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Walter von Wartburg diz que introdução de organismos modificados foi muito rápida

Ex-executivo suíço critica estratégias de comunicação
de multinacionais


GUILERME WERNECK
DA REPORTAGEM LOCAL


Mesmo com opinião favorável ao cultivo de produtos transgênicos, o professor para políticas de saúde pública na Faculdade de Economia, Negócios e Administração Pública de St. Gall e ex-chefe do departamento de Comunicação Corporativa da multinacional Novartis, Walter von Wartburg, 61, acredita que o processo de introdução dos alimentos geneticamente modificados foi conduzido num ritmo mais acelerado do que o ideal.
Autor do livro “Gene Technology and Social Acceptance” (Tecnologia Genética e Aceitação Social, University Press of America, 1999), Wartburg diz que empresas falharam ao direcionar seus esforços de marketing para o agricultor, desconsiderando o consumidor final.
Leia abaixo trechos da entrevista que concedeu à Folha, por telefone, de seu escritório, na Basiléia, na Suíça.

Reprodução
Von Wartburg, que já trabalhou para a Novartis
Folha - O senhor é a favor do plantio e da comercialização de transgênicos?
Walter von Wartburg -
Sou a favor das comidas geneticamente modificadas desde que elas sejam disponibilizadas de forma que haja aceitação por parte da sociedade. Não quando isso é feito de uma maneira impositiva. O que significa introduzir esses alimentos no mercado de uma maneira muito mais lenta do que tem ocorrido.
Folha - O senhor acredita que as empresas de biotecnologia escolheram uma estratégia errada ao lançar produtos geneticamente modificados?
Walter von Wartburg -
Com certeza a resposta é sim.
Folha - Por que o senhor pensa que elas se enganaram?
Wartburg -
Por duas razões. Em primeiro lugar elas não perceberam que o seu cliente final era o consumidor e não o agricultor. Elas direcionaram todo o marketing e as informações para a pessoa que estava comprando as sementes, mas não para os verdadeiros clientes, impedindo que eles pudessem formar uma opinião própria. O segundo motivo foi terem impingido ao consumidor os transgênicos ao não rotular os alimentos que contivessem OGMs. Na Europa em especial os consumidores não gostaram disso. Eles queriam mais informações e simplesmente se recusaram a comprar transgênicos .
Folha - Em que estava baseado o marketing para o agricultor?
Wartburg -
As empresas disseram aos agricultores que se usassem sementes transgênicas eles teriam, no final, um retorno mais vantajoso dos investimentos. Para fazendeiros esse era um bom argumento.
Folha - E mesmo os fazendeiros europeus passaram a comprar as sementes?
Wartburg -
Sim, inicialmente houve algumas vendas. Mas depois, quando eles perceberam que teriam dificuldades em vender as safras por causa da resistência dos consumidores, obviamente a situação se tornou muito mais difícil.
Folha - Por que os organismos geneticamente modificados enfrentaram tanta resistência da sociedade quando uma tecnologia semelhante, a terapia genética, parece não causar tanto medo nas pessoas?
Wartburg -
Comida é uma espécie muito particular de mercadoria. Há uma série de conotações emocionais ligadas à percepção dos alimentos, e contaminação alimentar é uma grande prioridade na Europa. De repente, modificação genética passou a significar que a comida estava contaminada. No Reino Unido houve muita propaganda sobre os OGMs, que foram rotulados de “comida Frankenstein”. Se o público não tivesse sido exposto aos OGMs sem ter tido oportunidade de escolha, acredito que a situação poderia ter sido contornada diferentemente.
No que diz respeito à terapia genética, as pessoas a relacionam a benefícios. Prevalece a idéia de terapia como algo bom e que gera resultados positivos, enquanto os organismos geneticamente modificados não trazem nenhum resultado positivo para o consumidor final.
Folha - O senhor mencionou fatores emocionais que levam as pessoas a desqualificar os OGMs. Em seu livro “Gene Technology e Social Acceptance”, o senhor lista fatores racionais e emocionais para a não-aceitação de uma nova tecnologia. Quais são eles?
Wartburg -
Quando você faz um balanço entre benefício e riscos_ como acontece o tempo todo na vida_, você tem de um lado argumentos racionais e objetivos e, de outro, fatores emocionais. Você se pergunta: “será que eu tenho informações suficientes?”, “será que eu desconfio dos riscos potenciais desses alimentos?” ou “será que eu estou sendo uma cobaia?”. Isso é muito emocional. Você não pode dizer, em termos racionais, sim ou não. Enquanto as pessoas contrárias aos OGMs sempre brigaram nessa frente emocional, as indústrias usavam argumentos muito racionais. Diziam: “Nós não temos nenhuma prova científica de que transgênicos causem algum mal”. Penso que com o tempo eles aprenderão a jogar mais com o lado emocional.
Folha - As empresas de biotecnologia usaram a tática de desqualificar os críticos?
Wartburg -
Sim, mas uma vez que você começa a atacar o seu crítico, você passa a ser percebido como alguém que não tem argumentos suficientes. Isso é sempre muito ruim.
Folha - Quais são os principais riscos da tecnologia genética?
Wartburg -
Com base nos estudos científicos a que tive acesso, eu não vejo nenhum perigo. Mas há uma diferença entre perigo e risco. Risco é algo que daqui a dez anos, baseado no princípio da precaução, você não pode excluir. Por um lado, você tem uma declaração científica que mostra que não houve danos observados em nenhum lugar do mundo, mas, por outro, há o questionamento de como saberemos o que acontecerá daqui a dez anos.
Folha - Alguns pesquisadores dizem que se os transgênicos parassem de ser plantados agora, as florestas seriam devastadas porque as pessoas não teriam o que comer. O senhor acredita que isso está certo?
Wartburg -
Muitas das pessoas que são a favor da conservação das áreas e dos animais selvagens estão do lado dos biotecnolólogos e de uma tecnologia que permite produzir mais comida na mesma área. Mas dizer que daqui a cinco ou dez anos se você não usar a biotecnologia irá haver mais devastação é nonsense.


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