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24/02/2006
Carta da semana

Por dentro da Escola Pública

“Somos pais de duas meninas gêmeas de quase sete anos de idade e que ingressaram esse ano no Ensino Fundamental. Por decorrência de atropelos na nossa vida tiveram que ingressar na escola pública.

Inicialmente ficamos desesperados, o que fazer para encarar o ensino público de que tanto falam mal, depois pensamos, talvez até para nos convencer (porque não havia outro jeito, mesmo), que podia ter o seu lado positivo, pois encarar as coisas como elas são realmente só podem trazer crescimento para as crianças. Afinal de contas, também estudamos em escolas públicas e com muito orgulho! Além disso, nossas filhas já estão praticamente alfabetizadas, fizeram uma pré-escola muito legal e possivelmente não teriam nenhuma dificuldade! Mas, não está sendo tão simples. Os problemas que estamos encarando são bem maiores do que esperávamos, e olha que não esperávamos boa coisa!

Optamos pela escola estadual porque precisamos trabalhar o dia todo, acreditamos na proposta interessante do nosso governador Geraldo Alckmin em implantar a Escola Tempo Integral. O projeto é maravilhoso, aulas de filosofia, informática, educação física, dança, teatro, música. Além, é claro, da grade curricular, tem até relaxamento para a criançada.

Primeiro dia de aula: a professora falta (estava fazendo um curso), assume uma substituta. Ela estava desesperada, sem saber o que fazer com as 45 crianças da 1ª série. A diretora chega atrasada se desculpando.

A escola (um lindo prédio no Alto de Pinheiros – esqueci do detalhe: a escola não fica na periferia da cidade. Imagine, então, o que acontece por lá.), não tinha sequer um cartaz de boas vindas para os pequenos já meio amedrontados, perdidos e sem saber para que sala irem. Aliás, a pobre substituta também não sabia. Isso é apenas para ilustração, algo pitoresco para poder introduzir o resto.

Logicamente se as crianças ficam o dia todo na escola imagina-se lanches e almoço. Onde estão as mesas do refeitório? - pergunto para a diretora. Não chegaram - responde ela sem graça – mas, fiz o pedido, não sei o que aconteceu. As crianças comerão por aqui mesmo, nessas cadeiras e bancos improvisados. As cadeiras e os bancos continuam improvisados, as mesas não chegaram até hoje.

Higiene pessoal. Para que lavar as mãos antes das refeições e escovar os dentes após o almoço, ou melhor, como? A professora que deixa as crianças na hora do almoço, aquela que faltou no 1º dia, não sabe como fazer porque não fica na escola nesse horário. As professoras que assumem as turmas à tarde chegam apenas no momento de retornarem a sala de aula, e a escola fica sem funcionários para orientar as crianças quanto à higiene. Lavar as mãos e escovar os dentes não são tarefas tão importantes para uma escola de ensino fundamental, mesmo porque faltam funcionários até para manter os banheiros e pias em condições, pelo menos razoáveis, para que as crianças se estimulem a usá-las ( é duro você ouvir de uma filha que não conseguiu fazer “xixi” nem lavar as mãos porque tem “nojo” do banheiro da escola).

Infelizmente isso não é tudo. A professora da 1ª série só sabe ensinar “coordenação motora”, sabe aquelas “ondinhas” que fazíamos em nossa 1ª série há 35 anos atrás? Pois é. Agora estamos tentando algumas coisas. Propusemos um trabalho voluntário com as crianças no horário de almoço, alguma atividade manual, criando objetos com sucatas ou outra coisa similar. Ela achou a idéia legal porque não tem ninguém para assumir esse horário e as crianças ficam muito à vontade e sem inspeção adequada. Porém, a Secretaria de Educação determina que essa uma hora é para almoçar, e provavelmente não para se ocupar com outra atividade, me refiro às atividades manuais (por que será que a Secretaria não se preocupou em colocar mesas para que as crianças almoçarem como cidadãos? Bem, para isso não encontrei resposta). Encontramos uma alternativa para o trabalho voluntário, caso eu concordasse em ler histórias, achei razoável e topei.


Propusemos também mobilizar a comunidade local para colaborar com a escola, já conseguimos um engenheiro agrônomo, ex-aluno da escola, para plantar árvores frutíferas junto com as crianças em uma área verde imensa da escola, só temos que esperar a boa vontade da direção para nos dar o sinal verde.

Fizemos ainda a reclamação formal na escola que serviu para assinarmos um “caderno de ocorrências”, que a diretora apresentou para a professora (depois disso ela nem me dá bom-dia). Fomos a delegacia regional – zona oeste, para conversarmos com o supervisor da escola, que anotou todas as reclamações e ficou de verificar (comentou que tem 20 “vitor olivas” sob seus cuidados, o que dificulta).

Gostaríamos muito de estar escrevendo para poder elogiar a escola pública, gostaríamos de, como antigamente, poder sentir orgulho de nossa educação. Queríamos contar com pessoas preocupadas em mudar essa situação (nossas reclamações devem parecer bobagens, mesmo porque só vendo para acreditar), frente a tantas outras que acontecem na “periferia esquecida” de nossa cidade. Cheguei a ouvir de uma mãe de aluno que eu estava lutando em vão, ao invés de brigar pelas melhorias deveria tirar minhas filhas da escola, porque eu não tinha “nível” para encarar uma escola pública.

Enfim, precisamos fazer alguma coisa! Precisamos mostrar para os pais das crianças que todas elas merecem respeito, merecem ser tratadas com dignidade. Atualmente conseguimos dividir a sala, já e um bom começo, hoje temos duas turmas da 1ª série, não mais aquela de 45 alunos. Mas, ainda precisamos mudar muito mais”,

Edvard Luiz Aparecido da Silva e Denise Spada - denisespada@superig.com.br

CIDADÃO JORNALISTA é um espaço destinado aos leitores e ouvintes que ao relatarem fatos e experiências de sua cidade, comunidade e cotidiano, tornam-se repórteres por um momento.

 
 

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