Conheça a pintora francesa que trocou Paris por São Paulo e vive com charme no centro

Adriano Vizoni/Folhapress
Nathalie Morhange em seu apartamento na avenida Rio Branco com as gatas Mimi e Lili
Nathalie Morhange em seu apartamento na avenida Rio Branco com as gatas Mimi e Lili

Nathalie Morhange abre a porta do apartamento na avenida Rio Branco já esperando a reação da visita. O olhar espantado de quem entra ali pela primeira vez é conhecido da dona da casa. Ela se afasta e dá espaço para que se explore direito os 230 m² de área do imóvel, mais 70 m² da varanda.

É isso mesmo? Em pleno centro de São Paulo, ela tem uma varanda ensolarada com árvores frutíferas? E uma cozinha de fazenda? Uma mesa de jantar pintada à mão, com ilustrações delicadas que lembram figuras mitológicas, em preto e branco, está em uso irrestrito para apoiar cinzeiros (sim, ela é francesa e fuma cigarros em profusão), xícaras e copos? "Aprendi que as coisas são para usar, não é porque custou caro ou deu trabalho que têm de ser intocáveis."

Melhor assim. Tudo ali é exclusivo, transado, cheio de personalidade. E foi escolhido a dedo por Nathalie, quando não feito por ela mesma. O tapete do quarto ela resgatou de uma caçamba no Morumbi e decorou com pintura geométrica. Os azulejos nos banheiros foram moldados, assados e esmaltados por ela. O móvel de minigavetinhas era de uma antiga loja de material elétrico das redondezas. A própria mesa de jantar, que ela demorou uma semana para pintar, era mobiliário da sala da tia de alguém.

É no meio dessas raridades que Nathalie recebe amigos o tempo todo, para pequenas reuniões ou grandes festas, neste que é seu endereço há três anos.

A varanda é obra da paisagista Mariana Castilho. "Falei para ela que queria uma bagunça, nada muito arrumadinho, com muitos tons de verde, árvores que dessem frutas e plantas que não morressem nunca".

Pés de jabuticaba, pitanga, acerola e romã crescem ao lado da horta com tomilho, louro, alho-poró, manjericão e outras ervas.

Nathalie, 59, cozinha bem, mas seu hóspede, o arquiteto Alvaro Razuk, ex-namorado que virou grande amigo, cozinha ainda mais. "Ele me liga do sacolão de Higienópolis para perguntar o que eu quero para o jantar", conta a pintora.

As outras moradoras da casa são duas gatas sem raça definida, Mimi e Lili. Na área interna do apartamento, a que se tem acesso via passarela florida com piso de caquinho vermelho, ficam o quarto de Nathalie, seu ateliê particular e o quarto de hóspedes, habitado há um ano por Alberto. No andar de cima mora Helena, a vizinha pianista de 7 anos de idade, que toca como profissional e faz parte da trilha sonora.

"Quando ela começou a ter aulas, comprei um piano para estudarmos juntas. Mas ela avançou tão rápido que desisti", conta. Nathalie conhece todo mundo no prédio. "Logo que me mudei para cá me convidaram para um churrasco com todos os moradores. Tem gente que nasceu aqui, outros cujos avós compraram o apartamento na planta."

Nathalie nasceu no sul da França, em Aix-en-Provence, em uma família cheia de artistas. Um tio pintor era amigo de Picasso (ela diz "Picassô"). Formou-se na melhor escola de "trompe l'oeil" (técnica de pintura artística que cria perspectivas e ilude o olhar do espectador) do planeta, que ficava na Bélgica -o diploma está pendurado no lavabo-, trabalhou com teatro e cinema até se tornar parte de uma equipe de 15 pintores-decoradores que executavam projetos pelo mundo.

Veio fazer uma casa em São Paulo 30 anos atrás, apaixonou-se pela cidade e decidiu vir morar aqui com a filha única, Heloise, que, na ocasião, era criancinha.

Hoje com equipe própria e ateliê no Bom Retiro, também na região central paulistana, segue fazendo pinturas exclusivas para decorar casas e fazendas incríveis.

Seus clientes são tão poderosos e privados que ela prefere não citar. Certa vez, passou dois anos trabalhando na mesma casa, no Jardim Guedala, zona sul de São Paulo, para executar 2.000 m de pintura.

"Pintamos até as cortinas", conta. "Cada casa é pensada para ser única. Esse tipo de público não quer ver em nenhum outro lugar o que tem na casa dele", explica. "Genial na minha profissão é que nunca faço duas vezes a mesma coisa." E genial na vida dela é ser ao mesmo tempo uma profissional tão sofisticada e essa pessoa tão divertida.

*

Publicidade
Publicidade