Pasta
deu duas versões para engavetamento; uma delas aponta
erro no levantamento
Em uma segunda versão,
secretaria disse que pesquisa não estava pronta; pasta
não havia apontado problemas, afirmou a Fundação
Seade
A Secretaria da Segurança Pública
de São Paulo decidiu engavetar uma pesquisa de vitimização,
na qual a população relata os crimes de que
foi vítima, por considerar que havia erros no levantamento.
Numa segunda versão sobre o engavetamento do estudo,
a secretaria informou que a pesquisa não estava pronta.
A Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise
de Dados), que fez a pesquisa, disse à Folha que em
nenhum momento a secretaria apontou esse tipo de problema
nas discussões iniciadas em 2005. Tanto que a pasta
encomendou uma segunda rodada da mesma pesquisa à instituição,
também ligada ao governo do Estado.
A pesquisa demorou quase dois anos para ser concluída,
na visão dos técnicos da fundação
-de novembro de 2005 a outubro do ano passado. Nesse período,
a fundação fez entrevistas em 3.000 domicílios
sobre os crimes de que os moradores haviam sido vítimas
nos últimos seis meses que não haviam sido comunicados
à polícia.
Os resultados foram mantidos em sigilo pela Secretaria da
Segurança Pública -o Seade, a quem a pesquisa
foi encomendada, não pode divulgá-la por razões
contratuais. A secretaria também se recusa a informar
o quanto pagou pelo estudo.
Os dados encontrados são similares a outros levantamentos
do gênero já feitos no Brasil. Cerca da metade
dos furtos e roubos, por exemplo, não são registrados
pela polícia, segundo o levantamento.
A diretora-executiva da Fundação Seade, Felícia
Reiches Madeira, diz que ocorreram alguns problemas metodológicos
no levantamento, discutidos com a secretaria, mas não
há "inconsistência" nos dados sobre
os crimes que não são notificados pela população.
Inconsistência é o termo estatístico que
designa um dado sobre o qual há dúvidas. "Os
dados sobre subnotificação de crimes são
similares aos de outras pesquisas. A secretaria poderia divulgar
sem problemas as taxas de subnotificação",
afirma.
Pesquisa de vitimização é a melhor ferramenta
para apurar os crimes que não são registrados,
segundo a antropóloga Paula Miraglia, diretora do Ilanud
(Instituto Latino-Americano das Nações Unidas
para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente).
"Esse tipo de pesquisa serve para aprimorar as políticas
públicas. Você descobre, por exemplo, que a população
não registra furto de carteira e pode agir para modificar
essa situação. A divulgação desse
tipo de pesquisa é didática porque estimula
as pessoas a registrarem os crimes de que são vítimas",
diz a pesquisadora.
Paula diz não entender por que um governo que vive
uma fase tão positiva na área de segurança,
com quedas recordes nos homicídios, prefere engavetar
esse levantamento.
A pesquisa de vitimização não é
o único tipo de levantamento que a Secretaria da Segurança
Pública tenta manter sob sigilo. Na última quarta-feira,
a Folha revelou um levantamento da violência por distritos
policiais na cidade de São Paulo que o governo prefere
guardar só para os seus planejadores.
Problemas
A Fundação Seade diz que a pesquisa demandou
alguns ajustes metodológicos porque ela é feita
junto com o levantamento de emprego e de desemprego. Havia,
também, problemas conceituais nas perguntas, segundo
Felícia.
Isso gerou, ainda de acordo com Felícia, alguns dados
divergentes, mas eles não eram sobre os crimes que
a população deixa de registrar em boletim de
ocorrência. Isso ocorria, diz ela, quando se tentava
estimar o total real de seqüestros e de furto de carros.
O sociólogo Renato Sérgio de Lima, que atuou
como técnico no levantamento de vitimização,
diz que os números sobre subnotificação
são similares aos apurados pelo Datafolha, Ilanud e
Futuro Brasil. "As taxas são coerentes com as
apuradas em outros estudos."
Mario Cesar Carvalho
Evandro Spinelli
Folha de S.Paulo
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