração pelo seu trabalho.

Na faixa etária de 10 a 15 anos, essa proporção era ainda maior (53,2%) e chegava a 64,8% no Nordeste. Nas áreas rurais, o trabalho precoce era mais acentuado do que nas áreas urbanas. De 1,8 milhão de crianças de 10 a 17 anos ocupadas nas áreas rurais, 37,6% começaram a trabalhar com menos de 10 anos de idade. O trabalho infantil é proibido pela Constituição Federal até os 16 anos, exceto na condição de Aprendiz.

Guto Lins, é designer gráfico e autor de mais 15 obras, entre elas a série infanto-juvenil Família (Brinque-Book) e "Manual de Boas Maneiras" (Jorge Zahar), conta que o poema surgiu há mais de quatro anos como uma leitura sua como cidadão a partir da observação da situação dessas crianças nas ruas das grandes cidades. "Não tem como passarmos impunemes por essa realidade. Não há como não se preocupar ou se emocionar. Faz a gente pensar: 'eu assumo minha culpa nisso também'. Minha válvula de escape foi escrever. Mas, percebi, que aquele texto não podia ficar somente comigo. Tinha que virar algo", explica Guto Lins.

Apesar de ser um tema complexo e complicado de se tratar numa publicação infantil, Guto ressalta que o livro foi todo trabalhado para não trazer lamúrias, tristezas e não ser panfletário, levantando qualquer bandeira. Ele traz essa questão para o universo infantil de forma mais lúdica, transformando Zezé num personagem universal, menino ou uma menina, de qualquer lugar do mundo. A preocupação foi a de não remeter à violência presente na vida dessas crianças e adolescentes que perambulam pelas ruas, e mostrar sim que todos têm direitos e, por isso, merecem ter uma infância digna. "Tentei tirar a imagem dessa criança como agente da violência, mas sim como fruto dela", comenta.

Por isso, além da atenção especial à forma do texto, as ilustrações que estampam as páginas da publicação também foram cuidadosamente pensadas. Guto Lins trabalhou as imagens a partir de desenhos que o filho dele, João Lins, de 5 anos, fazia na escola. O designer produziu ainda outras ilustrações com desenhos que ele mesmo fez usando a mão esquerda para ficar mais parecido com desenhos infantis. O autor explica que a idéia era misturar a visão do adulto e da criança que norteia todo o livro e não estabelecer uma faixa etária específica.

O autor afirma ser ainda uma incógnita a recepção das crianças para o tema, mas já vê dentro da própria casa os resultados desse contato direto com o livro. O filho João hoje levanta questões sobre a situação daqueles Zezés, e pergunta ao pai o porquê das crianças dormirem nas ruas ou não estarem na escola. A idéia de Guto é sensibilizar mais os adultos, afinal, são eles normalmente os responsáveis por escolher e comprar os livros que seus filhos irão ler.

"A criança ainda não tem a dimensão de entender o porquê do trabalho infantil, só vê o resultado final. Mas o adulto convive com essa questão complexa há muito mais tempo. É evidente que qualquer obra literária tem esse poder de sensibilizar para o tema que se propõe. Assim, se esse adulto tentar pelo menos resolver o problema daquela criança que vive ali na esquina da sua casa, já foi algo bom do livro". Mas é na escola que Guto Lins acredita que a publicação "Zezé: Trabalho não é Brincadeira!" ganhará dimensão e impacto maiores, pois será possível promover um trabalho pedagógico sobre o tema e ampliar a reflexão a respeito do trabalho infantil, gerando um resultado multiplicador dessas discussões muito mais amplo.

DANIELE PRÓSPERO
do site setor3

   
 
 
 

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