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REFLEXÃO


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urbanidade
07/12/2005
O caminho das pedras

Quando era menino, Auro Lescher morava no Bom Retiro, brincava sempre no parque da Luz, sonhava em construir aviões e ainda não desconfiava de que sofria de distúrbios mentais. Acabou psiquiatra especializado em dependência química -o que está significando, neste momento, uma viagem no tempo. "Ando pelas ruas e as lembranças vão aparecendo."

Talvez por ter sofrido desde a infância de transtorno obsessivo-compulsivo -"fiz terapia dos 11 aos 31 anos de idade"- e, constatado que nada tinha a ver com aviões, Auro entrou na Escola Paulista de Medicina (Universidade Federal de São Paulo). "Logo de início, fiquei muito interessado na questão das drogas."

Estudou em centros de referência em dependência química nos Estados Unidos e na França. Em 1995, ele participou da criação do Projeto Quixote, apoiado pela Universidade Federal de São Paulo. "Estávamos no pico da epidemia do crack." A epidemia se espalhava por toda a cidade, mas era especialmente visível na Luz, que passou a ser conhecida como "cracolândia". Para tentar afastar as crianças e adolescentes, em vez de sermões e repressão, ofereciam-se programas em arte e comunicação.

Em agosto passado, ele voltou à região em que foi criado, atraído por dois galpões, na rua Mauá, coração da "cracolândia", que serviam de mocós para drogados. "Pensei que estivesse acostumado com a degradação, mas o que vi ali ultrapassou qualquer limite de indignidade." Misturavam-se bebês, crianças, adolescentes e adultos, rodeados de fezes, restos de comida e cachimbos de crack.

Com uma equipe de médicos, psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais e arte-educadores, o Quixote tenta agora transformar aqueles galpões num espaço de aprendizado contra a droga. Usam-se os mais diversos recursos. Uma das viciadas que morava no galpão, conhecida por Marinalva, grávida de quatro meses, está fazendo um filme sobre sua vida. "É um jeito para que ela se conheça e se valorize."
Auro quer aproveitar o plano de revitalização da Luz, onde se pretende criar um pólo digital, com estímulos para a indústria da comunicação. Pretende instalar, nos galpões, um telecentro em que se tirem proveito das novas tecnologias para seduzir e abrir canais de expressão aos dependentes de drogas -assim, quem sabe, os jovens aprendam um novo caminho das pedras.

   
 
 
 

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